Análises

O pacote de Obama no Brasil

Apelo pela redução das emissões de carbono, liderado pela União Européia, que tem agora os Estados Unidos como aliados, move decisões de governos e corporações e afeta mercados.

Eduardo Athayde ·
13 de março de 2009 · 16 anos atrás

O plano de Obama, que injeta 787 bilhões de dólares na economia, coloca as tecnologias limpas como espinha dorsal das ações, visando gerar entre 3 e 4 milhões de empregos nos EUA. Empresas americanas, adaptando-se as novas tecnologias, preparam-se para novos parâmetros de competição internacional. O Google, liderando investimentos na área, anunciou o seu plano para desenvolver e implementar uma plataforma do software para fornecer aos consumidores formas mais inteligentes de gestão de energia.

Além de 500 milhões de dólares para a formação e treinamento de profissionais para “empregos verdes”, o pacote inclui mais de US$ 80 bilhões em gastos diretos, incentivos fiscais e de investigação para tecnologias limpas, incluindo US$ 11 bilhões para a modernização das linhas de transmissão de energia limpa, gargalo do sistema; US$ 6 bilhões para novos projetos de energias renováveis, US$ 6,3 bilhões para implantação de eficiência energética, US$ 5 bilhões para climatizar lares de rendimentos modestos com eficiência energética e US$ 4,5 bilhões para tornar prédios públicos energeticamente mais eficientes.

Veículos flex que podem ser abastecidos em tomadas elétricas residenciais, de energia limpa, receberam US$ 2 bilhões em subsídios para as baterias de última geração; US$ 8,4 bilhões para transportes limpos de massa e US $ 9,3 bilhões para a construção de ferrovias de alta velocidade, com energia limpa. Projetos de água potável com ciclos e reciclos limpos receberam US$ 6 bilhões. Pesquisas em eficiência energética e energias renováveis mais US$ 2,5 bilhões, sem contar os US$ 20 bilhões, a mais, em incentivos fiscais e créditos para as novas fontes renováveis de energia.

Com o maior pacote ambiental já lançado, Obama dá o tom e lidera o caminho para a Cúpula Mundial do Clima a ser realizado pela ONU, em dezembro, no centro de Copenhagen, capital a Dinamarca, onde representantes de 170 paises, corporações, ongs, imprensa e novos players como o Brasil (hoje no cenário global), atraem atenções de investidores dando contornos ao ecomercado.

O governo chinês anunciou investimentos de US$ 380 bilhões em programas ambientais prometendo suplantar os EUA na corrida dos eco-investimentos. Produzindo quase metade do cimento do mundo a China quer diminuir em mais de 40% a demanda de energia neste setor. Estimulado, o capital de risco verde chinês duplicou até alcançar 19% do total dos investimentos realizados nos últimos anos.

Abu Dhabi, lastreado no petróleo, atrai tecnologias e o mercado de energias limpas, agora subsidiado pelos americanos, investindo na construção de Masdar, primeira cidade carbono neutro do mundo, em pleno deserto. Cobrindo uma área de 6 km2, com 50 mil habitantes e 80% da água reciclada, não usará petróleo nem gás. O lixo, transformado em energia e adubo também entrará na construção civil. Uma ousada e estratégica vitrine para recepcionar e lucrar com transferências de tecnologias limpas.

Os programas de eficiência energética do Japão e Coreia do Sul, por sua vez, que já reduziram em 55% o consumo das geladeiras, em 68% o consumo dos aparelhos de ar condicionado e em 99% o consumo dos computadores, articulam-se com os setores da economia americana escolhidos pela alavancagem governamental, trazendo para casa as inovações financiadas pelo novo governo do país parceiro.

O apelo pela redução do teto de emissão de carbono, liderado pela União Européia, que tem agora os Estados Unidos como aliados, move decisões de governos e corporações em todo o mundo e afeta mercados.

Esses novos paradigmas influenciam outros paises e empresas com ramificações globais. Os sofisticados sistemas de gerenciamento de risco das corporações, alheios a questões ambientais e hoje desnorteados com a crise internacional, estão sendo recapacitados para analisar os efeitos do emergente ecomercado no fluxo de caixa e ativos das empresas.

Transnacionais brasileiras como Vale, Petrobras, Odebrecht, Votorantin, Gerdau – algumas com parcela significativa do faturamento no exterior -, sentirão primeiro os efeitos da nova governança. Reavaliando planejamentos, preparam-se para enfrentar concorrentes estrangeiros subsidiados com recursos financeiros e inteligência nova num mundo de baixo carbono em que a demanda de energia global crescerá em 30% até 2020.

No recente forum National Clean Energy Project: Building the New Economy, realizado em Washington, lideranças americanas como Bill Clinton (à frente do Clinton Global Iniciative-CGI), Al Gore (Premio Nobel), Nancy Pelosi (presidente da Câmara dos Deputados) e os integrantes do gabinete de Barak Obama, Steven Chu (Secretario de Energia) e Ken Salazas (Secretario do Interior), debateram saídas para a crise da economia americana, criticando indicadores econômicos que omitem custos ambientais.

Possibilidades de parcerias com o Brasil foram colocadas, destacando o potencial do etanol no transporte, na alcoolquímica e a matriz energética hídrica limpa. À frente do CGI, o ex-presidente Clinton reúne governos, empresários, universidade e ongs, carreando investimentos na sustentabilidade.

Beiramos o momento em que inventários de carbono serão exigidos nos balanços das empresas e que o fluxo de carbono, analisado como estimulador ou inibidor de investimentos, determinará a remuneração de acionistas e novos executivos, interessados em lucrar com os negócios da descarbonização.

Aproveitando a interdependência da economia planetária o Brasil pode avançar em parcerias especificas com os setores econômicos estimulados pelo presidente Obama, preparando-se para benefícios do pacote americano.

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