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Temer revoga decreto, mas mantém extinção da Reserva de Cobre

Após repercussão, governo decide editar novo texto para esclarecer que não haverá exploração de mineração em unidades de conservação ambiental e terras indígenas

Sabrina Rodrigues ·
28 de agosto de 2017 · 7 anos atrás
Ministros do Meio Ambiente, Sarney Filho, e de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, em coletiva sobre a extinção da Renca. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil.
Ministros do Meio Ambiente, Sarney Filho, e de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, em coletiva sobre a extinção da Renca. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil.

O governo convocou a imprensa nesta segunda-feira (28) para amenizar a repercussão negativa sobre a liberação de mineração numa grande área na Amazônia que por 33 anos esteve “protegida” da exploração. A Reserva Nacional de Cobre e seus Associados (Renca), entre o Pará e o Amapá, foi extinta na semana passada através do Decreto nº 9.142/2017. O governo anunciou a revogação do atual decreto e a edição de um novo “para clarificar a situação”.

Num primeiro momento, a extinção da Renca foi confundida com a revogação de áreas protegidas que estão situadas no local. A confusão é culpa do nome “reserva”. O fato de sete unidades de conservação, incluindo o maior Parque Nacional em floresta tropical do mundo, as montanhas do Tumucumaque, e duas Terras Indígenas estarem sobrepostas à Renca acendeu o alerta vermelho dos ambientalistas e tomou conta das redes sociais.

O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, afirmou que o novo decreto deixará as regras para exploração na região mais claras. Segundo Fernando Coelho Filho, o novo decreto colocará ponto a ponto como deverá ser a exploração, “preservando as questões ambientais e indígenas”.

O novo texto diz que não poderá haver atividades de exploração de mineração em unidades de conservação ambiental e terras indígenas. O decreto anterior também deixava claro que a extinção da reserva de cobre não afastaria “a aplicação de legislação específica sobre proteção da vegetação nativa, unidades de conservação da natureza, terras indígenas e áreas em faixa de fronteira”. De fato, a atual legislação protege essas áreas, mas o Congresso está trabalhando na mudança do licenciamento ambiental e o texto discutido retira do ICMBio e da Funai o poder que têm hoje de vetar um empreendimento caso este afete uma unidade de conservação ou terra indígena. É isso que tira o sono dos ambientalistas.

“Clarificar” o decreto anterior

Em entrevista, no Palácio do Planalto, o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, afirmou o decreto nº 9.142/2017  trouxe “muita confusão” e que conversou com o presidente Michel Temer e com o ministro de Minas e Energia sobre a necessidade de “clarificar” o decreto anterior. “A interpretação que se deu é que a Amazônia estava liberada para desmatamento. Equívoco. Jamais nenhum de nós participaria de um absurdo como esse”, afirmou Sarney Filho.

Repercussão negativa

Assim que a publicação do decreto nº 9.142/2017 foi divulgada, a repercussão e as críticas à medida foram imediatas. Ambientalistas, artistas e políticos se posicionaram contrários ao decreto, entendendo que a decisão libera a mineração, uma atividade altamente impactante, numa das áreas mais preservadas da Amazônia.

O senador Randolfe Rodrigues chegou a apresentar um decreto legislativo no Senado, sustando o decreto publicado, ameaçando também recorrer à Justiça Federal contra a extinção da Reserva Nacional de Cobre.

A Renca possui área total de 4,7 milhões de hectares, ou seja,47 mil quilômetros quadrados, um pouco maior que o estado do Espírito Santo. A região é rica em grandes reservas de ouro, minério de ferro, níquel, manganês e tântalo.

Decreto atinge o Parque Nacional Montanhas de Tumucumaque. Foto: Charly Sanches/Wikiparques.
Decreto atinge o Parque Nacional Montanhas de Tumucumaque. Foto: Charly Sanches/Wikiparques.

Veja, na íntegra, o novo decreto que ainda será publicado:

Revoga o Decreto nº 9.142, de 22 de agosto de 2017, que extinguiu a Reserva Nacional do Cobre e Seus Associados – Renca e extingue a Reserva Nacional do Cobre e Seus Associados – Renca para regulamentar a exploração mineral apenas na área onde não haja sobreposição com unidades de conservação, terras indígenas e faixa de fronteira.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e Considerando a queda do desmatamento na Amazônia, atestado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia;
Considerando a necessidade de melhor explicar o que é a Reserva Nacional de Cobre e seus Associados – Renca, localizada nos Estados do Pará e do Amapá, constituída pelo Decreto nº 89.404, de 24 de fevereiro de 1984, e o porquê de sua extinção;
Considerando a necessidade de melhor regulamentar e disciplinar a exploração mineral na área da extinta Renca;
Considerando a necessidade de fazer cessar a exploração mineral ilegal na área da extinta Renca;
Considerando a sobreposição parcial da área da extinta Renca com o Parque Nacional das Montanhas do Tumucumaque, com a Estação Ecológica do Jari e com a Reserva Extrativista do Rio Cajari, que constituem unidades de conservação da natureza federais, nas quais é proibida a exploração mineral;
Considerando a sobreposição parcial da área da extinta Renca com a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru, com a Floresta Estadual do Paru e com a Reserva Biológica Maicuru, que constituem unidades de conservação da natureza estaduais; e
Considerando a sobreposição parcial da área da extinta Renca com as terras indígenas Rio Paru D’Este, localizada no Estado do Pará, e Waiãpi, localizada no Estado do Amapá, e a inexistência de regulamentação do art. 231 da Constituição;
DECRETA:
Art. 1º Fica revogado o Decreto nº 9.142, de 22 de agosto de 2017.
Art. 2º Fica extinta a Reserva Nacional de Cobre e Seus Associados, reserva mineral constituída pelo Decreto nº 89.404, de 24 de fevereiro de 1984, localizada nos Estados do Pará e do Amapá.
Art. 3º Nas áreas da extinta Renca onde haja sobreposição parcial com unidades de conservação da natureza ou com terras indígenas demarcadas fica proibido, exceto se previsto no plano de manejo, o deferimento de:

I – autorização de pesquisa mineral;
II – concessão de lavra;
III – permissão de lavra garimpeira;
IV – licenciamento; e
V – qualquer outro tipo de direito de exploração minerária.
Art. 4º A autoridade competente para a análise dos títulos de direto minerário relativos à pesquisa ou à lavra em área da extinta Renca sobreposta a unidades de conservação da natureza federais ou a terras indígenas demarcadas iniciará os processos administrativos para o cancelamento dos títulos concedidos e indeferirá os requerimentos de novos títulos de direito minerário requeridos entre a criação e a extinção da Renca.
Art. 5º Nas áreas da extinta Renca onde não haja sobreposição com unidades de conservação da natureza federais, nas quais é proibida a exploração mineral, ou com terras indígenas demarcadas, a exploração mineral atenderá ao interesse público preponderante.
§ 1º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se atendido o interesse público preponderante quando houver:
I – a correta destinação e o uso sustentável da área;
II – o dimensionamento do impacto ambiental da exploração mineral;
III – o emprego de tecnologia capaz de reduzir o impacto ambiental; e
IV – a capacidade socioeconômica do explorador de reparar possíveis danos ao meio ambiente.
§ 2º A concessão de títulos de direito minerário nas áreas a que se refere o caput será precedida de habilitação técnica perante os órgãos e as entidades competentes.
§ 3º O início da explotação dos recursos minerais estará condicionado à aprovação pelos órgãos e pelas entidades competentes dos seguintes planos, observado o disposto em legislação específica:
I – aproveitamento econômico sustentável;
II – controle ambiental;
III – recuperação de área degradada, quando necessário; e
IV – contenção de possíveis danos.
Art. 6º Fica proibida a concessão de títulos de direito minerário a pessoa que comprovadamente tenha participado de exploração ilegal na área da extinta Renca.

§ 1º Nas solicitações de título de direito minerário apresentados por pessoas jurídicas, o solicitante deverá apresentar comprovação de que as pessoas naturais que compõem a sociedade, direta ou indiretamente, não estão impedidas de contratar com a administração pública e de que não tenham participado de exploração ilegal na área da extinta Renca.
§ 2º A proibição estabelecida no caput se aplica aos sócios, aos controladores dos sócios e às pessoas naturais que compõem, direta ou indiretamente, as empresas do mesmo grupo econômico da pessoa jurídica solicitante.
Art. 7º Caberá à Agência Nacional de Mineração, nas áreas da extinta Renca, a autorização para transferência do título de direito minerário, que somente será autorizada após decorrido o prazo de dois anos, contado da data da expedição do título, para as pessoas naturais ou jurídicas que comprovarem deter as mesmas condições técnicas e jurídicas do detentor original.
Art. 8º Nas áreas da extinta Renca onde haja sobreposição parcial com unidades de conservação da natureza federais e estaduais ou com terras indígenas demarcadas, ficam mantidos os requisitos e as restrições previstos na legislação relativa à exploração mineral em unidades de conservação da natureza, terras indígenas e faixas de fronteira.
Art. 9º Fica criado o Comitê de Acompanhamento das Áreas Ambientais da Extinta Renca, no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, que será composto por um representante, titular e suplente, dos seguintes órgãos e entidades:
I – Casa Civil da Presidência da República, que o presidirá;
II – Ministério de Minas e Energia;
III – Ministério do Meio Ambiente;
IV – Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;
V – Ministério da Justiça e Segurança Pública, escolhido dentre os servidores da Fundação Nacional do Índio – Funai; e
VI – Agência Nacional de Mineração.
§ 1º Serão convidados a participar do Comitê de Acompanhamento das Áreas Ambientais da Extinta Renca:

I – um representante do Poder Executivo do Estado do Amapá; e
II – um representante do Poder Executivo do Estado do Pará.
§ 2º O Comitê de Acompanhamento das Áreas Ambientais da Extinta Renca terá caráter consultivo e será ouvido pela Agência Nacional de Mineração antes da outorga de títulos de direito minerário relativos à área da extinta Renca.
§ 3º Os representantes dos órgãos referidos nos incisos I a IV do caput serão indicados pelos respectivos Ministros de Estado e designados em ato do Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República.
§ 4º Os representantes referidos nos incisos V e VI do caput serão indicados pelos dirigentes máximos das respectivas entidades e designados em ato do Ministro de Estado Chefe Casa Civil da Presidência da República.
§ 5º A participação no Comitê de Acompanhamento das Áreas Ambientais da Extinta Renca será considerada prestação de serviço público relevante, não remunerada.
Art. 10. Ficam revogados:
I – o Decreto nº 89.404, de 24 de fevereiro de 1984; e
II – Decreto nº 92.107, de 10 de dezembro de 1985.
Art. 11. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

 

 

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  • Sabrina Rodrigues

    Repórter especializada na cobertura diária de política ambiental. Escreveu para o site ((o)) eco de 2015 a 2020.

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Comentários 1

  1. subCelebridades diz:

    "Não entendi de novo…dá pra vir com desenhos e figurinhas da próxima vez??"