A recente novela da TV Globo, Viver a Vida, escrita por Manoel Carlos, popularizou a cidade jordaniana de Petra entre os telespectadores brasileiros. Não é para menos. Trata-se de uma povoação milenar. Antiga capital dos nabateus, Petra localizava-se a meio caminho entre as regiões do Oriente produtoras de incenso, sedas e especiarias e os mercados consumidores na Europa e na Arábia. Na região da Palestina a travessia das caravanas só era possível graças à infraestrutura de estradas, pontos d’água e vilas fortificadas mantidas pelos nabateus entre o Golfo Pérsico e os portos de Gaza.
O comércio enriqueceu o reino nabateu que, com os cobres que amealhou nos anos de vacas gordas, soube edificar grandes monumentos cujas ruínas até hoje impressionam pela beleza e magnificência. Tanto sua capital, como as cidades menores ao longo da estrada do incenso no deserto do Negev (como Avdat no atual estado de Israel) estão hoje classificadas como Patrimônio Mundial da Humanidade, pela UNESCO.
O império de Petra durou do século II A.C. até o século VI D.C. quando um grande terremoto forçou seus habitantes a abandonarem a região. Quinze séculos depois a cidade continua monumental. Possui centenas de prédios escavados na rocha de arenito, com uma arquitetura ao mesmo tempo fascinante e improvável. A capital dos nabateus está localizada em um grande anfiteatro natural, cuja geografia lhe confere proteção. A entrada principal se dá por um canion profundo e estreito, de fácil defesa mas também de beleza magnífica. Na antiga metrópole tudo impressiona: não somente os templos e edifícios habitacionais, mas também as cisternas, os estábulos, o complexo sistema de irrigação, coleta e abastecimento de água, as escadas escavadas na rocha e as vistas deslumbrantes que descortinam o deserto sem fim.
Só há um problema. A indústria do turismo já descobriu essa jóia: uma visita a Petra quase sempre é feita com a companhia de multidões. Logo na entrada do canion há um estacionamento atulhado de ônibus que despejam aos borbotões argentinos cabeludos, americanos barulhentos, japoneses e suas máquinas filmadoras, francesas e suas sombrinhas, além de quase todas as outras nacionalidades do planeta, incluindo brasileiros.
Para os montanhistas, contudo, há uma alternativa mais em comunhão com a natureza. Existe uma trilha que leva a Petra passando por cima dos morros que conformam o anfiteatro em que a cidade está inserida. É uma caminhada belíssima por trilhas estreitas, mas bem definidas em meio a uma paisagem desértica e, aparentemente, desolada. Sobe, desce, sobe, sobe, sobe, desce, sobe de novo e, de repente, começam a aparecer as fachadas dos prédios e templos encravados na rocha. São os subúrbios de Petra, quase tão bonitos quanto o centro, mas completamente vazios, e à disposição exclusiva do trilheiro.
O tamanho da caminhada depende apenas do preparo físico do visitante. A malha de trilhas é interminável, além de variada. Conduz a mirantes, aquedutos, monumentos e a um teatro romano com capacidade para sete mil pessoas sentadas, além de vales e planícies onde os nabateus plantavam, em terras irrigadas. Há quem fique dois dias inteiros perambulando por aquelas paisagens de beleza incomparável, admirando suas intermináveis tonalidades que vão do branco ao lilás, passando por amarelo, ocre, cinza e vermelho: Petra floresceu durante oito séculos, mas não expulsou a natureza.
Por essa via, depois de algumas horas de cabritada, acaba-se por também chegar ao centro de Petra após uma visita ao Supremo Templo do Sacrifício, cerca de 200 metros acima da antiga área urbana da capital dos nabateus. Se a caminhada foi bem planejada, o objetivo será alcançado no fim da tarde e as hordas de turistas já terão se dissipado: ver Petra ao por-do-sol é um prêmio merecido para quem não economizou pernas ao longo do dia. Além disso há ainda um derradeiro prêmio, deixar a cidade através do magnífico canion de 1,2 km de comprimento que serve de entrada para o resto dos visitantes. Nada mais justo para quem teve a pachorra de percorrer Petra por suas mais recônditas trilhas: ir embora pela porta da frente.
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