O socioambientalismo é um fenômeno relativamente recente. Antes da sua invenção ninguém tinha pensado que o ambientalismo pudesse não ser de grande beneficio para a Humanidade, menos ainda que a conservação da natureza e dos seus recursos pudesse prejudicar a sociedade ou prosperar sem o apoio e a participação ativa da população, especialmente a local. Mas desde que o termo “socioambientalismo” foi cunhado, possivelmente à procura de uma originalidade que o justifique, essa tendência procurou se distanciar do ambientalismo criando supostas diferenças ou achando algumas reais que, no final das contas, tem dividido e prejudicado tremendamente o já fraco movimento ambiental.
Não existe uma definição acadêmica concreta do socioambientalismo, porém lendo aquilo que os que o praticam escrevem sobre eles mesmos, se deduz que é, concretamente, “um ambientalismo com consciência social”. Quem escreve sabe, por certo, que há muitas formas bem mais complexas de definir essa tendência e, sem dúvida, os críticos desta nota se encarregarão de chamar a atenção sobre as mesmas, poupando o autor de fazê-lo agora.
A dialética socioambiental usa e abusa de clichês que fazem correr sério risco de enfarte coronário os ambientalistas sem caráter muito forte e grande amplitude de espírito. Um dos mais comuns é afirmar que as unidades de conservação foram feitas triturando os direitos das populações locais e massacrando as que se opuseram. Outra frequentemente reiterada, é que as áreas protegidas são uma imposição do imperialismo americano aplicada no terceiro mundo pelos seus lacaios, ou seja, os ambientalistas. Foi evidentemente um socioambientalista, diga-se de passagem, um cidadão norte americano, que inventou o slogan “parques de papel”, tão usado pelo socioambientalismo para denegrir os esforços de se conservar amostras da natureza. Mas deixando de lado esses impropérios usados pelos extremistas, a linha divisória entre socioambientalismo e ambientalismo não é sempre clara.
Nesta nota é apresentado um simples questionário, baseado em 20 afirmações, que pretende ajudar aos leitores que assim desejam fazê-lo, a determinar seu grau de socioambientalismo. Cada afirmação, se analisada com sinceridade, resulta numa resposta quer seja afirmativa ou negativa. Cada resposta positiva vale um ponto. Essas características são:
1)Não conhece ou não compreende bem a definição de ecologia, mas acredita firmemente ser um “ecologista” ou, pelo menos, um defensor dela, e que sabe tudo o que precisa saber, por exemplo, sobre biodiversidade.
2)Não obstante considera que muitos conceitos da ecologia, como “dinâmica de populações” ou “espécie chave” ou “endemismos” são termos cabalísticos, que os ambientalistas usam para confundi-lo durante as discussões.
3)Tem fobia aos eucaliptos porque são exóticos e porque são cultivados por grandes empresas e você justifica invadir e destruir plantações e experimentos dessa espécie argumentando que esteriliza os solos e reduz a biodiversidade, esquecendo convenientemente que o mesmo faz uma plantação de cana de açúcar, dendê, banana ou soja, entre outras espécies, que também são exóticas.
4)Acha que a caça esportiva, ou com fins comerciais, é depredatória, além de cruel e nojenta, mas está convicto que a caça praticada pelas populações tradicionais é uma benção para as presas. Também acredita que essas populações nunca caçam até a exaustão das presas e que só caçam para consumo próprio.
5)Tende a ser contrário ao desmatamento da Amazônia, exceto quando este é realizado nos assentamentos rurais do governo, nas invasões dos “agricultores sem terra” ou praticado por povoadores tradicionais ou por outros agricultores protegidos pelos bispos, freiras ou outras mãos santas.
6)Você não se preocupa muito pela expansão da agricultura em qualquer lugar, exceto se nela se usam plantas transgênicas, mas você não sabe por que os transgênicos são ruins ou perigosos; no entanto está convencido que os selos das empresas transnacionais dos produtos transgênicos lhe provocam indigestão.
7)Tem convicção de que os ambientalistas são todos brancos, ricos e direitistas, que têm aversão aos pobres, aos que sempre impõem sem conversa nem consideração suas socialmente insensíveis vontades “verdes”.
8)Também acredita que os ambientalistas amam mais os bichos do mato, em especial as onças, que a seus próprios filhos e que tudo isso de “espécies indicadoras da saúde do ecossistema” é conversa para boi dormir.
9)A sua bíblia é o desenvolvimento sustentável, uma teoria tão utópica que você seguramente não a compreende. Nisso, você não está sozinho, pois muitos dos principais pensadores do mundo tampouco conseguiram explicar a lógica que sugere que o crescimento não tem limites naturais ou, mais simplesmente, que é possível consumir o que se tem e seguir tendo o que se consumiu.
10)Acredita, contrariando até o senso comum, que a presença humana na natureza aumenta a diversidade biológica e aprimora o ambiente e, por isso, infere que a natureza sem gente está condenada a desaparecer. Também pondera que como não existe realmente uma natureza intocada não precisa mais se preocupar com o fato de protegê-la.
11)Consequentemente tem aversão às unidades de conservação sem gente morando dentro ou explorando-as e, assim, faz tudo o que pode para introduzir mais habitantes nos parques nacionais e reservas biológicas, dando prioridade a índios, quilombolas e populações tradicionais.
12)Acredita que a legislação, em especial a ambiental, não é para ser cumprida pelos pobres e reconhece que, na prática, obedecer à lei é só para a minguada classe média, pois está acostumado a aceitar que os ricos tampouco a cumprem.
13)Assim, por exemplo, você é a favor da ocupação de áreas de preservação permanente por vivendas de pobres urbanos, inclusive nas beiras dos mananciais ou, pelo menos, está resignado a que assim seja.
14)Está convencido que os índios são mais sábios que os demais seres humanos, sem excluir aos que usam telefone celular para coordenar invasões de seus concidadãos paraguaios nas unidades de conservação do Sul do Brasil.
15)Acredita firmemente que o socioambientalismo é uma iniciativa brasileira ou latina americana e ignora, obviamente, que a sua origem é cem por cento de imperialistas, essencialmente dos EUA e da Europa ocidental e de organizações internacionais das mais direitistas que existem inspiradas na realidade da Ásia tropical.
16)Considera que no local onde moram mais de dez famílias afro-descendentes deve-se estabelecer um quilombo e que se deve conceder a eles a mesma extensão de terra que você supõe que teriam, se seus antepassados tivessem ficado na África.
17)Tem ódio fundamentalista pela energia nuclear e tampouco gosta das usinas hidroelétricas, mas tem e quer ter mais eletricidade na sua casa, embora proteste pelo seu custo elevado, apesar de saber que outras alternativas energéticas são ainda mais caras.
18)É um defensor radical do uso de biocombustíveis (exceto se são de origem transgênica), mas nunca fez o balanço ambiental da produção desses produtos para saber se eles realmente são uma opção ecológica, social e economicamente viável.
19)Você aprova a necessidade de audiência pública para criar unidades de conservação para proteger a natureza em beneficio da sociedade nacional, no entanto acha normal não exigir audiência pública para desmatar dezenas de milhares de hectares para estabelecer especulações agrícolas ou pecuárias privadas.
20)Está convencido que o Chico Mendes é o principal herói da conservação da natureza da história do Brasil.
Se a soma das suas respostas ao questionário alcançou 5 pontos, você é um simpatizante incipiente do socioambientalismo, embora possa, também, ser um ambientalista um pouco confuso; se alcança de 6 a 10 pontos, então você está no caminho certo para ser futuramente considerado um socioambiental; se acumulou de 11 a 15 pontos, é sem dúvida um socioambientalista de fato e de direito. Com mais de 15 pontos você é um socioambientalista incurável. Se a sua pontuação foi zero ou pouco mais que isso, você é obviamente um ambientalista.
Se, em muitas das afirmações, você ficou com dúvidas, ou seja, pensou que “assim como foi colocado não é, mas, poderia ser com algumas mudanças” ou “aquilo poderia ser válido em um ou outro caso”, então você é bem-vindo ao mundo real. A verdade é que, como indicado, a linha divisória entre ambientalismo e socioambientalismo é muito tênue e assim sendo muitos a atravessam até sem perceber.
Além do mais, ser socioambientalista não é nada tão ruim para você mesmo. Até é vantagem, pois na atualidade o socioambientalismo é politicamente correto no Brasil e em grande parte do mundo. Apenas é um desastre para a natureza e para o futuro dos seres humanos.
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