Parlamentares idealizadores de um projeto de lei que afeta duas importantes unidades de conservação do Acre concorrem ao executivo estadual. Eles defendem reduzir o tamanho da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes e rebaixar o Parque Nacional da Serra do Divisor para a categoria de Área de Proteção Ambiental (APA).
Uma das candidatas é a deputada federal Mara Rocha, que trocou o PSDB pelo MDB, e também é autora do PL 6024, apresentado em novembro de 2019 no Congresso Nacional. O projeto foi apadrinhado pelo senador Márcio Bittar (União Brasil), outro candidato. Ambos são ligados ao setor do agronegócio e ao bolsonarismo.
A dupla é crítica contumaz das normas e regras ambientais, acusando-as de serem entraves para o desenvolvimento econômico da região e de atenderem a interesses estrangeiros.
A retirada de pelo menos 22 mil hectares da Resex Chico Mendes, prevista no texto do projeto, atende a interesses de um grupo de moradores da unidade de conservação que respondem a processos por danos ambientais por desmatarem além do permitido. Eles já derrubaram boa parte da floresta dos antigos seringais, transformando-os em médias e grandes fazendas de gado.
Este mesmo grupo recorre com frequência a Mara Rocha e a Márcio Bittar quando se sentem incomodados pelas fiscalizações do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Também em novembro de 2019, eles tiveram reunião com o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para reclamar das operações do ICMBio.
Conforme noticiado à época, a reunião teve resultado satisfatório para o grupo, pois a partir de então Salles determinou o fim das fiscalizações ambientais. Não por acaso, a UC está entre uma das mais impactadas pelo desmatamento e as queimadas nos últimos três anos na Amazônia Legal.
O encontro foi intermediado por Márcio Bittar e Mara Rocha, e contou com a participação de outros membros da bancada federal do Acre. Entre eles estava o senador Sérgio Petecão (PSD), que também disputa o governo do estado.
A última demonstração de força política deles foi a exoneração do chefe da Resex Chico Mendes, o servidor de carreira do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Flúvio Mascarenhas. A demissão aconteceu após a especulação de que o instituto faria uma grande operação de retirada de gado de dentro da reserva; tudo não passava de especulação, mas as pressões políticas resultaram na queda do servidor.
Com o Acre ainda sendo território fértil do bolsonarismo na região amazônica, Mara Rocha e Márcio Bittar tentam surfar na popularidade do presidente da República, ecoando a retórica anti-ambiental e de defesa do agronegócio. As duas candidaturas representam o racha dos partidos de direita na disputa pelo governo local. Em 2018, todos estavam no mesmo palanque que elegeu Gladson Cameli (PP) governador.
A candidatura de Mara Rocha é a mais consolidada com o agronegócio acreano. Como vice de sua chapa ela tem o fazendeiro Fernando Zamora. À Justiça Eleitoral, ele define sua ocupação como “produtor agropecuário”. A candidata de Mara Rocha ao Senado é Márcia Bittar (PL), esposa de Márcio, que se apresenta como a representante legítima do presidente Jair Bolsonaro pelas terras acreanas.
Boi e soja na floresta
O plano de governo da deputada bolsonarista dedica os dois primeiros tópicos exclusivamente ao setor rural.
O programa 1.1 trata da “estruturação e fortalecimento do agronegócio”. No sumário não aparecem propostas voltadas para o meio ambiente, mesmo com a Floresta Amazônica ocupando, até o momento, 86% do território acreano.
O Acre também passa por um de seus piores momentos em termos de proteção do bioma, registrando crescente elevação em suas taxas de desmatamento.
Em 2021, conforme análises do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o estado teve a maior área de floresta derrubada dos últimos 18 anos: 891 km2.
Uma das vozes mais críticas às políticas de preservação ambiental – em especial as adotadas durante os 20 anos de governos petistas do Acre – Márcio Bittar concorre pela quarta vez ao cargo de governador, sempre acusando o ambientalismo de provocar o atraso do desenvolvimento econômico do estado.
Seu plano de governo tem apenas 11 páginas. Sua candidatura foi lançada em cima da hora após romper com Gladson Cameli.
Mesmo no improviso, Bittar não perdeu a chance de atacar o movimento ambiental, a quem acusa de mergulhar o Acre na miséria – mesmo argumento usado para defender a desafetação da Resex Chico Mendes e a exploração de recursos minerais no Parna da Serra do Divisor. Para ele, as políticas de proteção da Floresta Amazônica servem apenas para atender aos interesses internacionais, travando o “progresso”.
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