O Ibama liberou na quinta-feira, 4 de agosto, a caça ao javali uruguaio no Rio Grande do Sul, que estava suspensa desde junho pela Justiça. A medida desagrada defensores de animais, mas é uma emergência para se livrar do bicho que destrói lavouras. Ele invadiu o Sul vindo do país vizinho há 13 anos e já faz estragos até em São Paulo.
A besta pesa 250 quilos. É esperta, porque se esconde durante o dia. É feroz, porque reage quando caçada. Devora safras de milho para saciar seu apetite enorme. Também é voraz consumidora de ovos de pássaros e pinhões.
O comilão disputa com a fauna silvestre todo tipo de alimento, e costuma ganhar. O pior é que é um romântico: acasala com porcos domésticos e os arrasta para se reproduzir no mato, fazendo aumentar a população de forma incontrolável.
O Rio Grande é o único estado onde a caça é permitida. No ano passado, 800 javalis foram mortos por caçadores legalizados, além de um número incalculável por agricultores que tratavam de proteger suas lavouras.
Os xiitas do ambientalismo querem que eles vivam felizes soltos nas planícies gaúchas. Mas os especialistas alertam que não pode ser assim. Se não forem contidos, como se tenta fazer no Rio Grande, vão se multiplicar até tomar o Brasil, com prejuízos incalculáveis. Em São Paulo, onde a Constituição paulista veta qualquer tipo de caça, o Ministério Público Estadual está pedindo socorro ao Ibama para se livrar deles.
Papo de caçador? Quem fala é o insuspeito Scherezino Barbosa Scherer, técnico do Centro Nacional de Pesquisa para a Conservação de Aves Silvestres (Cemave), órgão do Ibama com sede na Paraíba e representação regional no Rio Grande do Sul: “O javali come ovos de perdizes, tico-ticos, perdigões, come também ratos do mato e outros mamíferos de pequeno porte. E é nocivo para a vegetação”.
Scherer conta que quando as sementes de araucária começam a escassear no final da safra, os javalis conseguem descobrir as que foram enterradas por gralhas. Essas aves muitas vezes acabam esquecendo o local onde as deixaram, favorecendo assim a germinação de novas árvores. Mas aí o javali glutão aparece e atrapalha o processo.
Javali é bicho e a natureza deveria contê-lo? Não é bem assim, porque a espécie conhecida como “uruguaio” é a Sus scrofa, na verdade originária da Europa. Foi trazido para a Argentina para caça esportiva, na primeira década do século passado. Dali foi para o Uruguai. E de lá fugiu ao controle, chegando no Rio Grande do Sul por volta de 1992. Por não enfrentar predadores, multiplicou-se. Levantamento feito em 1994 já mostrava uma população de 2 mil animais somente no município de Herval.
Os javalis andam em bandos. Ao passar pelas estâncias, arrastam porcos domésticos. Produzem novas ninhadas, geralmente com cinco filhotes. Já foram vistas varas com 30 indivíduos. As fêmeas iniciam o período reprodutivo com oito a nove meses de idade e têm até três partos por ano.
A carne de javali, quando não passa por cruzamentos genéticos, tem baixo teor de colesterol. Por isso, chegou a despertar interesse econômico e o surgimento de criadouros. Mas quando o Ibama impôs normas para controlar a produção, muitos criadores clandestinos, principalmente de Caxias do Sul e Viamão, preferiram soltar os animais que tinham em cativeiro, aumentando a população selvagem.
“Toda hora recebo recados de agricultores que me pedem para capturar javalis, por causa da destruição de lavouras aqui na serra”, conta Cassiano Welter Bocchese, um dos caçadores mais experientes de Caxias, na Serra Gaúcha – foi ele que organizou um dossiê sobre o javali-praga, encaminhado ao Ibama.
A perseguição ao Sus scrofa exige perícia e coragem. O momento ideal para a caçada são as noites de lua cheia. Os campos iluminados facilitam a identificação dos rastros do animal. Eles se escondem nas matas e se defendem com violência extraordinária: “O javali enxerga longe, ouve bem, conhece o território e a escuridão das matas”, alerta Bocchese.
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