Análises

RPPNs em conectividade com a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso

As RPPNs estão no caminho das trilhas de longo curso e a integração entre as iniciativas de conservação é um bom negócio pro proprietário, para trilheiros e para natureza

José Sávio Monteiro ·
11 de outubro de 2020 · 4 anos atrás
A Serra da Mantiqueira, palco para a Trilha Transmantiqueira. Foto: José Sávio Monteiro

A RPPN, Reserva Particular do Patrimônio Natural, é uma unidade de conservação de domínio privado, criada pelo Estado, através da vontade e ato voluntário do proprietário da área. Uma vez criada, é gravada com perpetuidade na matrícula do imóvel, com o objetivo de conservar a diversidade biológica em caráter perpétuo para as futuras gerações. As RPPNs são estratégias importantes para consolidar e multiplicar áreas protegidas no território, principalmente onde a distribuição dos remanescentes florestais é maior em propriedades privadas.

Essa é a única dentre as todas as categorias de área protegida, administrada não pelo poder público, mas sim por proprietários particulares interessados na conservação ambiental, com o objetivo de preservar belezas cênicas e ambientes históricos, de proteger os recursos hídricos, de manejar os recursos naturais e de contribuir na manutenção de equilíbrios climáticos e ecológicos, além de vários outros serviços ambientais.

Além disso, são de extrema importância, pois contribuem para a ampliação das áreas protegidas no país, para a proteção da biodiversidade e dos biomas brasileiros, além de possibilitarem a participação da iniciativa privada no esforço nacional de conservação de nossas áreas naturais.

Na RPPN são permitidas atividades de pesquisas científicas e visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais, conforme previsto no seu Plano de Manejo.

Segundo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei 9.985/2000), que estabelece as RPPNs, elas pertencem ao grupo de uso sustentável. Além disso, é um dos seus princípios: a “busca de apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das unidades de conservação”. Sendo um de seus objetivos também favorecer condições e promover a educação ambiental, bem como a recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico, perfeitamente aplicáveis e conciliáveis para a gestão de uma RPPN, bem como de outras unidades de conservação existentes.

Desta forma, com este amparo legal e no intuito de se criarem novas iniciativas de incentivo ao turismo e à conservação da biodiversidade em nosso país, o governo federal, através da Portaria Interministerial nº 407/2018, assinada pelos Ministérios do Turismo e Meio Ambiente, e pelo ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, instituiu a Rede Nacional de Trilhas de Longo Curso e Conectividade. A Rede tem o objetivo de interligar unidades de conservação, paisagens e ecossistemas naturais e o intuito de reconhecer e proteger rotas pedestres de interesse natural, histórico e cultural, além de sensibilizar a sociedade para a importância do SNUC na proteção de nossa natureza e nossos recursos naturais.

Topo da Pedra da Mina, o 4º mais alto do Brasil. Foto: José Sávio Monteiro

No último mês de setembro, através de uma nova Portaria conjunta nº 500/2020, estes mesmos Ministérios e órgão ambiental federais, formalizaram institucionalmente a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso, que engloba várias trilhas locais e regionais, possibilita a consolidação de um importante instrumento de conservação do patrimônio natural e cria novas possibilidades sustentáveis para o turismo. Assim, com o devido amparo legal, as trilhas de longo curso passaram a fazer parte das políticas de meio ambiente e de turismo no país. Além de servir de opção de esporte na natureza e conexão para unidades de conservação federais, estaduais e municipais, as trilhas de longo curso contribuem para o fluxo da fauna e são potenciais para a geração de renda e melhora da economia das cidades localizadas ao longo dos percursos, fortalecendo a relação entre os diversos atores desses territórios.

Neste sentido, com vários objetivos em comum, é de total importância e viabilidade a conexão das áreas de conservação privadas, ou seja, das RPPNs, com a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso. Na somatória geral nacional, cerca de 26 Reservas Particulares do Patrimônio Natural estão conectadas por Trilhas de Longo Curso já implementadas ou ainda em fase de planejamento. Há pelo menos dois exemplos de RPPN que incluíram em seus Planos de Manejo, esta integração com as Trilhas de Longo Curso que passam por dentro de seus limites: a RPPN Pedra da Mina, no município de Queluz, estado de São Paulo, junto à região da Serra da Mantiqueira; e a RPPN Mato da Onça, no município de Pão de Açúcar, estado de Alagoas, na região do Baixo São Francisco.

A primeira unidade de conservação privada a ter esta integração foi a RPPN Pedra da Mina, situada no bioma da Mata Atlântica, que teve seu Plano de Manejo aprovado pela Fundação Florestal de São Paulo no início do mês de agosto (Portaria nº 79/2020). A Trilha Transmantiqueira passa dentro da reserva, em sua parte alta, no cume e base da Pedra da Mina, na Serra Fina, ponto culminante da Serra da Mantiqueira e quarto maior pico do Brasil. No plano esta área ficou definida como zona de visitação da RPPN, tendo ocorrido reuniões, oficinas e seminários em conjunto com diversos atores, buscando a interligação das UCs da Serra da Mantiqueira para a definição de melhor trajeto da Transmantiqueira e para realizar mutirões de sinalização nas trilhas já existentes.

Já a RPPN Mato da Onça, mais conhecida como Reserva Mato da Onça, inserida no bioma Caatinga, também teve seu Plano de Manejo aprovado pelo Instituto do Meio Ambiente de Alagoas na segunda quinzena do mês de setembro, o seu Plano de Manejo aprovado (Portaria nº 117/2020). Na reserva ocorre a integração com a Trilha do Velho Chico e seu plano prevê nas atividades tanto o turismo de natureza quanto a conectividade da RPPN com as demais UCs do Baixo São Francisco

Desta forma, mesmo sendo a RPPN uma unidade de conservação particular, administrada pelo proprietário, é perfeitamente legal e possível a sua utilização para o uso público nas suas áreas naturais e a sinergia com a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso. Alinhada com o pilar de conservação junto a possibilidade de fonte de renda para o manejo sustentável da reserva privada, as trilhas agregam valor ao proporcionar a toda a coletividade a chance de participar e contribuir, somando esforços no trabalho de proteção da natureza. Afinal, juntos somos mais fortes e unidos cuidamos do meio ambiente para as futuras gerações.

Assista na íntegra a live sobre RPPNs e a Rede Brasileira de Trilhas de Longo Curso:

*José Sávio Monteiro é advogado, coproprietário e gestor da RPPN Pedra da Mina

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