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Reserva Poço das Antas: desabafo de um ambientalista

Leia o relato de Luís Paulo Ferraz, da Associação do Mico-leão-dourado, sobre o incêndio que matou animais e destruiu 1.000 hectares da reserva.

Redação ((o))eco ·
12 de fevereiro de 2014 · 11 anos atrás

Uma família de quatis morreu queimada. Três outros membros da família foram vistos ainda vivos nas proximidades. Foto: Antônio Bragança/AMLD.
Uma família de quatis morreu queimada. Três outros membros da família foram vistos ainda vivos nas proximidades. Foto: Antônio Bragança/AMLD.

Sem brigada própria de incêndio, a possibilidade de usar um avião e até sem telefone na sede para ligar para pedir ajuda – a linha foi cortada há 2 meses por falta de pagamento –, Gustavo Luna Peixoto, chefe da Reserva Biológica de Poço das Antas (Rebio), em Silva Jardim, mobilizou colegas, ex-funcionários e parceiros para formar uma brigada voluntária e combater o incêndio que começou na última sexta-feira (07).

O fogo veio do assentamento do Incra que fica no entorno da reserva: um proprietário fez uma queimada para limpar o terreno. O tempo seco e o vento espalharam as chamas e o resultado foi a destruição de 20% da reserva biológica Poços das Antas, que abriga o ameaçado Mico-Leão-Dourado (Leontopithecus rosalia).

A equipe com 25 voluntários foi formada no sábado e levou 24 horas para deter o incêndio que devorou 1000 hectares da unidade. O reforço veio no domingo, quando 30 bombeiros vindos de Macaé, Casimiro de Abreu, Cabo Frio e Magé se uniram ao grupo, e a equipe passou a contar com um helicóptero do Corpo de Bombeiros para acabar com o fogo.

No Facebook, Luís Paulo Ferraz, secretário-executivo da Associação do Mico-Leão Dourado, que funciona dentro da Rebio, fez um balanço contundente sobre a queimada. Abaixo, leia o relato completo.

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Hoje a equipe da Associação Mico-Leão-Dourado foi a campo documentar o “dia seguinte” do incêndio. E voltou arrasada com o que viu. Lamentamos ter que publicar estas fotos… Mas essas mortes precisam servir para algo.

Poço das Antas é a primeira Reserva Biológica do Brasil. Habitat do Mico-Leão-Dourado, da preguiça de coleira e de outras espécies importantes da fauna e flora da Mata Atlântica. Tem valor histórico e simbólico na luta conservacionista. É sede de um dos mais importantes trabalhos integrados para salvar uma espécie da extinção, o Mico-Leão-Dourado, candidato a Mascote Olímpico.

O Brasil é uma potência mundial em biodiversidade. Um país atualmente com destacada visibilidade, seja pelos grandes eventos esportivos, seja pela vitalidade de sua economia e suas contradições sociais. O Rio de Janeiro é a grande vitrine do Brasil. Um incêndio na sua reserva mais simbólica não pode ser justificado pelos burocratas apenas como mais uma fatalidade causada pelo calor ou por um agricultor desavisado.

Sábado, 08 de fevereiro. No segundo e decisivo dia do incêndio, Gustavo Luna Peixoto, o chefe da Reserva, mobilizou de forma competente para o combate um grupo de voluntários. Cerca de 25 homens, alguns funcionários de instituições parceiras, amigos, ex-servidores… A Reserva Biológica de Poço das Antas não tem brigada de incêndio nesta época do ano por falta de recursos. É evidente que normalmente costuma chover mais no verão. Mas não é o primeiro verão que a reserva tem esse mesmo problema.

O Instituto Chico Mendes, ICMBio, que administra as unidades de conservação federais está com dificuldades orçamentárias profundas. Na hora “H” não havia brigada de incêndio nem esquema de emergência. O telefone da Rebio estava cortado há dois meses e foi usado o da AMLD (Associação Mico Leão Dourado). O órgão estadual alegou dificuldades em outros parques. O chefe da Reserva fez muito mais do que poderia, diante de tanta precariedade. Os bombeiros apareceram 48horas depois. Não havia condições materiais nem treinamento para aqueles homens.

Alguns deles urinaram nos dormentes do trem para aproveitar a “água”. Isso não é piada. Vi gente usando o próprio cantil para apagar o fogo. A luta era enorme para proteger florestas e as áreas em processo de restauração florestal. 50 mil mudas foram plantadas ali no último ano.

Não é possível que as imagens de corpos de capivaras, preguiças, quatis e tantas árvores queimadas sejam rapidamente esquecidas por todos nós, na velocidade da internet. Não é possível ver tantas autoridades circulando em veículos oficiais, desfilando de helicóptero, nossos colegas técnicos realizando tantas reuniões importantíssimas mundo afora, mas que não sejamos capazes de apagar com o mínimo de profissionalismo um incêndio previsível.

Vimos outro dia o ex-secretário de Meio Ambiente deixar seu cargo orgulhoso de um chamado desmatamento zero no Estado do Rio de Janeiro. Cansa escutar tantas frases espetaculares, números superdimensionados, diante da incapacidade de organização para o mínimo necessário.

Nós, que gostamos ou atuamos com os temas ambientais, temos que ter a consciência de que estamos perdendo muitas batalhas e refletir seriamente sobre isso. A sociedade brasileira, que demonstra tanta sensibilidade ao ver um animal maltratado, precisa entender também que o nosso modelo desenvolvimento a qualquer custo está fora de moda. E que proteger o que resta da nossa biodiversidade não é problema de ambientalista.

Luís Paulo Ferraz/Associação Mico Leão Dourado

 

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Uma pequena área não atingida forma uma ilha em meio a destruição. Foto: Luiz Paulo Ferraz/AMLD.
Uma pequena área não atingida forma uma ilha em meio a destruição. Foto: Luiz Paulo Ferraz/AMLD.

 

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