A informação é essencial para a sensibilização da sociedade sobre os impactos humanos no sistema climático do planeta. De acordo com um estudo de pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), 94% das pessoas acreditam que estamos passando por uma mudança climática e 91% pensam que o fenômeno é causado principalmente pela atividade humana. No entanto, os dados coletados revelam que apenas 56% acreditam que isso seja grave. Nesse cenário, a informação jornalística devidamente apurada e com rigor ético pode colaborar para um melhor entendimento sobre as variáveis que envolvem as mudanças climáticas.
O jornalismo é um serviço público que presta informações relevantes à sociedade e, por meio de uma cobertura qualificada, regular e crítica, pode conscientizar os cidadãos sobre como as mudanças climáticas já afetam as suas realidades e sobre as possibilidades de mobilização coletiva por medidas de enfrentamento, mitigação e adaptação. O jornalismo tem por essência o compromisso de fornecer informações que ajudam a sociedade a entender a complexidade dos acontecimentos do mundo. Quando as mudanças climáticas estão em pauta, é função primordial dos jornalistas promover uma contextualização que explique termos científicos, exponha os causadores do problema e aponte soluções possíveis.
No artigo “O Jornalismo Ambiental como agente da mudança de pensamento no contexto da emergência climática”, desenvolvido por pesquisadoras do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS), foram elencados sete pressupostos que os jornalistas devem incorporar em suas rotinas produtivas para auxiliar na percepção pública acerca das mudanças climáticas. São eles: ênfase na contextualização; pluralidade de vozes; assimilação do saber ambiental; cobertura próxima à realidade do leitor; comprometimento com a qualificação da informação; incorporação do princípio da precaução e a responsabilidade com a mudança de pensamento.
Este último pressuposto se relaciona à função educativa do jornalismo, isto é, à interconexão entre o jornalismo e a educação ambiental/climática. A responsabilidade com a mudança de pensamento visa promover uma mudança de comportamento por meio da produção de informações ambientalmente corretas. Isso porque a forma como as mudanças climáticas são abordadas em notícias e reportagens influencia na compreensão pública da questão, o que pode facilitar ou dificultar a conscientização e mobilização da população.
As mudanças climáticas são o sinal mais evidente de que é preciso questionar o paradigma capitalista da exploração dos bens naturais e da concentração das riquezas. Porém, para serem capazes de criar soluções sustentáveis como alternativa a esse quadro, os sujeitos devem se abrir ao diálogo e a outras visões de mundo – especialmente aquelas que são invisibilizadas pelas relações de poder vigentes. Uma prática jornalística comprometida com a diversidade de perspectivas ante ao discurso dominante do progresso a qualquer custo pode auxiliar nesse processo de transformação social.
O jornalismo cumpre a sua responsabilidade com a mudança de pensamento quando aponta de forma incisiva os maiores responsáveis pelas mudanças climáticas. Desde a Revolução Industrial são emitidas toneladas de gases de efeito estufa (GEE), como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N20), devido às atividades industriais e ao agronegócio. No setor energético, as emissões são predominantemente resultantes da queima de carvão, petróleo e gás para geração de eletricidade e transporte. Já no agronegócio, práticas agrícolas intensivas, incluindo o desmatamento para expansão de terras, a criação de gado e o uso de agrotóxicos, são responsáveis pela alta emissão de gases poluentes. Isso quer dizer que a queima prolongada de combustíveis fósseis e o uso insustentável de energia e do solo são os maiores intensificadores das mudanças climáticas. É dever do jornalismo explicitar isso.
O jornalismo cumpre a sua responsabilidade com a mudança de pensamento quando aponta os mais ricos como os principais investidores em indústrias poluentes e estilos de vida que resultam em grandes emissões de CO2, desmistificando o senso comum de que os mais pobres são os que mais poluem. Os dados são do relatório Igualdade Climática: Um Planeta para os 99%, realizado pela organização não governamental Oxfam. De acordo com os cálculos da Oxfam, um imposto de 60% sobre a renda do 1% mais rico do mundo resultaria em uma arrecadação de US$ 6,4 trilhões, recursos que poderiam ser direcionados para combater a crise climática. Esses fundos poderiam ser utilizados para financiar a transição energética e para ajudar países e regiões que enfrentam impactos significativos em suas populações.
O jornalismo cumpre a sua responsabilidade com a mudança de pensamento quando traz para a centralidade do debate a questão da justiça climática, tendo em vista que, embora as mudanças climáticas sejam uma realidade global, suas consequências impactam a população de maneira desigual, atingindo mais quem vive na pobreza, mulheres e meninas, pessoas pretas, comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas do Sul Global. É preciso evidenciar que as populações das periferias são as que menos produzem gases de efeito estufa, mas são as mais afetadas pelos eventos extremos climáticos, como enchentes e deslizamentos de encostas dos morros.
Apesar de suas óbvias diferenças em relação a um espaço de educação formal, como as escolas, o jornalismo não deve menosprezar seu alcance e presença na rotina da população. Neste sentido, assumir a responsabilidade com a mudança de pensamento significa assumir o potencial do jornalismo em motivar reflexões e ações que impactam a sociedade.
Assim como já discutimos na coluna “A cobertura da crise climática: o que pensam os públicos engajados sobre o trabalho jornalístico?”, informar de modo a contextualizar, conscientizar e mobilizar a população sobre o tema não é uma tarefa simples e exige tempo, qualificação profissional e abertura editorial dos veículos de comunicação. Mas é urgente a necessidade de ampliar a produção de informações que auxiliem na compreensão da realidade e na construção de uma nova forma de pensar a situação atual, além de apresentar estratégias verdadeiramente eficazes de enfrentamento à emergência climática.
As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.
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Ah! Hahahahahaha! Meus nobres mudança de mentalidade? Venho dizendo isso a muito tempo! Será que ainda não foi percebido que os métodos da revolução industrial, revolução verde, revolução tecnológica estão fadados a exaustão? Sem a reformulação do PENSAMENTO ? Não precisa ser cientista para identificar que os métodos do século XIX, não dará mais certo!. Mas se, se continuar se insistindo na repetição e não no pensamento, não precisa ser matemático ou químico ou ainda físico que a escolha que fizemos ou que nos foi imputado. Não vai dá certo!