Colunas

Porque não ter animais de estimação

O amor aos bichos não pode ser egoísta ou criminoso.Ter animais silvestres em casa proveniente do tráfico é se igualar aos que entram na natureza para roubá-los.

20 de abril de 2006 · 18 anos atrás
  • Maria Tereza Jorge Pádua

    Engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Nat...

Esperem um pouco donos de cachorros, gatos e afins. Falo de animais silvestres, principalmente de araras, papagaios, passarinhos, macacos e coisas que tais. Realmente é um prazer ter um periquito ou papagaio que fala e que encanta as crianças com suas graças, bicadas e beleza de plumagem. Talvez ainda mais interessante seja ter um macaco que por ser mais inteligente muitas vezes age como nós humanos. Mas ter animais da fauna silvestre como bicho de estimação é um crime contra a natureza, por mais que o amemos e o tratemos bem. Por isso mesmo a legislação é severa quanto a se ter animais silvestres em casa.

A fauna silvestre é do Estado, que nos representa a todos, e por bons fundamentos ecológicos, deve ficar preservada na natureza, livre e reproduzindo. O Brasil é um dos campeões do mundo em extinção de animais silvestres, não particularmente por causa dos animais de estimação, mas eminentemente pela destruição de seus habitats. Lamentavelmente, os animais silvestres de estimação provêem de um comércio triste e sujo e, acima de tudo, muito cruel, tanto que de certa forma rememora os piores momentos da escravidão humana e que, também por isso, é ilegal. Assim, quem tem uma arara, por exemplo, adquirida ilegalmente está contribuindo com o comércio e contrabando ilegais, que aí sim, significa um dos fatores de extinção porque se capturam muitos indivíduos de poucas espécies, as mais raras e caras ou aquelas prediletas dos cidadãos comuns, que querem egoisticamente tê-los em casa. Algumas araras raras (gostei da redundância!) têm preços que alcançam milhares de dólares e, acreditem, não são somente elas que alcançam valores vultosos. De outra parte, muitos também não querem entender que se lhes fosse dado o direito de ter animais silvestres, todos os outros brasileiros deveriam ter o mesmo direito. Qual seria então o volume de animais necessário, fora as perdas na captura e no transporte?

É impressionante como é difícil em nossos dias se manter populações geneticamente viáveis de animais silvestres. No caso da arara é surpreendente, pelo menos o foi para mim, saber que em uma reserva de 106 mil hectares, a do SESC Pantanal, em Mato Grosso, onde existe a maior população de arara azul conhecida do país, cerca de 300 indivíduos, nascem apenas de 30 a 35 crias por ano. Isto em uma enorme área protegida onde tudo é feito para garantir sua reprodução e proteção. A destruição das palmeiras e árvores que oferecem sua comida ou os locais para sua reprodução é o fator limitante principal de sua população e essas plantas estão cada vez mais raras, devido ao desmatamento, às queimadas e à exploração florestal.

Quando as autoridades constituídas, em geral o IBAMA, faz as apreensões no cumprimento da legislação, é uma choradeira… Principalmente para os estrangeiros que aqui vivem e quando se mudam para outro país querem levá-los a todo custo. Recorrem a políticos e autoridades e não se conformam com o indefectível “não”. A autoridade não tem o poder de arbítrio. Tem de cumprir a Lei, que felizmente é boa.

Então em nenhuma hipótese se pode ter animais silvestres como de estimação? Não é bem assim. Pode-se tê-los se provenientes de criadouros devidamente autorizados pelo IBAMA. Há muitos criadouros de jibóias, por exemplo. Não me perguntem por que muitos gostam de ter jibóias em casa. Há de pererecas e de muitos outros animais ou espécies, melhor dizendo. Pode-se adquiri-los legalmente, eles são “chipados” e estão sob total controle das autoridades. Já li na imprensa que os criadores de jibóia têm uma grande demanda e os preços são bem salgadinhos. Em outros países as rãs e pererecas fazem enorme sucesso também. Mas há criadores de animais mais simpáticos como de bicudo e curió, ou de outras belas aves. Infelizmente não tenho notícias de criadores de gatos silvestres. Bem que eu gostaria de ter um gato em casa, fora o meu marido, é claro.

Meu conselho a quem quer ter animais silvestres como pets é adquiri-los de criadouros legais, quando são reproduzidos em cativeiro. Garanto: são iguais aos da natureza e quem comprá-los não vai ter a consciência pesada de estar contribuindo para um contrabando que envolve animais silvestres e drogas, que em geral é de mão dupla e faz um simples cidadão transformar-se em um criminoso asqueroso.

Ter um animal silvestre como de estimação sem riscos é possível, mas os animais domésticos são simpáticos também. Meu cachorro até já aprendeu a me chamar quando os sagüis vêm comer frutas no meu quintal. E olha que o nome dele é Estupidus…

Leia também

Reportagens
31 de agosto de 2024

Em duas décadas, vegetação nativa perdida no Brasil tem quatro vezes a extensão de Portugal

Entre 2004 e 2023 foram convertidos 40,5 milhões de hectares de florestas para atividades produtivas, principalmente agropecuária, nos biomas brasileiros

Notícias
30 de agosto de 2024

Desafios e futuro da preservação ambiental marcam 1º dia do Seminário de Jornalismo Ambiental ((o))eco

Evento marcou o início da comemoração de 20 anos de ((o))eco, com mesas de conversa, entrevistas, mostra de cinema e lançamento da Bolsa Reportagem Vandré Fonseca de Jornalismo Ambiental

Salada Verde
30 de agosto de 2024

De olho nas formigas: ICMBio convida sociedade a ajudar na coleta de dados sobre espécies

Órgão ambiental abre consulta pública para avaliar risco de extinção de formigas, pessoas podem enviar contribuições como registros e fotos até o dia 8 de setembro

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.