Colunas

Limpando a barra

Empresas petrolíferas são sinônimo de risco ambiental, mas estão tentando melhorar sua imagem junto ao público. O novo diesel da Petrobras é exemplo disso.

3 de junho de 2005 · 20 anos atrás

Não é fácil dar crédito para profissão de fé ambiental de empresa de petróleo. Para começar, a atividade de extração, refino e comercialização de petróleo implica em grande impacto ambiental, mesmo quando conduzida da maneira mais limpa e segura possível. E nem sempre as grandes empresas do setor têm se comportado de maneira exemplar, apesar dos grandes esforços de mudança de imagem de algumas das grandes – como a BP, a Total e a Shell, que estão procurando se reinventar como empresas de energia renovável e de desenvolvimento sustentável.

Alguns dos piores desastres ambientais da história foram provocados por empresas petrolíferas. O vazamento do Exxon Valdez, por exemplo. Em 1989, o superpetroleiro com esse nome colidiu com um recife em Valdez, no Alasca, após receber sua carga de petróleo. O acidente resultou no vazamento de 42 mil metros cúbicos de petróleo, suficientes para contaminar 19 mil quilômetros de costa.

A inacessibilidade do local dificultou esforços para conter o petróleo vazado, e as melhores estimativas indicam que morreram de imediato 250 mil aves marinhas, 2.800 lontras-do-mar, 300 focas, 250 águias carecas, 22 orcas e bilhões de ovos de salmão e arenque. Mas o impacto do desastre continua reverberando pela cadeia alimentar, e estudos recenteslutando na justiça para reduzir o valor das indenizações que deve pagar para as vítimas do acidente e para o governo.

Seria injusto usar o caso Exxon Valdez para carimbar todas as empresas de petróleo do mundo como irresponsáveis e aéticas. Mas o caso serve para lembrar que no seu dia-a-dia essas empresas extraem petróleo em áreas remotas do planeta, o transportam ao redor do mundo, refinam e vendem os produtos. É óbvio que isso envolve riscos, que não podem ser inteiramente controlados. Situações semelhantes ocorrem aqui perto: no Equador, por exemplo, onde grupos locais acusam a multinacional americana ChevronTexaco de ter poluído uma extensa área de floresta amazônica e exigem compensações pelo estrago provocado.

E a nossa Petrobras? Uma rápida procura na Internet sugere que ela não tem um histórico ambiental dos mais puros. O Eco revelou em 2004 que a empresa planejava perfurar dentro de um parque nacional equatoriano em busca do ouro negro. Outro indicador: uma busca no Google mostra mais de 180 notícias com as palavras “Petrobras” e “acidente”.

A maior parte das notícias se refere ao ano de 2000, marcado pelos vazamentos de óleo no Rio de Janeiro e no Paraná. De acordo com a Petrobras, esses eventos deflagraram uma revolução dentro da empresa. Investimentos de R$ 8 bilhões em gestão ambiental e segurança operacional no período de 2000 a 2004 resultaram numa redução dramática no volume de vazamentos e melhoria substancial em outros indicadores ambientais.

Mas o impacto ambiental de uma empresa de petróleo não termina na refinaria. Os combustíveis que ela produz servem para manter automóveis, caminhões e ônibus em marcha nas ruas e estradas, movimentando a economia – e poluindo o ar. As empresas de petróleo podem não ter controle sobre os níveis de consumo de combustíveis, mas têm controle sobre sua qualidade.

A própria Petrobras chamou atenção para o assunto ao anunciar, no início de maio, a introdução de uma nova formulação de óleo diesel com teores reduzidos de enxofre. Presente em maior ou menor quantidade no petróleo, o enxofre combinado com o oxigênio durante a combustão produz o dióxido de enxofre, gás com forte odor que causa desconforto na respiração, doenças respiratórias e o agravamento de doenças respiratórias e cardiovasculares já existentes. Seu principal impacto sobre o meio ambiente é através do fenômeno da chuva ácida, que causa danos à vegetação natural e às colheitas.

O enxofre presente no petróleo é apenas resíduo do processo de destilação, e não cumpre nenhuma função nos motores dos automóveis e caminhões. Ao contrário: as técnicas mais modernas de controle da poluição dos veículos a gasolina e diesel exigem combustíveis com baixíssimos teores de enxofre para funcionar. Assim, a sua redução gradual tem sido objetivo do PROCONVE, o programa brasileiro de redução de emissões, e os seus estágios futuros exigirão uma redução ainda maior. A Petrobras faz sua parte, uma parte importante na medida em que possibilita a introdução de tecnologias mais avançadas nos motores dos veículos a diesel.

A questão importante é saber por que grande parte das empresas desse setor tem, de uns anos para cá, adotado uma postura mais ambientalmente responsável.

A crescente conscientização da população sobre os danos que as operações das petroleiras causam tem levado à criação de mecanismos para cobrar o custo desse estrago, que era quase sempre absorvido pela sociedade. Isso acontece tanto pelo lado regulatório quanto pelos tribunais e pela pressão dos investidores exigindo transparência cada vez maior para os passivos ambientais. O que essas empresas recém-convertidas para a crença da sustentabilidade estão buscando é a sua própria sobrevivência.

Leia também

Análises
23 de dezembro de 2024

Soluções baseadas em nossa natureza

Não adianta fazer yoga e não se importar com o mundo que está queimando

Notícias
20 de dezembro de 2024

COP da Desertificação avança em financiamento, mas não consegue mecanismo contra secas

Reunião não teve acordo por arcabouço global e vinculante de medidas contra secas; participação de indígenas e financiamento bilionário a 80 países vulneráveis a secas foram aprovados

Reportagens
20 de dezembro de 2024

Refinaria da Petrobras funciona há 40 dias sem licença para operação comercial

Inea diz que usina de processamento de gás natural (UPGN) no antigo Comperj ainda se encontra na fase de pré-operação, diferentemente do que anunciou a empresa

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.