O café vendido por empresas do porte da Nestlé, Krafts Foods e Lavazza é feito de grãos plantados ilegalmente dentro de um dos parques nacionais mais importantes da Indonésia, o Sumatra’s Bukit Barisan Selatan National Park. A denúncia, feita pelo WWF e consolidada em um relatório de 60 páginas, revela como a indústria do café não se preocupa com a origem do produto.
O Sumatra’s Bukit Barisan Selatan National Park fica no Sudoeste da ilha de Sumatra, a sexta maior do planeta e detentora das florestas tropicais com o maior índice de biodiversidade. Lá estão os últimos exemplares de rinoceronte-de-sumatra, tigre-de-sumatra e elefante-de-sumatra. Além de outras noventa espécies de mamíferos e 322 de pássaros. Esses animais estão confinados aos 324 mil hectares do parque, que perdeu 28% por cento de suas florestas para atividades agrícolas desde 1960, quando o governo incentivou a ocupação da região. De lá para cá, uma média de 20 mil toneladas de café passaram a ser produzidas anualmente dentro da unidade de conservação por cerca de 15 mil famílias.
O grão cultivado ilegalmente é do tipo robusta – menos valorizado no mercado do que o outro conhecido como arabica, mas contém mais cafeína, maior resistência a pragas e cresce mais rápido. Ele é utilizado principalmente para a produção de café expresso, de marcas mais populares e para completar a receita de cafés compostos de grãos mais finos. Por se adaptar facilmente a áreas quentes e de clima úmido, este tipo de grão é cultivado em áreas desmatadas no Sudoeste da Ásia. Hoje, depois do Vietnã, a Indonésia é o segundo maior produtor mundial de café tipo robusta. E a região de Lampung, onde fica o parque, é responsável por 50 a 70% de toda a exportação do país.
Para mapear o destino do café plantado dentro do parque, integrantes do WWF usaram imagens de satélite para localizar os plantios dentro dos limites da unidade de conservação e foram a campo entre outubro de 2003 e junho de 2004 para descobrir para onde as sacas de grãos eram enviadas. Descobriram que os agricultores ilegais vendem o produto para atravessadores dos próprios vilarejos ou comunidades vizinhas que misturam o produto com grãos plantados legalmente e revendem para comerciantes maiores, responsáveis por negociar a mercadoria com exportadores sediados em Bandar Lampung, capital da província. A equipe do WWF conseguiu identificar os principais exportadores, clientes e destinos do café plantado no parque. E acabou batendo na porta das maiores companhias de café do mundo, detentoras das marcas mais famosas.
A Nestlé Indonésia, por exemplo, exportou 2.387 toneladas de café instantâneo adquiridos na província de Lampung em 2003. No mesmo ano, o maior comprador de café robusta da região foi a americana Krafts Foods. Entre 2003 e 2005, o café produzido dentro do parque foi comercializado para 50 países, sendo que mais da metade da produção foi exportada para Alemanha, Estados Unidos, Japão e Itália e foi dissolvida nos balcões de lojas mundialmente conhecidas como a Starbucks.
Segundo a Associação de Exportadores de Café da Indonésia (Association of Indonesian Coffee Exporters – AICE), essas empresas nunca questionaram a origem do café importado. A única preocupação é a qualidade do grão. Pelo relatório do WWF, o grão colhido no parque nada difere dos demais plantados na mesma região. E o plantio se tornou uma ameaça séria à sobrevivência dos grandes mamíferos ali teoricamente protegidos. Se o ritmo de destruição não for reduzido, a estimativa é que em três anos sobrará apenas 20% da floresta hoje ocupada por rinocerontes e tigres endêmicos da Sumatra. Atualmente, 2,8 milhões de hectares de florestas tropicais são desmatados na Indonésia por ano. O WWF reconhece que muitas das companhias de café poderiam desconhecer a origem ilegal do produto, mas agora estão avisadas. E têm o poder de impor mudanças.
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