Análises

É no silêncio da noite que os piores crimes são cometidos

Deputados esperaram a madrugada para votar a flexibilização do licenciamento ambiental no Brasil. O meio ambiente acordou desprotegido – e nós também

Cristiane Prizibisczki ·
17 de julho de 2025

Na madrugada desta quinta-feira (17), enquanto a maioria da população brasileira dormia, 267 deputados federais decidiram flexibilizar um dos mecanismos mais importantes de proteção da nossa natureza, o licenciamento ambiental. 

A votação desta matéria tão importante para o Brasil – acredito que não por coincidência –, teve início por volta das 23h45 e se estendeu até perto das 2h da madrugada. Parlamentares deixaram o Congresso já era quase manhã, por volta das 4 horas, no alvorecer do Dia de Proteção às Florestas, que ironia.

Eu sempre gostei da expressão “na calada da noite”. Ou, em outras palavras, quando a noite cala, se aquieta. Não sei se é por causa da minha predileção por livros de suspense ou por conta da novela Vamp, que marcou o início da minha adolescência com suas aventuras noturnas.

Só sei que aprendi que é no silêncio da noite, quando as vítimas são pegas de surpresa em seu sono e os gritos de socorro não podem ser ouvidos, que os maiores crimes são cometidos. 

No caso atual, não foram suficientes os alertas de cientistas, pesquisadores, especialistas, políticos, da cantora Anitta e até da personagem principal da novela das 9h da Globo – que, por ironia, é a vilã. 

Os deputados, amparados e impulsionados por setores produtivos poderosos, como o agronegócio e a mineração, disseram sim ao Frankenstein nefasto que se tornou o PL 2159/21, colocando sob ameaça imediata no Brasil uma área maior do que o território da Grécia – ou um território pouco maior do que a Transilvânia, na Romênia.

Na calada da noite, enquanto muitos sonhavam com um país mais justo e sustentável, nossos representantes cometeram o crime de colocar nossas florestas, campos, áreas alagadas, mares e nosso clima sob ameaça. E todos nós acordamos menos protegidos também.

Era noite. Convenientemente, ninguém podia nos ouvir gritar.

As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.

  • Cristiane Prizibisczki

    Jornalista com quase 20 anos de experiência na cobertura de temas como conservação, biodiversidade, política ambiental e mudanças climáticas. Já escreveu para UOL, Editora Abril, Editora Globo e Ecosystem Marketplace e desde 2006 colabora com ((o))eco. Adora ser a voz dos bichos e das plantas.

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