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Floresta da Tijuca: um resgate do nome imposto pela história

O novo plano de manejo do Parque Nacional da Tijuca é uma boa oportunidade para batizar a unidade de conservação com o nome que ela é popularmente conhecida no Rio.

9 de abril de 2007 · 19 anos atrás

Há poucos dias, chegou às minhas mãos, por meio da Sociedade de Amigos da Floresta da Tijuca, o encarte 4 da proposta do novo Plano de Manejo do Parque Nacional da Tijuca (PNT). O simples fato do encarte ter sido disponibilizado para a consulta pública e sugestões é um grande avanço. Demonstra abertura da administração da Floresta e permite aos usuários, pesquisadores e moradores do entorno opinarem sobre os destinos da Unidade de Conservação, conforme seus interesses específicos. Está de parabéns quem liderou essa iniciativa que ainda merece ser destrinchada em detalhes em coluna específica.

Aproveito este momento de reavaliação que é a feitura do Plano de Manejo, entretanto, para trazer à baila uma questão que há muito se impõe: a do nome do nosso querido Parque. Como é sabido a “Floresta”, como carinhosamente todos a conhecemos, foi primeiro elevada a Parque em 1961, com o batismo de Parque Nacional do Rio de Janeiro.

Em 1967, por iniciativa do professor Alceo Magnini e colaboradores, a designação oficial do Parque foi trocada para Parque Nacional da Tijuca. A lógica por trás da mudança é absolutamente cristalina. Era o caso de dar ao Parque o nome de sua principal atração, no caso o Maciço da Tijuca. Ocorre, contudo, que jamais o nome pegou. Quando fui diretor do Parque da Tijuca nos anos de 1999 e 2000, o Parque Nacional da Tijuca continuava conhecido como Parque Nacional da Floresta da Tijuca ou, mais singelamente, por Floresta da Tijuca. O então Ministro do Meio Ambiente, o Prefeito do Rio de Janeiro, os Secretários Estadual e Municipal de Meio Ambiente, a imprensa, os mapas turísticos, e a absoluta maioria dos usuários só chamavam o PNT de Floresta da Tijuca. Não importa se a Vista Chinesa, a Pedra da Gávea, as Paineiras ou Sumaré não estão na Floresta. Para a televisão, o rádio e a população em geral tudo é parte da Floresta.

A origem do nome remonta a 1861, quando foi criada a Floresta Nacional da Tijuca, a ser formada por propriedades que o Estado desapropriara mediante indenização, naquela altura já uma extensão significativa de terras.O termo Floresta, quando referente à Tijuca, desde seus primórdios não guardava relação com uma parcela de mata, mas com uma unidade administrativa, que era diferente da Floresta das Paineiras ou da Floresta do Andaraí Grande, hoje também partes do Parque Nacional da Tijuca.

Recorremos a Aluísio de Azevedo, que em seu “Livro de uma Sogra” mostra bem que a Floresta da Tijuca, em sua concepção, era uma área bem delimitada que sequer abarcava os terrenos que incluem a Cascatinha: “Realizamos um belo passeio à Floresta da Tijuca… foi deliciosa a subida até o alto da serra, por entre as vegetações e os penhascos da estrada. Não quisemos nos deter na Cascatinha, e continuamos a subir para a Floresta”.

Também é interessante a passagem do romance “Sonhos d’Ouro”, de José de Alencar, publicado em 1872, no qual podemos ver claramente que o termo Floresta da Tijuca sequer designava uma porção de selva existente, mas sim uma mata a plantar: “lembrou-se o moço de subir até a Floresta, um dos mais lindos sítios da Tijuca. O nome pomposo do lugar não é por hora mais do que uma promessa; quando porém crescerem as mudas de árvores de lei, que a paciência e inteligente esforço do engenheiro Archer têm alinhado aos milhares pelas encostas, uma selva frondosa cobrirá o largo dorso da montanha onde nascem os ricos mananciais.”

Há 146 anos, a bela Floresta da Tijuca que deu origem ao Parque não existia. Em lugar das árvores havia uma centena de pequenas e médias chácaras, algumas para o veraneio das famílias ricas da Corte, outras o retrato da decadência das outrora opulentas plantações de café que por um breve período transformaram a Tijuca no motor econômico do Império. Hoje o reflorestamento já deu resultado e ligou em uma só mata as diversas florestas da Tijuca, da Gávea Pequena, do Andaraí, dos Ciganos e das Paineiras. Para o habitante contemporâneo do Rio, contudo, elas são uma só unidade. Basta olhar para qualquer morro da cidade e ver árvores que pronto: lá está a Floresta da Tijuca. Para os cariocas, tudo é Floresta da Tijuca, a ponto de que a imprensa local afirma freqüentemente que “Entre os destaques da Floresta da Tijuca estão as Paineiras, o Corcovado, o Mirante Dona Marta…”. Apenas a burocracia insiste em achar que a luxuriante Floresta da Tijuca do Século 21 segue tendo os acanhados limites da desbastada Floresta da Tijuca de meados do Século 19.

Até o Presidente da República se rendeu à realidade de que o nome da gente é aquele pelo qual somos conhecidos e incorporou “Lula” ao seu nome, passando a se chamar oficialmente Luís Inácio Lula da Silva. É hora de aproveitar a publicação do novo Plano de Manejo para seguir o exemplo de nosso Primeiro Mandatário e dar ao Parque o nome que ele realmente tem: Floresta da Tijuca.

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