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Machos beta

Governo teme reação do público e não adota medidas a favor do manejo de fauna. Erra, pois a prática também é necessária para preservação da biodiversidade.

28 de junho de 2006 · 18 anos atrás
  • Maria Tereza Jorge Pádua

    Engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Nat...

Os machos beta são aqueles indivíduos desprestigiados nos grupos familiares de mamíferos silvestres em geral, do reino animal. Não copulam com as fêmeas disponíveis, enquanto estiver presente o macho alfa, o rei do pedaço. Se por um motivo ou outro, o macho alfa é afastado, os beta se fartam com as fêmeas, até então não utilizadas, e causam algo muito importante sob o aspecto comportamental: aumentam o número das crias, portanto a população do grupo. Este fato é fundamental e corriqueiro no manejo da fauna silvestre.

Recentemente tivemos conhecimento pela mídia e publicações científicas, que a caçada aos ursos selvagens, admitidas por lei nos Estados Unidos, provocou um aumento populacional da espécie de urso vítima de caçadas esportivas. Este fato é algo bem fácil de ocorrer. Os caçadores, para demonstrarem sua virilidade, querem troféus de peso. Assim, preferencialmente, matam os grandes ursos, os machos alfa, que dominam aquela população, são os mais bonitos na opinião das ursas e determinam o comportamento parental. Como são os maiores, oferecem um troféu de uma cabeça mais expressiva e importante para se ter em casa, em cima de lareiras.

Com a morte do macho alfa, os beta entram nos grupos, se aproveitam das virgens no cio e procriam aos montões. Resultado? Aumento populacional. Assim, é evidente que essa caçada determina um maior número de crias. Coitados dos alfa monogâmicos…

Técnicas de manejo como essa são usadas sempre nos países que permitem algo comum: as caçadas esportivas ou cinegéticas. Claro está que muitas técnicas de manejo são usadas para evitar a depleção populacional de espécies passíveis deste esporte, tão repugnante para uns e tão corriqueiro para outros.

O mais importante a se ressaltar deste fato é que, se quisermos proteger realmente, e não com sentimentalismos bobos, a fauna silvestre, é fundamental manejá-la e conhecer cientificamente seus hábitos e comportamentos. Em um país como o Brasil, onde a caça esportiva é abominada e ilegal, onde não se conhece cientificamente, não se maneja, não se faz dinheiro com o manejo sustentável, esta palavra é tão superficialmente usada e abusada em nosso meio.

A caça que faz bem

Caçar é um esporte que depende de cada indivíduo. Eu, pessoalmente, jamais poderia matar um animal por prazer, mas como técnica da área, tenho de reconhecer, que a caça cinegética é um instrumento ótimo para valorizar a fauna silvestre, para protegê-la e conhecê-la cientificamente. Posso perceber, ainda, com toda clareza, que destruir os habitats para a agricultura, pecuária, ou outras atividades humanas desenvolvimentistas, mata muito mais, ou melhor, inviabiliza a reprodução, alimentação e a vida da maioria das espécies silvestres de nossa tão decantada e ameaçada fauna silvestre, se comparadas à caça amadorista bem manejada.

Por que então a caça é proibida e vista como algo tão devastador no Brasil? A resposta é simples: falta de conhecimento técnico e científico, de pesquisas e falta de fiscalização adequada.

Se ainda existem banhados no estado do Rio Grande do Sul, como já falamos até aqui em O Eco no passado, é graças ao fato de que a caça amadorista, pelos menos de algumas espécies de aves, foi e é permitida naqueles rincões. Os fazendeiros ganham mais alugando suas áreas para a caça do que drenando e plantando arroz. Ou seja, destruindo toda e qualquer possibilidade de se ter espécies da fauna silvestre nas suas fazendas produtoras de arroz, ou melhor, só tendo algumas pragas indesejáveis.

Outro aspecto pouco ou nada esclarecido à nossa gente é que em muitos Parques Nacionais e áreas protegidas nós temos espécies nativas do Brasil, mas não autóctones dessas áreas, que, por ocuparem nichos de outras, deveriam ser eliminadas. Mas, onde está a coragem para se enfrentar um abate, mesmo que não seja através da caça amadorista e sim de funcionários das agências governamentais?

Manejo bem vindo

E assim assistimos, há décadas, a discussão do que se fazer com o teiú, uma espécie introduzida, invasora e exótica no Parque Nacional de Fernando de Noronha, que destrói os ovos de aves nativas e precisa ser eliminado. Por que esconder ou empurrar para debaixo do tapete decisões que são baseadas em conclusões científicas, mas que esbarram no sentimentalismo de pessoas que não receberam a certa informação, que abatê-los significaria salvar outras espécies da morte, que são locais e muitas vezes endêmicas?

Por que admitimos que em determinadas áreas protegidas, por um fator ou outro, provocado por nossa espécie, ou seja, atividades humanas, haja uma superpopulação de uma espécie que precisa ser cientificamente controlada para beneficiar outras locais e, ao contrário, não informamos nossa gente? Será que pensamos que são analfabetos insensíveis a informações corretas e procedentes?

Mesmo fora de Parques Nacionais ou áreas protegidas, ocorrem bichos que precisam ser controlados e eliminados, como o caso do sagüi de tufo branco (Callitrix jacus), introduzido na ilha de Santa Catarina por uma pessoa mal preparada e que, ao se espalhar, está ocasionando a impossibilidade da reprodução das gralhas azuis, nativas do local, porque comem seus ovos e destroem seus ninhos. Este é só um exemplo de muitos que existem no país…

Onde estão os nossos machos alfa do Poder Público que sequer podem ser honestos, por medo de desagradar pessoas de boa fé, que não querem assistir ou saber da morte de alguns indivíduos de alguma espécie para benefício de se preservar a nossa tão rica, desconhecida e maltratada biodiversidade? Vamos deixar sempre que os machos beta do governo quer sejam do executivo, judiciário ou do legislativo, predominem sobre a ciência e se locupletem do desconhecimento geral?

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