A demissão da ministra Marina Silva soa a notícia que nasce velha. Saiu agora? Por que só agora? Ela dava a impressão de que estava saindo do governo há muito tempo, talvez desde o dia do ano passado em que entrou no gabinete do presidente Lula demissionária, para discutir a licença ambiental da hidrelétrica no Rio Madeira, e voltou anunciando a criação do Instituto Chico Mendes por medida provisória, que multiplicou o Ibama por divisão celular. Com isso, ela trocava uma derrota na Amazônia por uma vitória burocrática em Brasília. E a Amazônia era seu forte. Ou não era?
Não era. Pelo menos foi ali, de preferência, que o governo Lula se esmerou em emparedar a ministra do Meio Ambiente. No ano passado, o PAC foi o atestado oficial de que Marina Silva tinha ficado para atrás, em seu próprio território. Na Amazônia, onde ela queria botar, com fé meio cega, mas sincera, assentamentos de sem-terra, reservas indígenas, populações tradicionais e outras trincheiras muito sociais e pouco ambientais das políticas de conservação da floresta, o governo resolveu pôr estradas, portos, canaviais e usinas, anunciados com ostensivo descaso pela ministra.
Não é de ontem que Marina Silva estava à sombra da ministra Dilma Rousseff, que é francamente hostil ao ambientalismo, como todo administrador essencialmente autoritário. Abaixo da Casa Civil, o ministro Mangabeira Unger ultimamente se arvorou de palpiteiro-mór do desenvolvimentismo na Amazônia, tomando as rédeas do PAS, que não passa de um PAC regional com outra sigla. Ou seja, até as funções indefiníveis do ministro de Assuntos Estratégicos passaram a valer mais que as da ministra do Meio Ambiente. Demitida pelo visto ela já estava. Faltava só demitir-se, antes que o segundo ou o terceiro escalão do governo atropelassem sua pasta.
Quem saiu agora do governo foi o símbolo Marina Silva, ele mesmo um tanto puído pela fricção com um chefe que, claramente, nunca levou esse negócio de Meio Ambiente a sério, se é que leva assuntos a sério. Mas Lula não fez isso sozinho. Marina Silva ajudou-o, desgastando-se, com excesso de política e falta de gestão, que dividiram seu ministério entre amigos próximos e funcionários distantes, senão insurretos, ou entre parques nacionais sem dinheiro até para cobrar ingressos e verbas prioritárias para armar em Brasília o Instituto Chico Mendes, que até agora dividiu recursos, sem multiplicar resultados do Ibama.
Por dentro, sua demissão mudará pouco o governo. Ela já estava mesmo meio fora da equipe. Com o secretário estadual Carlos Minc em seu lugar, talvez diminua o ruído. Minc é o abre-alas da escola carnavalesca do ambientalismo brasileiro. Tende a evitar atritos com a vanguarda interna do desflorestamento, para procurar seus adversários o mais longe possível de Brasília. É longe do Brasil, no exterior, que Marina Silva fará falta. Sem ela, o presidente Lula perde a última ficha para freqüentar mesas de quem aposta no futuro da floresta.
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