O Fundo Verde do Clima (GCF) aprovou nesta segunda-feira (2) no Cairo um pacote de apoio de US$ 500 milhões a países em desenvolvimento que comprovarem reduções de desmatamento até 2022. O Brasil está de olho no dinheiro e acha que pode receber até US$ 150 milhões por ter reduzido a devastação na Amazônia e no cerrado entre 2014 e 2018, em relação a um valor de referência.
O pacote do GCF, principal instrumento de financiamento climático existente hoje, pagará US$ 5 por tonelada de carbono florestal reduzido. Ele é uma boa notícia para países com grandes áreas florestais e grande potencial de cortar emissões de carbono por desmatamento. Ele destina 5% do valor total já arrecadado pelo fundo (US$ 10 bilhões, um décimo do que os países ricos se comprometeram a aportar por ano a partir de 2020) às chamadas ações de REDD+, sigla criada na novilíngua da diplomacia climática para “redução de emissões por desmatamento e degradação florestal” (o sinal de + inclui o papel da conservação, o manejo sustentável e o aumento de estoques de carbono).
A decisão desta segunda-feira consagra a abordagem adotada no Fundo Amazônia e defendida pelo governo brasileiro de que os pagamentos por REDD+ devem ser voluntários e mediante resultado. Alguns países tropicais, várias ONGs e parte da comunidade científica defendem que o desmatamento ao menos em parte possa integrar um mercado de carbono, no qual o desmatamento reduzido ou evitado gere “créditos” transacionáveis num mercado internacional.
Ela também ajuda, ao menos em tese, a aplacar as reclamações dos governadores dos Estados amazônicos, que criticam o monopólio do Fundo Amazônia (portanto, do governo federal) sobre os recursos para redução do desmatamento. Pelas regras aprovadas pelo GCF, os Estados poderão submeter diretamente projetos ao fundo, desde que seguindo as regras da Comissão Nacional de REDD (Conaredd) e desde que o Brasil esteja credenciado para receber o dinheiro.
Mas será que está? Atualmente existem 54 instituições autorizadas a operar os recursos do GCF. Nenhuma delas é brasileira. Algumas estão em processo, como o BNDES, a Caixa Econômica Federal e o Funbio, mas ainda não receberam o sinal verde. “Felizmente a situação não impede o país de apresentar seus projetos e receber o benefício, mas o obriga a se associar a algum banco internacional de desenvolvimento, o que reduz o montante de repasse e pode criar dificuldades para levar os recursos até onde ele de fato é necessário”, diz o engenheiro florestal Mariano Cenamo, secretário-executivo adjunto do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (Idesam). De acordo com ele, o Brasil já tem capacidade institucional para ter uma instituição representada no GCF, mas questões políticas e burocráticas impedem esse avanço.
O Fundo Verde do Clima, no entanto, chega em um momento em que os investimentos estão escassos para a conservação da floresta. O Fundo Amazônia, por exemplo, que já captou ao longo da última década mais de US$ 1 bilhão e hoje é uma das principais fontes de verbas para projetos ligados à preservação do bioma, está com orçamento apertado para 2018. Isso se deve à alta de 58% no desmatamento no Brasil no ano passado, que levou ao corte de investimento de cerca de R$ 200 milhões pela Noruega, um dos principais países que sustentam o fundo.
Os recursos do governo federal também diminuíram. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) tem de lidar com um corte orçamentário de 43% neste ano (51% se contabilizadas as emendas parlamentares). Em vez de contar com os R$ 911 milhões, previsão para custeio e investimentos, os recursos do MMA serão menos da metade, ou R$ 446 milhões, tendo de reduzir, inevitavelmente, os recursos já escassos destinados às políticas de combate ao desmatamento. Para manter a fiscalização do Ibama de pé, o ministro Sarney Filho (Meio Ambiente) precisou recorrer a R$ 56 milhões do Fundo Amazônia.
Mesmo com a inversão atual da tendência de redução do desmatamento, o Brasil deixou de emitir 6 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa entre 2006 e 2016. De acordo com Pedro Soares, gerente do Programa de Mudanças Climáticas e REDD+ do Idesam, esse resultado pode – e deve – ser usado para obtenção de créditos nas mais diversas fontes de financiamento. “Pelo menos até o momento, o que o Fundo Verde tem a oferecer é pouco diante da escala que temos a ofertar”, afirma. “Mas é um começo, e um investimento que não podemos desprezar”, diz.
O REDD+ tem sido uma ferramenta para a Amazônia, mas até agora não para o cerrado, que ano após ano vê suas florestas serem destruídas de forma muito mais veloz. O último dado divulgado (2015) revela que o desmatamento do cerrado já supera em 52% o ritmo de devastação na Amazônia. O bioma ainda não conta com um mecanismo oficial para medir os níveis de emissão da floresta. O país submeteu recentemente à Convenção do Clima o chamado Frel, nível de referência de desmatamento a partir do qual as reduções poderão ser calculadas. Mas o Frel do cerrado ainda não foi aprovado, diz Brenda Brito, pesquisadora do Imazon.
A maior falha como país florestal, segundo Soares, é a falta de uma estratégia de longo prazo para a preservação da floresta, e de disposição do governo de ampliar as fontes de captação de recursos para além do Fundo Amazônia. De acordo com ele, fundos como o GCF devem se tornar comuns com os prazos de cumprimento das metas estabelecidas pelo Acordo de Paris. “É a nossa chance não apenas de conseguirmos ajuda externa para preservarmos nosso patrimônio natural, como o de cumprirmos a nossa meta de emissão e amenizarmos os efeitos das mudanças climáticas”, disse.
Republicado do Observatório do Clima através de parceria de conteúdo. |
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