O mês de julho está prestes a se tornar o mais quente em termos de temperatura média global já registrada. Para se ter uma ideia, talvez fosse necessário voltar milhares de anos no tempo — senão dezenas de milhares — para poder encontrar condições igualmente quentes as que o planeta atingiu este mês. Isto é o que revela análise do cientista climático Karsten Haustein, da Universidade de Leipzig, na Alemanha, publicada nesta quinta-feira (27).
A avaliação, fundamentada em informações de modelos climáticos orientados por dados de estações meteorológicas globais – o que abrange terra e mar, além de informações de radiossonda e satélite –, estima que até o final do mês a temperatura na Terra ficará 0,2ºC mais quente do que julho de 2019, até então o mês mais quente já registrado.
O documento diz que apenas não se pode afirmar, com certeza, que este foi o mês mais quente desde o período Eemiano, entre 130 e 115 mil anos atrás, porque os dados de proxy climático – indicador natural usado para entender o clima do passado, como anéis de árvores ou sedimentos – possuem resolução temporal muito baixa.
“Talvez tenha havido algum mês durante o Holoceno (atual época do período Quaternário, que começou há cerca de 12 mil anos) que foi mais quente, por mais improvável que pareça”. Entretanto, o fato de julho ser o mês mais quente já registrado em termos de temperatura média global só significa uma coisa: “Acabamos de viver o mais quente de qualquer mês nas últimas centenas ou milhares de anos”, descreve a análise.
Com base em dados do Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), observatório financiado pela União Europeia (UE), a Organização Meteorológica Mundial (OMM) da Organização das Nações Unidas (ONU) também afirma que julho será provavelmente o mês mais quente já registrado na Terra.
Publicado nesta quinta, informe da OMM diz que as primeiras três semanas deste mês foi o período de três semanas mais quente já registrado e, com isso, o mês está caminhando para ser não apenas o julho mais quente, mas também o mês mais quente já registrado.
De acordo com os dados do observatório, julho corrente responde por 21 dos 30 dias mais quentes já registrados globalmente. Os valores, baseados na temperatura média diária global próxima à superfície, variam entre 16,76°C e 17,08°C.
“Não precisamos esperar o fim do mês para saber disso. A menos que ocorra uma mini era do gelo nos próximos dias, julho de 2023 irá quebrar recordes em todos os aspectos”, afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres.
Situação pode piorar
A análise do cientista da Universidade de Leipzig lembra que o recorde ocorre após o anúncio do El Ninõ no Pacífico tropical. Entretanto, o documento defende que é a emissão contínua de grandes quantidades de efeito estufa a razão fundamental para os recordes registrados – apesar do fenômeno também contribuir com o calor.
“Como os efeitos do El Niño só se manifestam plenamente na segunda metade do ano, junho – e agora julho – provavelmente será seguido por mais meses de calor recorde até pelo menos o início de 2024”, alerta a avaliação.
O documento explica que mudanças climáticas dramáticas desse porte desencadeiam ondas de calor sem precedentes em águas marinhas e continentais, o que aumenta o risco de extremos de temperatura em todo o mundo. “China, Sul da Europa e América do Norte registraram temperaturas recordes ou próximas ao recorde nas últimas semanas. O mesmo ocorreu no Oceano Atlântico Norte”, diz a análise.
“O Norte e partes do Oeste da Europa tiveram a sorte de ficar sob nuvens durante a maior parte do mês, enquanto a maioria das outras regiões densamente povoadas registrou temperaturas acima da média, exatamente o que se espera de um planeta em rápido aquecimento”, acrescenta.
Este é o momento no qual se vivencia a realidade de décadas de previsões de cientistas que alertam que as temperaturas estão aumentando rapidamente devido às mudanças climáticas, diz o pesquisador da Universidade de Princeton, Zachary Labe.
“Impactos e consequências estão sendo sentidos por comunidades e ecossistemas no mundo todo, especialmente pelos mais vulneráveis. Sem uma redução na emissão de gases de efeito estufa, o calor e os riscos subsequentes infelizmente continuarão a se ampliar”, afirma o cientista.
Leia também
Thelma Krug perde disputa para presidir IPCC
Britânico Jim Skea foi eleito por 90 votos a 69 em segundo turno com a cientista brasileira, que teria sido primeira mulher a presidir órgão se eleita →
Mudanças no clima impõem corrida contra o tempo para espécies da floresta amazônica
Estudo mostra que espécies terão que migrar em velocidade acima da média para acompanhar o deslocamento dos nichos climáticos aos quais estão adaptadas →
El Niño pode ser devastador para a Amazônia, alertam pesquisadores
Águas do Pacífico estão se aquecendo e fenômeno é esperado para o segundo semestre de 2023. Alta no desmatamento nos últimos meses piora cenário →