A Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP10), em Buenos Aires, terminou menos otimista do que se esperava, já que o Protocolo de Quioto entrará em vigor em fevereiro.
O que poderia ter sido uma festa virou um encontro de clima pesado, com constantes discussões entre os Estados Unidos, a União Européia, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e os países em desenvolvimento sobre o futuro das mudanças climáticas.
O problema central é que agora o Protocolo está pronto e o mundo deve encarar o fato de que as metas traçadas terão pequeno impacto na redução dos gases responsáveis pelo aquecimento global.
Para começo de conversa, a meta de reduzir em média 5,2% as emissões entre 1990 e 2012 é apenas para os países industrializados. Não impõe restrições a países como Brasil, China e Índia que, juntos, representam uma porção significativa da quantidade de carbono emitida na atmosfera da Terra. E como todos sabem, os Estados Unidos, maior poluidor mundial, não participam do processo e a expectativa é que as suas emissões aumentem em mais de 30% durante esse período. Resumindo, mesmo que os países signatários alcancem as suas metas (o que é pouco provável), o Protocolo de Quioto não reduzirá as emissões responsáveis pelo efeito estufa. No máximo freará, de leve, o seu aumento.
Todos os participantes do processo concordam que Quioto é apenas o começo se o mundo realmente pretende agir para mudar as tendências climáticas, que ficam mais assustadoras a cada publicação de estudos e análises sobre as alterações que já vêm ocorrendo.
Por isso não surpreende que agora as discussões tenham como foco o que deve ser feito após 2012. E foi aí que se iniciaram os problemas em Buenos Aires. Nas duas últimas semanas, os Estados Unidos usaram boa parte do tempo para bloquear até conversas preliminares sobre ações necessárias a longo prazo. Eles contaram com o apoio dos países produtores de petróleo.
Igualmente delicada é a posição dos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, que são contra qualquer discussão sobre futuras medidas compulsórias para limitar as emissões de gases poluentes. Eles argumentam que os responsáveis pela poluição da atmosfera nos últimos 150 anos são os países industrializados e que eles deveriam resolver o problema sozinhos.
Aqui há uma ironia. Sete anos atrás, em Quioto, os Estados Unidos defenderam ferozmente que os países em desenvolvimento também deveriam assumir compromissos para reduzir as emissões porque, caso contrário, os empregos dos americanos seriam ameaçados por competidores como a China, que não teria que se submeter a regulamentações climáticas. Hoje em dia, os norte-americanos criticam os europeus por pressionarem os mesmos países a realizarem reduções que possam frear o desenvolvimento. Para vários grupos ambientalistas presentes à Conferência, trata-se de uma nova tática americana para obstruir o progresso contra as mudanças climáticas. No período que antecedeu a ratificação da Rússia ao Protocolo, os Estados Unidos adotaram uma posição de não interferir na decisão dos países que quisessem assinar o tratado.
O Brasil defende o princípio de que não deveria ter a obrigação formal de limitar as suas emissões, mas aproveitou a Conferência para mostrar o que está fazendo para reduzir a sua contribuição para o aquecimento global.
Como foi evidenciado pelos documentos apresentados na primeira semana, a medida mais importante seria o controle do desmatamento. Em sua rápida passagem por Buenos Aires, a ministra do Meio Ambiente Marina Silva afirmou que em as ações do governo a favor do desenvolvimento sustentável na Amazônia devem começar a surtir efeito em breve. Marina também anunciou que o Brasil vai pleitear verba do fundo criado pela Convenção de Mudanças Climáticas para os países se adaptarem a mudanças climáticas irreversíveis.
Um desses impactos foi ressaltado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela companhia de seguros Munich Re. Eles revelaram que em 2004 foi registrado o maior prejuízo ocasionado por desastres ligados a mudanças climáticas. Foram 35 bilhões de dólares com perdas de bens que tinham seguros e 95 bilhões de dólares somando danos para os quais não havia seguro.
O relatório também destacou, como um dos episódios mais preocupantes do ano, o ciclone que atingiu Santa Catarina, com ventos de até 140 km/h. Foi a primeira vez que um fenômeno como esse foi registrado tão ao sul do planeta, onde a temperatura da superfície do oceano costuma ser fria demais para provocá-lo.
Esse é apenas um indício do gigantesco desafio que todos os países terão que enfrentar à medida que as mudanças climáticas forem evoluindo. O Brasil é vulnerável em vários pontos. Um deles seria a incerteza a respeito da complexa relação entre a Amazônia e o sistema climático, e sobre como isso poderá afetar as reservas de água do país.
Tim Hirsh, formado em História pela Universidade de Cambridge, é correspondente de meio ambiente da BBC News e colaborador de O Eco.
Leia este artigo na versão original em inglês.
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