Em seu discurso na abertura da 80ª Sessão da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, nesta terça-feira (23), o presidente Lula voltou a propor a criação de um conselho na ONU para o clima, nos moldes do Conselho de Segurança. Fala também incluiu temas como justiça climática, metas nacionais e agenda de ação. Para organizações brasileiras, o pronunciamento foi correto, mas nada mais do que isso.
Lula destinou pouco mais de três dos cerca de 18 minutos de seu discurso à crise do clima. Ele cobrou que países apresentem suas metas climáticas nacionais — conhecidas como NDCs —, cujo prazo para apresentação é quarta-feira (24), falou que a COP 30 será a “COP da verdade”, ressaltou os avanços do Brasil na contenção do desmatamento e cobrou que países desenvolvidos assumam a maior parcela da conta do enfrentamento da crise climática.
Segundo ele, no entanto, o combate às mudanças do clima precisam ser trazidos ao “coração da ONU”.
“O mundo deve muito ao regime criado pela Convenção do Clima. Mas é necessário trazê-lo ao combate à mudança do clima para o coração da ONU, para que ela tenha a atenção que merece. Um Conselho vinculado à Assembleia Geral, uma legitimidade para monitorar compromissos, dará coerência à ação climática. Trata-se de um passo fundamental na direção de uma reforma mais abrangente da organização”, propôs Lula.
A ideia da criação de um Conselho de Mudanças Climáticas na ONU não é nova. O Brasil apresentou a proposta há alguns meses, mas não chegou a desenvolver, pois recebeu críticas de que isso aumentaria a confusão em torno da estratégia brasileira na condução da COP 30.
Segundo análise do Observatório do Clima, a criação do conselho seria uma forma de destravar decisões cruciais —como o fim da exploração de combustíveis fósseis — que estão emperradas há anos no âmbito das negociações internacionais.
“Embora haja zero clareza sobre como o tal conselho poderia funcionar, a ideia do governo brasileiro é levar debates políticos difíceis, como a transição para longe dos combustíveis fósseis, para decisões por voto, contornando a regra do consenso que impede a UNFCCC (a Convenção do Clima da ONU) de entregar uma implementação adequada do Acordo de Paris”, disse a rede, em nota.
O petróleo e as contradições estratégicas
Para o OC, a fala de Lula foi apenas “correta”, mas previsível, já que o líder brasileiro tinha na pauta muitas outras questões, como a defesa da soberania nacional e o tarifaço americano, regulação das plataformas digitais, conflitos armados e crise no multilateralismo.
“Quem estava esperando um discurso do grande líder climático do Sul Global que arrancou aplausos do mundo em 2022 na COP 27, no Egito, pode ter se frustrado: a fala de Lula não foi a de um anfitrião de uma conferência do clima decisiva para garantir um futuro seguro para a humanidade”, avaliou o OC.
Já a 350.org destacou a ausência de menção ao fim da exploração dos combustíveis fósseis e lembrou que o Brasil planeja se tornar o quarto maior produtor de petróleo do mundo, sendo o país um dos maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta.
“Não há redução no desmatamento que irá superar as emissões de carbono do petróleo e do gás, e não se pode reivindicar liderança climática enquanto se expande a destruição da Amazônia. Para começar a falar em transição energética justa, o Brasil precisa parar de apostar nos fósseis e apresentar um Plano Nacional de Transição Energética (PLANTE) com metas concretas e que coloque as comunidades indígenas e tradicionais e seus territórios no seu centro. Sem essa mudança, a credibilidade do governo será sempre questionada”, disse Ilan Zugman, diretor da 350.org na América Latina.
Assista ao pronunciamento de Lula na abertura da 80ª Sessão da Assembleia Geral da ONU:
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