A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se retirou, em protesto, da câmara de conciliação instalada pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, para decidir sobre o Marco Temporal. Após ter pedidos negados ou não apreciados, como a prévia suspensão da lei 14.701/23, que instituiu a tese, e que a conciliação fosse decidida mediante consenso dos membros, e não simplesmente o voto da maioria, a organização oficializou sua saída durante a segunda reunião da comissão, ocorrida na tarde desta quarta-feira (28).
Como mostramos antes da primeira sessão da Comissão Especial que analisa a constitucionalidade da lei, os representantes indígenas são minoria no colegiado que pode definir seu futuro. Apenas 6 dos 23 membros com direito a voto foram indicados pela organização. A Apib alega que direitos de minorias não podem ser decididos dessa forma, devendo ser protegidos pelo STF, e que essa forma de decisão viola a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, que obriga a consulta e o consentimento de povos indígenas sobre medidas que os afetem diretamente.
Segundo a ata da sessão, que não foi transmitida, a representação da Apib leu uma manifestação onde a organização manifestava seu descontentamento, e frisou que “não encontra ambiente para prosseguir na mesa de conciliação”. “Não há garantias de proteção suficiente, pressupostos sólidos de não retrocessos e tampouco, garantia de um acordo que resguarde a autonomia da vontade dos povos indígenas”. Após a leitura do documento, os representantes da Apib e demais indígenas presentes no local se retiraram.
Em documento protocolado nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 87, em que os partidos Republicanos, PP e PL pedem a confirmação da legalidade da lei do Marco Temporal, a Apib afirmou que “os moldes propostos para o processo de conciliação da comissão não podem ser aceitos” e externou que não continuará na comissão. A manifestação traz ainda, em anexo, um resumo dos argumentos e pedidos expostos anteriormente, que não foram acatados.
Nesse documento, a Apib lembrou ainda que a tramitação da PEC 48/2023, que tenta inserir o Marco Temporal na Constituição, foi usada como “ameaça” na reunião anterior. “Conciliar sob ameaça não é conciliação, é chantagem”, frisou o comunicado, assinado pelo corpo jurídico da organização. “Trata-se de conciliação compulsória, na medida em que não há garantia da voluntariedade da conciliação, já que ela está imposta aos povos indígenas, independentemente de sua vontade”, resumiu o documento.
Mesmo sem a representação oficial dos maiores interessados no assunto, o juiz auxiliar Diego Viegas Veras informou a continuidade dos trabalhos, sem suspensão temporária nem definitiva, por determinação do ministro-relator, Gilmar Mendes. As próximas reuniões estão marcadas para os dias 9 e 23 de setembro, e o encerramento da comissão está previsto para dezembro.
“Os povos indígenas pediram condições mínimas, o respeito à lei, para estar na conciliação. A resposta foi não. Mesmo com a saída da Apib, a sessão continuou: sem legitimidade, sem respeito à lei, à Constituição e aos tratados. E a lei, claramente inconstitucional, em vigor”, protestou Eloisa Machado, advogada da Apib, por meio de postagem na rede social X (antigo Twitter).
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