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MPF propõe ação penal contra gestora do antigo aterro de Gramacho

Gás Verde é acusada de crime ambiental por vazamentos de chorume nos manguezais do entorno do empreendimento, localizado na Baía de Guabanara. Denúncia de pescadores motivou a ação

Elizabeth Oliveira ·
13 de junho de 2019 · 6 anos atrás
Área de manguezal próxima de Gramacho. Foto: Elizabeth Oliveira.

O procurador da República, Julio José Araujo Junior, propôs na terça-feira (11/06) à Justiça Federal (Vara de São João de Meriti), uma ação penal com base na Lei 9.605/1998 (Lei dos Crimes Ambientais) contra a empresa Gás Verde, gestora do passivo ambiental do antigo aterro de Gramacho, onde produz biogás resultante do lixo acumulado naquela área durante 34 anos. A ação foi motivada pelas constantes denúncias dos pescadores artesanais de Duque de Caxias, investigadas pelo Ministério Público Federal (MPF) desde 2012, sobre vazamentos de chorume para os manguezais do entorno deste empreendimento. Em reportagem publicada em ((o))eco, eles afirmam que esses impactos estariam causando o desaparecimento de peixes e caranguejos das áreas onde atuam na Baía de Guanabara e inviabilizando a manutenção das atividades pesqueiras.

A concessionária negou as acusações e afirmou que vem cumprindo os requisitos de gestão ambiental da área. No entanto, segundo o Instituto Estadual do Ambiente do Rio de Janeiro (Inea), a sua licença ambiental foi suspensa por não cumprimento de compromissos previstos no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), assinado com o órgão ambiental em 2017.

Tendo alegado que há nos autos evidências de materialidade e fortes indícios de autoria do crime previsto no artigo 54 da Lei dos Crimes Ambientais, o procurador requereu que a empresa seja citada para responder à ação penal proposta e que a pretensão punitiva seja julgada procedente, além de que seja fixado valor mínimo para a reparação dos danos causados (no caso, ao meio ambiente), conforme previsto no artigo 387, do Código de Processo Penal (CPP).

Independentemente de já ter solicitado à Justiça a nulidade do TAC pelo fato de os pescadores artesanais não terem sido consultados previamente no processo de negociação sobre as ações de recuperação do passivo ambiental do antigo aterro, conforme previsto pela Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT 169), da qual o Brasil é signatário, o procurador afirmou que os compromissos assumidos no âmbito desse acordo ainda estão válidos e têm que ser realmente cumpridos pela empresa. Segundo informado pelo Inea, pelo TAC assinado a Gás Verde se comprometeu a investir R$ 9 milhões em melhorias das condições ambientais da área concedida.

Alguns argumentos do MPF sobre o histórico de irregularidades:

      • Em abril de 2013 pescadores denunciaram que tubulações do aterro despejavam chorume diretamente no Rio Sarapuí. Plantas foram usadas para camuflar a irregularidade. Em dezembro do mesmo ano o problema persistia (causado pelo despejo por caminhões, durante as madrugadas).
      • Em novembro de 2015 peritos constataram saídas clandestinas na estação de tratamento de chorume e, também, que o líquido tratado não atendia aos padrões estabelecidos por normas estaduais e federais.
      • Em janeiro de 2016, filmagens e fotografias produzidas por pescadores demonstravam que continuava havendo vazamento de chorume do aterro. Uma perícia decorrente dessa denúncia revelou que ao menos dois pontos de vazamento eram de fácil visualização.

Foi informado na ação proposta que, no âmbito cível, o MPF já havia discutido os problemas do Aterro de Gramacho em Ação Civil Pública de 2012, para garantir que o Inea, a Comlurb e a concessionária expandissem os pontos de coleta tornando possível verificar eventuais vazamentos de chorume. A ação foi julgada procedente pela justiça que determinou a ampliação do processo de monitoramento ambiental do aterro e do seu entorno.

O pescador Gilciney Lopes, presidente da Colônia de Pesca de Duque de Caxias, e o procurador Julio José Araujo Junior, em Gramacho. Foto: Elizabeth Oliveira.

Já no âmbito da investigação criminal, que resultou na mais recente ação proposta por Araujo, “constatou-se efetivamente que a denunciada Gás Verde S.A, sucessora da empresa Novo Gramacho Energia Ambiental S/A, violou condição específica de licença ambiental e causou poluição em níveis tais que resultam ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora, por meio do lançamento de resíduos líquidos, em desacordo com as exigências

estabelecidas em leis ou regulamentos”. No documento, o procurador ainda argumenta que, além disso, a empresa “deixou de adotar medidas de precaução exigidas pela autoridade competente, no caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível”.

Segundo ressaltado pelo procurador, ele não havia sido informado sobre a rescisão do contrato da Gás Verde com a Petrobras, noticiada pelo ((o))eco. Mas diante de possíveis impactos que a perda desse cliente possa causar, ou que já esteja causando ao processo de recuperação ambiental de Gramacho, Araújo adiantou que pretende buscar esclarecimentos com a concessionária.

Em maio do ano passado, em uma vistoria realizada pelo procurador no aterro, a empresa já havia alegado dificuldades decorrentes de uma vazão de biogás abaixo do previsto no período de planejamento da usina, o que estaria inviabilizando a oferta do produto ao mercado. Além disso, foi mencionado na ocasião o longo tempo de retorno financeiro desse tipo de empreendimento. Mas, para Araújo, embora as ações de recuperação desse tipo de passivo sejam realmente dispendiosas, devem ser fixadas nos acordos independentemente dos seus custos.

Araujo informou, ainda, que vai instaurar um novo inquérito civil, em decorrência de uma representação do Movimento Baía Viva, sobre o quadro de degradação ambiental que estaria agravando a situação de empobrecimento dos pescadores de Saracuruna, em Duque de Caxias. As denúncias que começarão a ser apuradas pelo procurador foram relatadas pelo ecologista Sérgio Ricardo de Lima, após reunião realizada recentemente com lideranças locais, pesquisadores de universidades do Rio de Janeiro e ambientalistas preocupados com esse cenário e dispostos a buscar soluções.

 

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  • Elizabeth Oliveira

    Jornalista e pesquisadora especializada em temas socioambientais, com grande interesse na relação entre sociedade e natureza.

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