Enquanto lia as últimas notícias da semana no mundo ambiental brasileiro, tantas palavras vãs em prol de uma floresta que mal se sustenta e se encolhe por tanta cobiça, lembrei-me da velha música de Vital Farias: “A Saga da Amazônia” que já pronunciava o sofrimento desta floresta há mais de 20 anos. Parece que nada mudou, a não ser a certeza de que ‘se a floresta meu amigo tivesse pé pra andar, eu garanto meu amigo, com o perigo não tinha ficado lá’.
Gosto de notícias que me inspirem temas fotográficos, afinal a fotografia é uma expressão do mundo em que vivemos, sejam elas para alertar, distrair ou iludir. Li sobre a situação no Ibama, índios desmatando, Antártica e China – que num futuro próximo serão devidamente ilustradas aqui, a busca da verdadeira foz do rio Amazonas, no Peru. Pensei então em algo relacionado a este tema; conversando com uma amiga, grande pesquisadora da história da fotografia, veio o nome de Martin Chambi.
Ao pesquisar com mais detalhe, imagens fascinantes voltaram a ilustrar minha memória, só não estavam associadas ao nome deste grande fotógrafo peruano do século passado. Filho de um mineiro e descendente de família inca, foi o primeiro fotógrafo indígena latino-americano. Sua fotografia retratou com uma poesia impar o povo peruano, suas tradições e modo de vida, as ruas de Cuzco e as paredes perdidas de Machu Picchu. Quem já teve o privilégio de conhecer esta cidade humana quase divina, vai se deleitar com as imagens de Martin.
Mario Vargas Llosa não economiza adjetivos para descrever a obra e passos deste conterrâneo: “Não houve esquina de Cuzco que Chambi não tenha apropriado ou imortalizado. Suas imagens nos colocam no coração do feudalismo das montanhas, nas haciendas dos grandes proprietários de terra com seus servos e concubinas, na procissão colonial de multidões contritas e bêbadas…”.
A riqueza de detalhes que conseguia imprimir nos fantásticos negativos de vidro era tamanha, que suas fotos serviram de referência para a restauração de Cuzco depois do terremoto de 1950. Martin começou seu trabalho como fotógrafo retratista da elite local, mas intercalava sua permanência no estúdio com empreitadas pelas montanhas andinas e vilarejos. Diziam que ele conseguia enxergar seu povo com olhos não colonizados. Realmente, a beleza impressa nas imagens suprime qualquer sensação de opressão, discriminação ou desamparo que seu povo pudesse viver na época. Um olhar antropológico e natural permeados por uma perfeita contra-luz. A hora do clique era claramente escolhida a dedo e revelava a mágica das sombras aveludando os detalhes e as expressões humanas, dando alma à fotografia.
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