Então, por que raios os grandes proprietários de terra no Brasil estão tão completamente empenhados em eliminar as restrições que o Código Florestal impõe a esta dita propriedade? Porque o cumprimento destas restrições altera a capacidade de produção – de curto prazo, que esteja bem claro – e estes senhores só enxergam o curto prazo. Desse modo, remover as restrições impostas pelo Código Florestal tem uma consequência que os proprietários de terra levam em grande consideração: aumenta o preço das terras. A curto prazo.
De diagnósticos e tratamentos (doença certa, remédio errado)
A ameaça forânea
“…os donos de terra no Brasil estão organizada e poderosamente tentando retirar quaisquer barreiras legais ou de outra ordem que funcionem como uma barreira para que os preços da terra no Brasil subam o máximo possível (…)para que eles possam vender suas terras pela maior quantidade de grana possível, e, assim, deixar de ser fazendeiros.”
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E, por outro lado, alguém realmente espera que a Rainha da Inglaterra esteja urdindo planos mirabolantes para transformar a ilha em grande exportador agrícola? Como é de conhecimento de quase todo mundo, há, na história recente da humanidade, uma divisão internacional do trabalho e o serviço que cabe ao Brasil no concerto das nações é precisamente o de celeiro do planeta. Portanto, se há algum interesse estrangeiro no Código Florestal Brasileiro é no sentido de alterá-lo, como, aliás, comprovam as participações de transnacionais produtoras de insumos agrícolas e de reflorestamento no financiamento das campanhas dos ruralistas.
Três fantasmas pairam sobre as florestas brasileiras
Pois então, se não é para dar liberdade aos intrépidos entrepeneurs rurais deste Brasil varonil, que, de resto, têm a explicar qual o motivo de serem os campeões mundiais em utilização de venenos agrícolas; se a pequena propriedade familiar não será salva pela flexibilização do Código; se não são os “interesses” estrangeiros que querem nos impedir de destruir nossas florestas: o que está acontecendo, afinal?
“O silêncio do governo sobre assunto que lhe diz total respeito – o uso e a ocupação de milhões e milhões de hectares do território nacional – pode significar que quem cala, consente.”
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Há, ainda, como é impossível não perceber, uma notável perda de importância na percepção da Europa como mercado potencial para nossas exportações. O que ocorre é que a Europa, com seus consumidores exigentes e informados, sempre foi o grande motivo que levou as empresas exportadoras brasileiras a buscar certificações e o Código Florestal sempre serviu de base para concessão destes certificados. Por enquanto, nada disso é necessário para exportar para China! E cumprir regras desta sorte não é exatamente uma expertise do dragão chinês.
É ao terceiro fantasma que talvez melhor se aplique o apelido: temos uma Constituição que foi feita com toda boa intenção dos primeiros tempos de volta à democracia e que carrega em si muitos dispositivos legais que são, por uma série de fatores, muito mais modernos do que a prática quotidiana do povo brasileiro. Hoje, a parcela deste povo que detém o poder econômico parece estar se organizando para desconstruir os dispositivos que, de uma maneira ou outra, atrapalham a consecução do que consideram seus legítimos interesses. O Código Florestal, pioneiro no reconhecimento da supremacia do interesse público sobre o direito privado, pode ter sido simplesmente um ensaio do que vem por aí, pode ser um fantasma, mas…
O quê o Brasil quer ser quando crescer?
O silêncio do governo sobre assunto que lhe diz total respeito – o uso e a ocupação de milhões e milhões de hectares do território nacional – pode significar que quem cala, consente. Ou mais, que enquanto os ruralistas contam histórias da carochinha, o PAC, em parceria com o setor privado, realiza o maior investimento da história na Amazônia. Segundo levantamentos da Folha de São Paulo, o pacote de investimento para os nove Estados da região, até 2020, já soma R$ 212 bilhões. “Basicamente, são obras de infraestrutura (energia, transporte e mineração). Juntas, elas criarão condições para a instalação de indústrias e darão origem a um corredor de exportação pelo “arco Norte”, que vai de Porto Velho (RO), passando por Amazonas, Pará, até o Maranhão. Essa movimentação de cargas será feita por uma malha logística integrada por rodovias, ferrovias e hidrovias que reduzirão custos de exportação, principalmente para o agronegócio [2]”.
Correndo à margem da discussão ambiental, os planos rasgam a floresta para assegurar o escoamento da produção que, inevitavelmente, será feita em terras onde antes, nos tempos da carochinha, existia a maior floresta tropical do planeta.
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[1] Todos os Homens do Presidente – Alan J. Pakula, 1976
[2] http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/me1610201102.htm
Gunther Furtado é economista e Teresa Urban é jornalista. |
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