O movimento preservacionista tem suas raízes nos países ricos, e algumas das mais atuantes ONGs do mundo surgiram no hemisfério norte. Algumas dessas organizações têm raízes profundas, mas sua capacidade de mobilizar ativistas e influenciar eventos em escala global é relativamente recente, e os países que hoje são ricos chegaram a essa posição agredindo o meio ambiente – consumindo recursos renováveis, destruindo florestas e outros habitats, emitindo poluentes e provocando o aquecimento global através da emissão dos gases do efeito estufa.
Essa observação nos leva a algumas questões fundamentais. Uma delas é a seguinte: que preço as populações dos países mais desenvolvidos estão dispostas a pagar para reduzir o impacto sobre o ambiente de suas atividades? Essa questão está por trás de uma boa parte do debate sobre aquecimento global e dos conflitos em torno do Protocolo de Kyoto. Pouca gente fora do movimento ambientalista acredita que as sociedades ricas estão dispostas a encarar reduções do seu nível de vida para combater o aquecimento global. Diante dessa constatação, líderes políticos procuram maneiras de evitar o dilema, seja através da ênfase nas soluções tecnológicas futuras, seja na busca de atalhos, tais como o esquema de comercialização de direitos de emissão de carbono embutido no Protocolo. O impulso é natural, mas a escala dos riscos do problema e dos custos das soluções é monumental. Como se isso não bastasse, é preciso lembrar ainda que os riscos e custos se distribuem de maneira muito desigual pelo mundo. As bases para o maior problema de governança da história da humanidade estão lançadas.
Os esforços de preservação da floresta amazônica mostram o quanto é difícil lidar com o tema. A Amazônia é um patrimônio global, tanto pela biodiversidade que abriga quanto pela sua capacidade de fixar carbono. No entanto, esses benefícios globais ainda geram pouca ou nenhuma receita para os governos dos países responsáveis pela sua conservação. Essa conservação custa caro, especialmente para países pobres com instituições fracas. Não é justo nem realístico esperar que esses países arquem com os custos, mas ainda não há mecanismos globais que permitam que o resto da humanidade pague uma parte dessa conta.
É importante notar que para os países em desenvolvimento a discussão vai muito além dos custos da conservação. A questão é saber se será possível atingir os mesmos níveis de vida desfrutados hoje pelos países ricos, e a que custo ambiental. Em nenhum lugar do mundo a questão aparece de maneira mais clara do que na China, pelo tamanho da sua população e rapidez do seu crescimento de cerca de 9% ao ano.
Um artigo recente da revista inglesa The Economist mostra as dimensões do problema. Apesar de haver indicadores positivos aqui e ali – estações modernas de tratamento de lixo em algumas grandes cidades, os primeiros e tímidos sinais de consciência ambiental na sociedade e no governo – o cenário ainda é sombrio. Água poluída por resíduos tóxicos, ar poluído pela queima de carvão na geração de energia e no aquecimento doméstico, erosão de terras plantáveis e desertificação, chuva ácida – todos estão presentes e crescendo, acompanhando a expansão da sua economia. Fato que pode estar sendo exacerbado pela tradição cultural chinesa onde, segundo a revista, o homem subjuga a natureza ao invés de viver em harmonia com ela.
Seria razoável esperar que a China buscasse outros caminhos para o desenvolvimento sustentável? O governo trabalha para tirar da pobreza milhões de chineses, com um modelo de desenvolvimento baseado na expansão da indústria manufatureira, que tem como inevitável conseqüência o crescimento do consumo de energia e de matérias-primas. Não é de se estranhar que o crescimento econômico seja visto como prioridade acima da preservação do meio-ambiente. Afinal, pode-se argumentar que animais e plantas não derrubam governos.
A forma mais razoável de mudar este quadro, dando voz às populações afetadas pela destruição ambiental e conscientizando a sociedade para os seus impactos futuros é a criação de instituições que garantam que os custos dessa destruição entrem na conta dos destruidores e não sejam simplesmente arcados pela sociedade. É mais um desafio para os países em desenvolvimento, onde a consolidação das instituições ainda é mais desejo do que fato.
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