Reportagens

Empurrão universitário

Mato Grosso tem o 1º escritório modelo de advocacia ambiental da Amazônia. Alunos ajudarão a agilizar os processos dos 60 maiores desmatamentos do estado.

Andreia Fanzeres ·
20 de abril de 2006 · 20 anos atrás

Começou a funcionar na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) o primeiro escritório modelo de advocacia ambiental na Amazônia. A iniciativa é cercada de nobres motivações. A principal é entender o que acontece com os milhares de processos decorrentes de infrações de desmatamento, que quase nunca geram algum resultado num período razoável. O desafio: reduzir o tempo de tramitação desses casos em um terço do habitual.

Essa situação de morosidade e relaxamento na cobrança de responsabilidades nos diversos processos abertos por crimes na Amazônia não é exclusividade de um ou outro estado. E já foi comprovada por estudos recentes do Instituto do Homem e Meio Ambiente na Amazônia (Imazon). Os pesquisadores Paulo Barreto e Brenda Brito, por exemplo, já mostraram que de todas as multas aplicadas pelo Ibama no Pará, entre 2000 e 2003, apenas 2% delas foram pagas.

O estudo serviu também para mostrar que vale mais a pena dar prioridade aos maiores processos em vez de se amontoar em pequenos casos, já que 84% do valor total das multas equivalem a 16% das infrações. Ou seja, é muito mais importante resolver pontualmente os maiores processos, pois são eles os grandes responsáveis pelo desmatamento, multando menos e mais assertivamente. “Para o sistema funcionar melhor, a estratégia de fiscalização deve estar voltada aos maiores. Não adianta focar as ações em batidas nas estradas, fazer volume de multas em centenas de caminhoneiros, diversos pequenos casos difíceis de encontrar o verdadeiro responsável”, diz Barreto.

Os 60 mais

Com base nisso, os coordenadores do escritório modelo decidiram inaugurar os trabalhos acompanhando e agilizando os processos dos 60 maiores desmatamentos ocorridos em Mato Grosso nos últimos três anos. E o estado não foi escolhido para sediar o escritório por acaso. “Desde que a lei de crimes ambientais foi regulamentada, notamos um aumento na aplicação de multas”, diz Barreto. Além disso, Mato Grosso tem um sistema de licenciamento único que mostra, através de imagens de satélite, a situação florestal das propriedades, o que permite estabelecer termos de ajustamento de conduta (TACs) e promover a aplicação de multas com mais facilidade, caso seja necessário. “Já que o número de multas é alto e existe sistema de informação, temos oportunidade de monitorar o que está acontecendo”, sugere o pesquisador do Imazon.

Doze estudantes de direito da UFMT já estão trabalhando no escritório, inaugurado no dia 6 de abril com o apoio do Instituto Centro Vida (ICV) e do Imazon. Sob a coordenação dos professores Carlos Irigaray e Lafayette Novaes Sobrinho, eles terão acesso a processos administrativos no Ibama e da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), além dos que já estão tramitando em esfera criminal no Ministério Público. “Às vezes os processos ficam parados dependendo de uma providência, um despacho, uma manifestação. Vamos tentar cobrar por agilidade, e resolver esses pontos que estejam faltando”, explica Irigaray. “Essa é uma necessidade concreta do MP, que tem estrutura pequena para o tamanho de sua demanda”.

Além da conclusão desses processos que se arrastam há anos, Irigaray está otimista quanto ao aumento do interesse e na capacitação de seus alunos para atuarem na advocacia ambiental, com viagens às comarcas do interior para entenderem melhor por que esses casos custam tanto a serem concluídos. “A partir desses 60 maiores processos decorrentes de multas por desmatamento vamos ampliar a atuação do escritório, sempre dando prioridade aos crimes mais importantes”.

Os primeiros resultados na interferência do escritório nos processos são esperados para outubro deste ano. “Antes de começarmos os trabalhos, vamos fazer um levantamento para saber como os processos ficaram depois que o escritório modelo se envolveu”, explica Brenda Brito, advogada do Imazon. Ela espera que, com o sucesso da experiência, haja ainda mais incentivos para que a iniciativa se expanda para os demais estados amazônicos.

  • Andreia Fanzeres

    Jornalista. Coordena o Programa de Direitos Indígenas, Política Indigenista e Informação à Sociedade da OPAN.

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