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Pesquisadores descobrem nova espécie de cobra d’água e alertam para risco de extinção

Recém-descoberta, a cobra d’água Helicops phantasma está restrita à bacia do Tocantins-Araguaia, onde represas inundaram e comprometeram seu ambiente natural

Duda Menegassi ·
19 de janeiro de 2021 · 4 anos atrás

Vistas dorsal, lateral e ventral da cabeça do holótipo de Helicops phantasma, nova espécie de cobra d’água. Imagem retirada do artigo “Long known, brand new, and possibly threatened: a new species of watersnake of the genus Helicops Wagler, 1828 (Serpentes; Xenodontinae) from the Tocantins- Araguaia River Basin, Brazil”/Reprodução

A ciência acaba de descobrir a existência de uma nova espécie de cobra d’água, mas pode ser tarde demais. O alerta vermelho de risco de extinção veio cedo para a recém-descrita Helicops phantasma porque a maior parte do seu habitat conhecido, na bacia do Tocantins-Araguaia, está hoje alagada pela represa construída por duas usinas hidrelétricas – Luís Eduardo Magalhães e de Estreito. As coletas da espécie foram feitas antes da construção das usinas, quando já havia a suspeita dos pesquisadores de que poderia se tratar de uma espécie diferente. Até então, a phantasma era associada a Helicops leopardinus, uma cobra d’água mais comum, que ocorre no Brasil inteiro.

A descrição da nova espécie, Helicops phantasma, foi publicada em um artigo na revista científica Zootaxa no início de janeiro. A pesquisa é assinada por cientistas do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e da Universidade de São Paulo (USP).

O batismo científico dado à nova cobra d’água – phantasma – não é à toa. A inundação provocada pela represa das usinas hidrelétricas atingiu a maior parte dos habitats onde os indivíduos desta espécie foram encontrados, antes do alagamento. “Ou seja, é bastante provável que a espécie esteja altamente ameaçada de extinção; portanto, talvez tenhamos uma espécie que dificilmente veremos”, alerta Pedro Nunes, professor da UFPE.

Os primeiros indivíduos da espécie, e a maioria deles, foram coletados durante os trabalhos de resgate de fauna que antecederam a construção da Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, no rio Tocantins, no início dos anos 2000. “Na época, apesar de muitos pesquisadores concordarem que os indivíduos eram diferentes do que já conhecíamos para as cobras d’água brasileiras, ainda não existiam evidências suficientes para a atribuição de um novo nome”, explica Nunes.

Sua coloração similar a da Helicops leopardinus, uma cobra d’água comum e amplamente distribuída no Brasil, levava alguns a apontarem que poderiam se tratar da mesma espécie. Dois fatos identificados pelos pesquisadores desmontaram essa teoria: a ausência das manchas típicas de leopardinus na nova espécie, onde são substituídas por bandas transversais; e a presença de um órgão sexual masculino (hemipênis) único no gênero.

Para chegar na sua distinção definitiva de outras cobras do gênero Helicops, os cientistas fizeram a análise biomolecular de um grande número de espécies, a partir dessas amostras preservadas capturadas anos atrás, e identificaram características que comprovaram que a phantasma é de fato uma espécie diferente.

 

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  • Duda Menegassi

    Jornalista ambiental especializada em unidades de conservação, montanhismo e divulgação científica.

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