O procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou nesta quinta-feira (7) que “é preciso ter certas cautelas” na participação de organizações não-governamentais em colegiados da administração pública federal, em especial aqueles ligados ao meio ambiente.
“[…] é importante registrar que temos que ter certas cautelas, não no particular dos amici curiae que vêm a essa casa representando ONGs ambientalistas, mas não é despiciendo [desprezível] lembrar que há cinco anos um levantamento feito pela imprensa e por órgãos oficiais mostrou que havia 3.300 ongs conhecidas, 3 mil delas na Amazônia”, disse Aras.
A declaração foi dada durante o debate de uma das ações do “Pacote Verde” em pauta no Supremo Tribunal Federal (STF) desde a última semana. O “pacote” é formado por processos relacionados ao meio ambiente e dizem respeito a atos e omissões do Governo Federal que levaram ao desmonte das leis ambientais brasileiras, à desproteção do meio ambiente como um todo e, em especial, da Amazônia. O julgamento é considerado histórico para o Direito ambiental do Brasil e para a litigância climática internacional.
A ação em debate nesta quinta – a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 651 – pede que seja declarado inconstitucional o Decreto Federal nº 10.224/2020, que regulamenta o Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) e que excluiu a sociedade civil do conselho deliberativo do Fundo.
Ao defender a constitucionalidade do decreto, Augusto Aras questionou os interesses que as organizações não-governamentais teriam na Amazônia.
“Este fato [número elevado de ONGs] nos impõe uma certa cautela para que os interesses nacionais, para que a soberania nacional, a soberania popular seja uma democracia substantiva que tanto desejamos preservada, garantida e defendida por toda a sociedade e pelo Estado através de suas instituições”, completou o procurador-geral da República.
Durante o julgamento, a ministra Cármen Lúcia, relatora da ação, defendeu que a eliminação da presença em número suficiente de representantes da sociedade civil na composição de colegiados ambientais enfraquece os órgãos de controle e contraria os princípios constitucionais da vedação ao retrocesso e da igualdade.
Segundo ela, a exclusão também confere ao Poder Executivo o controle exclusivo de decisões e neutraliza o caráter plural, crítico e diversificado que deve ser inerente à atuação dos órgãos colegiados federais.
Até o momento, foram quatro votos no sentido de que a mudança afronta o princípio da vedação do retrocesso institucional em matéria ambiental e da participação da sociedade civil na formulação de políticas públicas ambientais, e um pela manutenção do decreto.
Além do voto favorável da relatora, também julgaram procedente a ADPF 651 os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes e André Mendonça. O ministro Nunes Marques abriu a divergência quanto ao mérito e votou por sua improcedência. Na sua avaliação, não há obrigatoriedade constitucional ou legal da participação popular no conselho do FNMA.
Aditamento
Além do mérito da ADPF 651, os ministros também estão julgando o pedido de inclusão de outros atos do Governo Federal que interferem na participação da sociedade civil em conselhos ambientais.
A ADPF 651, proposta pelo partido Rede Sustentabilidade, inicialmente era contrária apenas ao Decreto 10.224/2020. Posteriormente, o partido aditou o pedido para questionar, também, o Decreto 10.10239/2020, que afastou a participação de governadores no Conselho Nacional da Amazônia Legal, e o Decreto 10.223/2020, que extinguiu o Comitê Orientador do Fundo Amazônia.
Cármen Lúcia votou a favor do aditamento, voto que foi seguido por Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes. O ministro André Mendonça, apesar de ter votado a favor da inconstitucionalidade do decreto 10.224/2020, foi contra o aditamento.
O julgamento do mérito da ação e do pedido de aditamento serão retomados na próxima semana.
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Aras, mais uma caneta comprada.