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O Inimigo

Dilma Roussef continuará no ataque. O Meio Ambiente que se cuide: quer acabar com as restrições ambientais aos investimentos, além de mudar a política econômica.

12 de novembro de 2005 · 19 anos atrás
  • Sérgio Abranches

    Mestre em Sociologia pela UnB e PhD em Ciência Política pela Universidade de Cornell

A ministra Dilma Roussef, na entrevista em que aqueceu o clima já escaldante da política brasiliense, não atirou só nos ministros Antonio Palocci e Paulo Bernardo. Sobrou, também, para a ministra Marina Silva. Ela não recebeu os mesmos petardos que desqualificaram liminarmente as propostas fiscais da equipe econômica. Afinal, o ministério do Meio Ambiente está na periferia do poder. Mas “as restrições ambientais” foram listadas pela Chefe da Casa Civil, junto com a política econômica restritiva e dificuldades gerenciais, como obstáculos ao crescimento sustentado do país.

A ministra-chefe voltou, dessa forma, à atitude que já havia adotado quando ministra da Energia. Às favas com o meio ambiente. O país precisa de infra-estrutura para crescer e essas restrições ambientais são uma pedra no caminho do nosso desenvolvimento.

Dilma é a típica engenheira de obras. Progresso para ela tem que ter trator, cimento, asfalto e empreiteira. Se o custo for a moto-serra, paciência. A ministra é uma determinista. Acredita nas forças da história. Mas, em matéria de meio ambiente, é sempre uma fatalista. Foi o que mostrou no caso, por exemplo, da fraude de Barra Grande, que ela, o IBAMA, o MMA e o presidente Lula simplesmente desconsideraram, aprovando a barragem. (Hoje dá para entender porque esse governo não acha que todo crime deve ser punido.) Na época, a ministra, agora quase uma super-ministra, reconheceu que tinha havido fraude e perguntou: “Fazer o que? Paciência, o que está feito, está feito”. Transformou o fato determinado em fato consumado. Agora, ela acha que restrição ambiental é como juros altos, superávit fiscal e ministro incompetente.

A ministra acredita que o Brasil precisa recuperar o tempo perdido e voltar a investir em infra-estrutura, para criar as condições para o crescimento sustentado. Nisso ela está certa. Mas, ao invés de juntar-se com seus colegas da economia e do meio-ambiente e desenhar um programa de energia, transportes e logística que ajude a preservar o meio-ambiente, criando condições sustentáveis para o crescimento sustentado, ela prefere desqualificar o programa de estabilidade da equipe econômica e tratar a preocupação ambiental, como restrição a ser eliminada. Uma chateação de um bando de reacionários, que não desejam o progresso.

A proposta da equipe econômica que ela desancou, criando o maior banzé e fazendo com que o presidente se fingisse de aborrecido e espinafrasse todo mundo, era de ajuste fiscal por dez anos. Para Dilma foi a gota d’água da desfaçatez neoliberal. Deve ter falado com seus botões: “os caras já melaram o primeiro governo Lula, agora querem melar os próximos dois”. E partiu para o ataque.

A ministra Marina que se cuide. Vai ter que aprovar tudo que é hidrelétrica e rodovia, tenha ou não EIA-RIMA favorável. Se não dança. E ela não tem as costas quentes como Palocci, que é o doce de coco do mercado financeiro e toda vez que é ameaçado, o dólar sobe, a bolsa cai e o risco Brasil aumenta um punhadinho de pontos base. Palocci é consenso no mercado: o melhor economista de Chicago do Brasil. Marina, não. Ela divide os ambientalistas e como não é de muita briga, não mobiliza muito apoio.

É pena, porque, com todos os erros, a ministra do Meio Ambiente acerta mais que seus colegas da equipe econômica e sua Chefe do Gabinete Civil. A equipe econômica errou ao manter os juros altos demais, por tempo demais. Errou, ao não ser capaz de propor uma reestruturação do setor público que permita, baixar os juros de forma sustentada, eliminar o déficit estrutural das contas públicas e reduzir a carga tributária. Pode parecer ambicioso, mas é do que precisamos. Acho que combina com um governo, para o qual tudo está no marco zero: “nunca houve na história desse país, um governo como esse”. Graças a Deus. Dois o país não agüentaria.

Mas a ministra Dilma tem um ponto: ajuste fiscal por mais 10 anos, é brincadeira. Só que ela não percebe que o que precisamos, mesmo, é uma profunda reforma fiscal, que nos garanta mais de dez anos de condições favoráveis para crescer. Essa política de ajuste só dá em stop and go. Esperem e verão. Em algum próximo verão esse parco crescimento que tivemos nos últimos dois anos, vai derreter e virar estagnação ou recessão de novo.

Mas Dilma está errada quando imagina que tudo que precisamos é de pau na máquina, botar os tratores e britadeiras para funcionar e dane-se o resto. Não percebeu que, além de termos batido, há muito, nos limites fiscais do estado e da sociedade, estamos muito perto de nossos limites ambientais. Difícil encontrar uma área onde possamos dizer que não temos problemas, hoje, de água, de mata ou de ar. E, em muitos lugares, por razões óbvias e solidamente científicas, o problema atinge essas três dimensões em muitas regiões. Dou dois exemplos: queimadas/desmatamento/seca, destroem a mata, pioram a qualidade do ar e comprometem o fluxo de águas. Há regiões na Amazônia e no Centro-Oeste, no limite de tolerância em relação a esse conjunto. E, em muitos lugares, inclusive no Pantanal, os agrotóxicos ainda, de quebra, também poluem as águas.

O segundo exemplo é da poluição do ar, por causa da má qualidade de nossos combustíveis, associada à poluição industrial, do ar e das águas, ao despejo de esgoto urbano nos rios, à baixa cobertura vegetal – e a pouca que existe também sofrendo com a poluição. Hoje, o pior lugar para se tentar fugir da poluição urbana na cidade de São Paulo é o Parque do Ibirapuera. Campeão de ar impróprio para o consumo humano. Pobre Tietê, águas impróprias para o consumo humano também.

Só não vê quem não quer. Esse governo não quer. Quando leio análises prospectivas comparando Brasil e China, uma das nossas vantagens, sempre presentes, é que não temos nem o passivo, nem as limitações ambientais que a China já tem. Zheng Bijian, que preside o Fórum para Reforma da China, assessor do PC Chinês na formulação de planos estratégicos – escreveu os últimos cinco planos de desenvolvimento chineses – afirmou, em artigo recente para a revista Foreign Affairs, que seu país já não tem água, ar e recursos naturais para crescer. Bateu no limite ao crescimento. Para continuar a crescer, terá que recuperar esses limites. Coisa que vai exigir paciência e perseverança de chinês. Mas os chineses que se cuidem, se depender do governo Lula e da sua ministra-chefe Dilma Roussef, já-já chegamos lá.

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