Reportagens

Aventura limitada

Esportes radicais podem ocasionar risco maior do que o calculado. Profissionais e amadores que passaram por situações complicadas dão dicas de como evitá-las.

Ana Antunes ·
18 de maio de 2005 · 20 anos atrás

Esportes de aventura são a melhor maneira de entrar em contato com a natureza e preservar a saúde, certo? Nem sempre. Praticantes de diferentes modalidades já passaram por experiências desagradáveis e até perigosas por descuido ou extrema confiança nas suas habilidades. Na terra, na água ou no ar é sempre necessário estar com o melhor domínio possível da situação e ser sensato na hora de avaliar os riscos que você vai correr.

Voar de parapente parece uma atividade tranqüila mas Ruy Marra (foto), duas vezes campeão brasileiro de vôo livre, se lembra do sufoco que passou no campeonato mundial que participou na Suíça em 1993. Uma empresa austríaca ofereceu a Ruy um novo protótipo, ou seja, um novo parapente, um dia antes do início da competição. Ele ficou animado com a possibilidade de estrear um equipamento inédito mesmo tendo apenas 24 horas para se adaptar. Não deu certo. Ruy teve dificuldade para fazer curvas com o novo parapente, que é uma manobra essencial para pegar carona nas correntes de ar ascendentes e ganhar altitude. Depois de dois dias tentando dominar o protótipo, o esportista teve que abrir o pára-quedas reserva e dar adeus a chance de ser o campeão daquele ano.

“Graças à minha ambição desenfreada, não respeitei nenhuma norma de segurança e terminei fora da competição”, reconhece ele. Mesmo sem o sonhado título, Ruy disse que teve sorte. Em 24 anos de vôo livre, já presenciou a morte de mais de 20 profissionais em plena atividade.

No mergulho, o excesso de confiança também pode custar a vida. Heron César, instrutor profissional, morreu há oito anos enquanto praticava apnéia, mergulho sem equipamento no qual o praticante utiliza apenas o ar do pulmão. Ele estava com um grupo num barco se preparando para mais um passeio ao fundo do mar no litoral norte de Pernambuco. Enquanto seus alunos aprontavam o material para a descida, Heron decidiu praticar apnéia sozinho.

Como demorava muito para subir, outro instrutor resolveu ir procurá-lo. Encontrou o corpo já sem vida. Heron usava um cinto com pesos de chumbo, o chamado cinto de lastro, muito utilizado para ajudar a manter o corpo submerso. O aparato pode ter dificultado sua subida. Ana Emília Alencar era uma das alunas no barco. “Foi imprudência mesmo, acho que ele confiou demais nos seus pulmões, tanto que quando o corpo foi achado ele não estava preso a nada”, lembra.

Em casos como esse, o mergulhador desmaia antes de chegar à superfície e seu corpo é puxado para o fundo pelo lastro. Apesar de Heron dominar a técnica, alguns erros podem ser apontados na sua ação. Segundo Vinícius Ribeiro, instrutor de mergulho no Rio de Janeiro, o mergulho deve ser sempre praticado em duplas. “O companheiro pode ajudar o outro em qualquer eventualidade, inclusive apagamento”. Outro possível problema apontado por Vinícius é o peso do cinto. Ele disse que no nordeste do Brasil não é necessário usar mais que dois quilos de lastro. Peso maior que este pode ter contribuído para a permanência de Heron na água.

Outra história que quase termina mal por uma avaliação errada foi vivenciada por Ana Araujo (foto), colunista de O Eco. Ela se arriscou ao decidir emendar duas escaladas, totalizando 36 horas sem dormir. Depois de ter escalado a face sul do Pão de Açúcar, Ana recebeu um convite “irrecusável” para subir o Dedo de Deus, em Teresópolis. Para fugir do sol, a empreitada seria feita de madrugada. “Eu aceitei porque sempre fui louca para fazer esta escalada”. Foi para casa, arrumou o equipamento e às duas da manhã já estava na trilha.

Por estar muito cansada e pelo fato de não ter muita experiência na época, Ana fez muito mais esforço do que o necessário. Cochilou várias vezes nas paradas durante a subida e chegou ao ponto de pensar ter atingido o limite máximo de seu corpo. Todo o cansaço, porém, foi vencido quando ela avistou o cume. “Essa vitória me deu ânimo para terminar a viagem. Foi uma seqüência de descidas em rapel, cabos de aço e muita trilha”, conta.

Apesar de ter saído ilesa, a montanhista reconhece suas falhas. Colocou sua vida e de seus companheiros em perigo porque não conhecia a trilha e subestimou o grau de dificuldade da pedra. “Fiz tudo na empolgação. Hoje prezo muito uma boa alimentação, o descanso e o planejamento, acima de tudo”, ensina.

Pablo Fernandes foi outro que comprometeu sua diversão por falta de planejamento. Em 2000, ele e um grupo de amigos decidiram fazer sua primeira grande trilha na Ilha Grande, no estado do Rio de Janeiro. Compraram comida, arrumaram o equipamento e se mandaram para Angra dos Reis. Esqueceram apenas de planejar o caminho que percorreriam. Não sabiam onde pegar água, onde podiam acampar e quanto tempo levariam para completar o percurso da Praia de Palma a Aventureiro.

Segundo Pablo, se não fosse pelas dicas que receberam de outras pessoas que estavam fazendo a mesma trilha, eles teriam se perdido no meio do mato, tomado água contaminada e passado a noite sem lugar para montar a barraca. Hoje, ele se arrepende de não ter planejado melhor a viagem. “O ideal seria que a gente tivesse chegado uns dias antes e conversado com o pessoal local para saber o que fazer”, reconhece.

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