Reportagens

Ajuda de cima

Fiscalização de florestas que sofrerão exploração seletiva concedida pelo Serviço Florestal Brasileiro terá reforço de imagens de satélite em sistema operado pelo Inpe.

Eric Macedo ·
12 de abril de 2007 · 19 anos atrás

Volta e meia algum filme de espionagem em Hollywood mostra um mocinho, ou bandido, sendo perseguido por alguém que vigia cada passo seu por satélite, ao vivo. A tecnologia do sensoriamento remoto não chegou ainda a esse ponto. Mas as imagens geradas do espaço dão uma bela ajuda no monitoramento de áreas naturais importantes. No Brasil, em especial, dão uma mão à vigilância da Amazônia. Um exemplo é a nova ferramenta que será usada pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, para vigiar as áreas de floresta que terão a exploração seletiva de madeira permitida: o Detex (Detecção de Exploração Florestal).

Aprovada e regulamentada, a Lei de Gestão de Florestas Públicas ainda gera discussão. São muitas as vozes contrárias, que volta e meia destacam as incertezas quanto ao grau de controle que o governo terá sobre as florestas exploradas pelos madeireiros. Afinal, a derrubada de poucas árvores de determinadas espécies no meio da floresta não é tão visível quanto o desmatamento puro e simples. A ajuda de cima, nesse caso, será essencial.

O Detex já funciona, em uma fase inicial, mesmo antes de qualquer projeto de exploração ter sido aprovado pelo SFB. O projeto é o terceiro a fazer parte do programa Amazônia do Inpe, que conta com o Prodes (que faz a quantificação anual do desmatamento na região) e o Deter (que detecta quase em tempo real o desmate, permitindo a atuação em campo de equipes do Ibama).

As imagens do satélite Cbers (lançado pelo Inpe em parceria com a China) vão possibilitar ver se os madeireiros que tiverem um plano de manejo aprovado pelo Serviço Florestal estão se atendo às áreas permitidas e se estão respeitando o tempo necessário de recuperação da floresta. “O sistema só não permite ver a quantidade que está sendo retirada, nem as espécies que estão sendo exploradas”, diz Dalton Valeriano, coordenador do Programa Amazônia. Segundo o diretor do SFB, Luiz Carlos Joels, o monitoramento por satélite não substitui a constatação de campo. “Ele orienta essa ação, apontando as áreas problemáticas”, diz.

Essa fiscalização in loco vai ficar por conta do Ibama e dos órgãos ambientais estaduais. O que está sendo feito agora pelo Inpe é o mapeamento da exploração já existente – sem a regulação do SFB – na região do distrito florestal da BR163. Também é lá que devem aparecer as primeiras concessões, depois que tudo estiver mapeado e ao passo que cada um dos planos de manejo das sete Florestas Nacionais que compõem o mosaico ficarem prontos. “O Ibama está fazendo o zoneamento, com o apoio do SFB”, diz Joels.

Outras tentativas

A idéia do Detex surgiu a cerca de um ano e meio. Veio do chefe do SFB, Tasso Azevedo, antes mesmo que a instituição existisse. “Ele me perguntou se dava para monitorar por satélite. Eu respondi que sim”, conta Dalton. Alguns trabalhos científicos apontavam para essa possibilidade. Apesar de ser difícil ver a exploração numa imagem fiel da floresta, a cena (como são chamadas as imagens de satélite) pode ser manipulada para ressaltar os rastros deixados na área depois da retirada de árvores (foto). O que, na imagem original, fica camuflado e difícil de identificar em uma imagem completamente verde, sobressai a partir de uma combinação especial entre os elementos que compõem a imagem (as folhas verdes, o solo e sombras). “Nós não conseguimos ver o espaço vazio deixado por uma única árvore. O que se vê são os pátios abertos pelos madeireiros, além dos caminhos feitos por eles em meio à floresta”, explica.

Outros métodos para o monitoramento estão sendo testados paralelamente. O Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia) tem uma metodologia própria, baseada nos estudos do diretor do instituto, Carlos Souza, que escreveu uma tese de doutorado sobre o assunto. O sistema deles, entretanto, usa imagens, mais precisas, do satélite norte-americano Landsat – que, no entanto, está com o prazo de validade vencido há tempos e deve bater as botas em breve. O Imazon estuda agora como aplicar a sua metodologia às imagens do Cbers.

Passo a passo

Mais tarde, haverá um cruzamento dos resultados obtidos por ambas as tentativas, para estabelecer o método mais eficiente. Souza diz que esse tipo de monitoramento pode ter precisão de 85% a 95%. “Nós temos muito boa resposta a todo o dano causado ao dorsel [às copas das árvores]. O que é feito embaixo, no sub-bosque, é difícil. Tem coisa que não vai dar para fazer”, diz Souza. “O desafio agora é fazer com que o sistema dependa menos das pessoas. A abordagem do Imazon é computacional, enquanto o sistema do Inpe depende muito de intérpretes”, completa.

Além do Inpe e do Imazon, participam das pesquisas o Inpa (Instituto de Pesquisas da Amazônia), o Museu Goeldi e o Sipam (Sistema de Proteção da Amazônia). Eles se encontraram em outubro de 2006 para discutir a metodologia a ser usada no sistema. O Ministério do Meio Ambiente liberou 1 milhão de reais para o desenvolvimento da tecnologia. Segundo Dalton, nesse trabalho inicial talvez sobre espaço (ou melhor, dinheiro), para um mapeamento maior, incluindo outras áreas prioritárias para o Serviço Florestal, como a BR-319 e a região de Carajás. No limite, a idéia é ter informações de toda a Amazônia. “Nós trabalhamos sempre na frente da demanda. Mas é preciso dar um passo de cada vez”, diz.

Leia também

Notícias
19 de dezembro de 2025

STF derruba Marco Temporal, mas abre nova disputa sobre o futuro das Terras Indígenas

Análise mostra que, apesar da maioria contra a tese, votos introduzem condicionantes que preocupam povos indígenas e especialistas

Análises
19 de dezembro de 2025

Setor madeireiro do Amazonas cresce à sombra do desmatamento ilegal 

Falhas na fiscalização, ausência de governança e brechas abrem caminho para que madeira de desmate entre na cadeia de produção

Reportagens
19 de dezembro de 2025

Um novo sapinho aquece debates para criação de parque nacional

Nomeado com referência ao presidente Lula, o anfíbio é a 45ª espécie de um gênero exclusivo da Mata Atlântica brasileira

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.