Pesquisadores alertam para a necessidade de reorientar o desenvolvimento tecnológico e a direção dos investimentos voltados para a oferta de energia no país. Somos consumidores de produtos e serviços que advêm de uma matriz produtiva inadequada, fomentada por um modelo desenvolvimentista adotado pela tecnocracia militar, que relegava a questão ambiental a segundo plano.
A perspectiva do desenvolvimento sustentável, vista por muitos como utopia, busca conciliar o desenvolvimento econômico, com equilíbrio ambiental e justiça social. Ocorre que na prática a expressão tem sido utilizada em projetos sem conciliar os interesses econômicos, sociais e ambientais. Tal fato pode ser levado em consideração quando observamos a forma como tem sido conduzido o processo decisório da Política Energética Nacional.
De acordo com o Balanço Energético Nacional de 2006, o Brasil tem aproximadamente 55% de sua oferta interna de energia proveniente de energias renováveis, o que é um bom indicador considerando que no mundo essa oferta gira em torno de 13,2%. Por outro lado, a situação atual aponta para o risco de apagão com o ano crítico em 2010, sugerindo, assim, a adoção de medidas imediatas para promoção da oferta de energia no país, de forma a atender as necessidades de consumo sob uma ótica sustentável. Um processo que deve ser conduzido com diálogo mais expressivo com a sociedade e maior participação dos diferentes setores do governo.
Diversificar os investimentos em diferentes fontes de energia é um bom negócio, prioritariamente nas quais temos mais vocação como, por exemplo, a biomassa. O Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel é uma iniciativa que pode contribuir para sustentabilidade da matriz energética brasileira, com geração de emprego e renda, e inclusão social. No entanto, o mesmo apresentou algumas falhas de articulação por não ter incluído os Ministérios do Meio Ambiente e Desenvolvimento Agrário nas definições básicas do programa, não existindo uma estrutura de fiscalização que garanta que o arranjo entre os empresários e os produtores seja pautado na justiça social e equilíbrio ambiental. Além disso, muitos ambientalistas temem que o excesso de demanda na produção agrícola, como a da soja, por exemplo, faça com que o cultivo avance ainda mais para o Cerrado e a Floresta Amazônica.
Diversificar a matriz energética através de fontes renováveis de energia (PCHs, Biomassa e energia eólica) mediante o aproveitamento de insumos disponíveis e tecnologias aplicáveis, valorizando o potencial energético regional e local e introduzindo novos agentes de pequeno e médio porte no setor são alguns dos objetivos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia elétrica – PROINFA. A implementação do Programa pode contribuir para gerar energia mais limpa e com impactos sociais positivos. Porém, o custo de geração dessas fontes é mais alto que o da hidroelétrica, o que exige maior esforço do governo para dotá-las de melhores condições de competitividade. É notável ainda a carência de investimentos mais expressivos nessas fontes.
No que se refere à energia nuclear, a decisão de Angra III pode ser considerada equivocada não apenas do ponto de vista ambiental como a maioria pensa, mas também sob a lógica econômica, considerando a relação custo/benefício da mesma. Até que ponto vale a pena investir mais 7 bilhões para produzir 1,3 milhões de Mwh, para um empreendimento que tem um custo de geração de energia consideravelmente maior que as hidrelétricas e Pequenas Centrais?
Por que não priorizar os investimentos na repotenciação das usinas hidroelétricas já existentes? São medidas mais econômicas, rápidas e eficientes. Repotenciar as hidroelétricas mais antigas pode aumentar a capacidade de geração hidroelétrica no país em cerca de 12%. Complementar a motorização representa um ganho de potencia instalada sem a construção de novas usinas. As usinas de Porto Primavera, Itaipu, Xingó, Itaparica, por exemplo, não dispõem de toda a sua capacidade instalada. Repotenciar as hidroelétricas e investir mais em fontes como biomassa, eólica, pequenas centrais hidroelétricas podem aumentar a oferta de energia de forma mais rápida e sustentável, sem causar grandes impactos sócio-ambientais.
A discussão de energia no país é polêmica: há pesquisadores que defendem investimentos em hidroelétricas, porque é nossa vocação e possuem alta capacidade de geração com custo baixo, enquanto outros argumentam que as mesmas trazem altos impactos sócio-ambientais, defendendo maiores investimentos nas fontes alternativas, que apesar de mais limpas têm custos mais elevados. Não é recomendável, tampouco, relegá-las a segundo plano, uma vez que o aumento da escala de investimentos aliado a incentivos governamentais podem torná-las mais competitivas no mercado de energia e economicamente mais viáveis.
É necessário, sobretudo, estabelecer prioridades na direção dos investimentos e na orientação do desenvolvimento tecnológico voltado para a diversificação de nossa matriz energética, de forma a assegurar o atendimento das necessidades da população. Não podemos também desconsiderar o potencial que o país tem para responder a políticas de redução de consumo – a experiência do último apagão confirma essa tese. A elaboração de políticas e diretrizes voltadas para o consumo sustentável são bem-vindas. O critério para a definição da política energética no país não deve ser apenas o de mercado, que atenda a elites empresariais. O modelo energético brasileiro deve ser planejado, visando atender às necessidades da sociedade, de forma a conciliar os interesses econômicos, ambientais e sociais.
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