Superintendentes do Ibama de três estados da Amazônia enviaram uma carta ao presidente eleito, Jair Bolsonaro, alguns dias após o segundo turno, criticando o que consideram “esvaziamento das superintendências estaduais”. A carta é datada de 8 de novembro e foi confirmada pelo superintendente do Instituto no Amazonas, José Leland Barroso. De acordo com ele, a carta apresenta sugestões ao governo eleito.
Em resposta, a presidente do Ibama recebeu uma série de outras cartas e memorandos de apoio. Em uma delas, o superintendente do Ibama em Minas, Júlio César Dutra Grillo, afirma que “grupos, aparentemente, de forma oportunista, visam desestabilizar esta imprescindível instituição”. No texto, Grillo diz que não percebeu qualquer expécie de aparelhamento na instituição.
Em outubro, alguns dias antes do segundo turno das eleições, carros do Ibama foram incendiados em Rondônia, quando as equipes se preparavam para uma ação de fiscalização. Na mesma época, no Pará, uma ponte foi queimada para impedir a continuidade de uma fiscalização do Instituto Chico Mendes.
Críticas à centralização e acusações de interferência ideológica
O documento preparado pelos três superintendentes da Amazônia, que circulava em mensagens de WhatsApp, apresenta os nomes, mas não as assinaturas dos servidores. Ele tem 29 páginas e expõe as divergências entre os superintendentes, nomeados pelo Ministro do Meio Ambiente, e os diretores técnicos, nomeados e que têm a confiança da presidência do Ibama, muitas vezes, à revelia da vontade dos superintendentes.
Apesar de constarem os nomes de quatro superintendentes, Emidio Neri Santiago Júnior, que ocupa o cargo em Roraima, negou participar da elaboração do texto. Os três outros são: Carlos Alberto Paraguassu Chaves, de Rondônia, Carlos Francisco Augusto Gadelha, Acre, e José Leland Juvêncio Barroso, Amazonas.
Em um e-mail enviado, no dia 13 de dezembro, à presidência do instituto, Emídio Santiago afirmou: “A respeito do dito documento destaco que não autorizei usarem meu nome, não concordo com as alegações ali assentadas, não tendo participado de qualquer evento institucional na data de sua lavratura, mesmo porque encontrava‐me em gozo de férias, acompanhado de minha família, no sul do Brasil.”
Leland, por telefone, afirmou que é uma crítica à política centralizadora adotada pelo órgão ambiental, em que as decisões estratégicas são tomadas por Brasília, à revelia das representações estaduais. Segundo a carta, essa centralização seria uma influência ideológica e partidária da esquerda, implantada pelo PT e PSOL. Os superintendentes não explicam onde está a influência do PSOL, um partido de oposição aos governos federais do PT na política ambiental.
O superintendente do Amazonas afirma que essa centralização leva o Ibama a não reconhecer aspectos regionais e a injustiças em suas ações. Além disso, contraria o próprio Regimento Interno do Ibama, segundo o texto divulgado.
Na carta, os superintendentes, entre outras reivindicações, pedem o poder de nomear servidores para cargos de confiança e também de firmar convênios com órgãos estaduais. E destaca a boa relação deles com outras instituições federais, como as Forças Armadas.
“Os superintendentes do Ibama da Amazônia Ocidental que não fizeram parte desse conluio dominante e perverso foram perseguidos, sufocados, ignorados, chantageados, discriminados e sabotados”, afirma o texto escrito pelos servidores nomeados pelo ministério do Meio Ambiente. Leland diz que não pediu exoneração do cargo porque quem assumiria seria justamente o chefe da divisão técnica, nomeado por Brasília.
Manifestações contrárias à carta
Por meio da assessoria de imprensa, o Ibama informou que não iria se manifestar sobre a carta. Suely Araújo estava na Polônia, onde participava da Cúpula do Clima, a COP-24, que terminou neste sábado (15). Mas informou que a presidência estava recebendo cartas de apoio, em resposta às críticas feitas pelos superintendentes da Amazônia Ocidental.
O apoio à presidência do Ibama veio de outras superintendências, inclusive responsáveis pela Amazônia Legal. “A carta não traduz a realidade do Ibama, nem da atuação dos servidores públicos do Instituto, os quais sempre foram pautados no princípio da legalidade, cujos objetivos são determinadas pela Política Nacional do Meio Ambiente, em cumprimento à legislação ambiental”, escreveu a superintendente do Mato Grosso, Lívia Karina Passos Martins.
De Santarém, no Pará, um documento repudiou a iniciativa dos superintendentes, assinado pelo analista ambiental Paulo Baltazar Dinis e pelo gerente-executivo substituto, Roberto Fernandes Abreu. No documento, acusam o texto enviado para o presidente eleito de ser “meramente oportunista, procurando apenas denegrir a imagem da instituição e promoção pessoal, caracterizando possível quebra hierárquica e responsabilização dos seus autores”.
O documento critica, por outro lado, o esvaziamento dos quadros, falta de uma carreira bem definida para os servidores e nomeações para a superintendência de pessoas alheias ao Ibama, com pouco ou nenhum conhecimento específico da área ambiental. Eles pedem ainda melhoria da estruturação da carreira e valorização dos servidores, além de urgência na realização de concurso público.
Júlio Gonchorosky, superintende do Ibama no Paraná, manifesta solidariedade, consideração e respeito à presidente do Ibama e critica o momento em que o documento foi preparado. “Entendo que teria sido muito bem vinda há um ano ou mesmo 6 meses atrás, como catalizador de um profundo debate institucional. Não agora”, escreveu.
A superintendente do Ibama no Amapá, Márcia Bueno, também enviou um documento à presidência, elogiando os avanços do Ibama na normatização dos procedimentos e nega interferências políticas nas ações do instituto. Ela presta solidariedade e gratidão à atual gestão do Ibama. Márcia Bueno cita sobre a experiência que teve em órgãos estaduais, onde são sentidas as influências político partidárias, segundo ela.
“(…) considero que o referido documento foi redigido por pessoas que não vivenciam o dia a dia dos trabalhos do IBAMA, apresentam propostas que representam um retrocesso de no mínimo dez anos nas conquistas e democratização da Autarquia e confundem competências do Legislativo, Executivo e Judiciário”.
Iniciativa política e que contribui para ataques contra órgãos ambientais
Já o chefe de Divisão Técnica do Amazonas, Hugo Loss, em carta divulgada pela agência Amazônia Real, afirma que a iniciativa dos superintendentes aumenta a tensão e favorece o clima de ameaças à servidores do Ibama na Amazônia. “(…) contribui para aumentar os riscos aos que os servidores estão expostos, bem como para criar uma atmosfera de suposta fragilidade dos procedimentos executados pelo órgão, fatos estes que trazem benefícios apenas aos infratores ambientais e prejudicam o órgão no cumprimento de seu dever legal”, afirma a resposta do servidor.
Segundo Loss, as superintendências são os cargos que mais sofrem influência política, ‘os quais em geral são indicados para atender aos interesses de políticos locais, em detrimento da sua competência técnica”. O texto pede para que sejam comparados os históricos de filiações partidárias dos superintendentes e dos chefes de Divisão Técnica.
“No Amazonas não há hoje cargos técnicos ocupados por pessoas filiadas a partidos políticos ou mesmo que já tenham sido filiadas a partido em algum momento no passado”, garante.
O texto defende a centralização, uma forma de proteger os técnicos que atuam nos estados das pressões políticas locais e dá maior impessoalidade às ações o Ibama. E diz que a carta dos superintendentes não apresenta razões técnicas, e sim interesses políticos.
Contra a acusação de conduta ideológica, a resposta do servidor do Ibama apresenta um resumo sobre as ações executadas. No Amazonas, por exemplo, o órgão teria lavrado 1.030 autos de infração ambiental. Embora a maioria tenha sido questionado na Justiça, em apenas 3 casos eles foram anulados judicialmente. A confirmação da Justiça de que os autos de infração devam prosperar refutam a ideia de que tenham sido um ato de caráter ideológico.
Loss apresenta um quadro comparativo entre o tempo de tramitação de processos de fiscalização e de licenciamento na divisão técnica e na superintendência. Enquanto a apuração de multas no Gabinete da Superintendência no Amazonas demora em média, segundo o quadro, 146 dias, na área técnica, esse tempo é de 15 dias. No caso de licenciamento, são 75 dias no gabinete, contra 14 dias na área técnica.
O servidor destaca ainda que as ações de fiscalização são definidas com base em critérios técnicos, com uso de imagens de satélite para identificar frentes de desmatamento e locais de atuação. “Arvorando-se em critérios técnicos, evita-se que o poder de polícia do Ibama seja utilizado para punir adversários políticos e beneficiar aliados, o que impediria a continuidade do serviço público, gerando ações desconexas sem combater diretamente o crime ambiental”, diz o texto.
*Editado às 16h07, do dia 17/12/2018.
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Um absurdo cada matéria que eu leio sobre o assunto eu fico mais chocada e desacreditada, em um pais tão rico! As pessoas só fazem o trabalho delas direito quando "O" delas ta na reta, até lá sempre fazem tudo nas coxas e ainda roubam!
Briga de vaidades pra ver quem continua mamando nas tetas do estado sem perder DAS.
Pelas suas colocações já percebi que quem não está de acordo com suas idéias, está errado, ponto. Ignorar as realidades regionais e empurrar goela abaixo políticas de gabinete é ditadura, ponto. Rotular que quem discorda das posições da administração central é a favor dos desmatadores e garimpeiros faz parte dos discursos das diretorias do IBAMA já há 10 anos, onde a centralização do poder e o aparelhamento ideológico de quem comanda nas pontas é pilar na manutenção do mesmo quadro há mais de uma década. Não sei sua lotação, se vc é servidor do IBAMA, mas com toda certeza não é na Amazônia, pode até ser um desses que vem conhecer a ponta Negra com data e hora pra voltar para suas cidades sem arvores, com carros, asfalto, hospitais, shoppings, escolas e todas as benesses do desenvolvimento. Pelas suas palavras vc não conhece o ibama, vc sabe o que lhe falam e que é conveniente para a manutenção de seu status. O Ibama não precisa criminalizar a sociedade amazônida para fazer o seu papel, essa criminalização só serve ao fim e a cabo para uma coisa: criar um quadro constante que possa ser vendido de caos ambiental e isso tudo para manter o poder de quem já está lá em Brasília há anos. Se essa política de fiscalização a ferro e fogo fosse eficiente o desmatamento não aumentava todo ano, sempre mais e mais a despeito de milhões e milhões de reais gastos com aeronaves, servidores e aluguéis de carros. Gostaria de ver um comparativo entre a efetividade do dinheiro gasto nessas ações e os resultados em prol do meio ambiente. A não ser que todas essas aeronaves e veículos sejam de alguma organização não governamental. Por fim, não vi ninguém pregando o desmonte do IBAMA e sim tentando adequa-lo a realidade diversa do Brasil que é ignorada para manter um grupo no poder. O verdadeiro Ibama ainda vai colocar a cabeça para fora dessa areia, para não ser mais contundente, que está há mais de 10 anos. Quanto à colocação dos superintendentes, as palavras de seu comentário fazendo alusão a quebra de hierarquia, só reforça o que foi dito lá, que quem não está de acordo com as " regras do grupo" será punido. Já devem estar montando uma forma de responsabilizar administrativamente os pobres coitados que ousaram colocar suas opiniões em uma carta a quem efetivamente vai governar o país e vc queira ou não tem mais poder que os diretores do IBAMA, não adianta espernear.
Aí quando a administração central não faz o que esses analistas mimados não gostam (a maioria deles), eles vão atrás do ministério público. Esquecem rapidinho essa história de hierarquia.
Quem conhece minimamente do IBAMA sabe que quem está falando contra a carta dos superintendentes são aqueles que estão em cargos por graça e a serviço de Brasília e esse tal apoio não passa de determinação superior. É só buscar a origem dos servidores que se posicionaram contra e "redigiram" cartas de apoio à presidente e, principalmente, a seu vice presidente, saber onde efetivamente são lotados, suas viagens constantes ao longo dos anos, o tempo que estão nos cargos e a quem são ligados para constatar isso. A carta não falou nenhuma inverdade, apenas relatou o que passam todos, absolutamente todos, os servidores que não comungam com as "idéias" vindas de de Brasília. Estranhamente quem realmente manda e desmanda no Ibama é a mesma pessoa, e seus "projetos" coincidem com o governo do pt e o que está aí. Saiu governo e entrou governo, saiu ministro e entrou ministro, e quem dá as cartas é o mesmo diretor que é responsável por toda e qualquer ação da fiscalização. Os servidores apenas fazem os seus serviços, são pagos para isso e cumprem sua missão de forma honrada, porém, há aqueles, de maior cacife, que distoam dessa realidade pois suas ordens são outras e vem de Brasília. O Ibama precisa nascer de novo para descobrir qual sua real missão, isento de ideologias e vontades de seus diretores, do aparelhento ideológico que pode ser de varias faces. Seus diretores precisam se desapegar do poder ilimitado e saber que o bem maior é o ser humano.
Carta com cheiro de agronegócio ilegal. Vai vendo…
Começou a briga pra ver quem pega as "tetas" no novo desgoverno. Normalmente são os mais incompetentes e antiéticos que fazem isso.
Briga da DAS, é difícil de fora saber quem tá mais certo ou errado, quem é isento, quem tem segundas intenções, quem quer se divulgar pra não perder o cargo, quem tá só agradando quem lhe colocou no cargo atual, etc.Com a mudança de governo, os ânimos ficam aflorados. Provavelmente boa parte dessas chefias serão trocadas. Se forem bons, maus ou iguais a esses vai ser questão de opinião desse ou daquele cidadão, mas o que importa é alternância de poder