Em reunião no palácio do Itamaraty (DF), o Brasil conclamou hoje os 17 países megadiversos a fecharem uma proposta e ganharem apoiadores a um regime internacional de acesso e repartição dos recursos da biodiversidade. Tudo antes da décima conferência das partes da convenção das Nações Unidas que trata dessa pauta, em outubro, em Nagoya (Japão). Essas nações* detêm sete em cada dez das espécies conhecidas no planeta, mas estão todas em desenvolvimento, são fornecedoras de matérias-primas ao primeiro mundo e carentes em tecnologias de ponta.
A avaliação do governo e de diplomatas brasileiros é de que é preciso superar o fracasso climático de Copenhague e dar destaque à conservação e ao bom uso da biodiversidade, aproveitando o ano internacional dedicado ao assunto. Esse seria o caminho para que, daqui a seis meses, seja aprovado um regime de “pagamento” pelo uso controlado da biodiversidade – o conjunto das espécies vivas no planeta. Sem isso, os países megadiversos não teriam condições de defender seu patrimônio.
Conforme o ministro do Itamaraty Luiz Alberto Figueiredo, um dos principais negociadores brasileiros quando o tema é meio ambiente, o pagamento não deve ser um “pacto comercial”, mas uma ferramenta de proteção ao patrimônio genético dos países envolvidos num futuro acordo. Enquanto isso não se define, por exemplo, grandes laboratórios aproveitam riquezas genéticas de nações megadiversas para produzir medicamentos e outros produtos, os quais exportam às mesmas nações, cobrando royalties e patentes. “Ao concordarem com um regime de acesso e repartição de benefícios, os países estarão efetivamente protegendo a biodiversiade e os conhecimentos tradicionais que dela vêm”, disse.
Um acordo global envolvendo recursos da diversidade biológica também pode frear a biopirataria. Afinal, países como o Brasil veem nas suas imensas fronteiras, e na falta de controle estatal, um caminho livre para o roubo dessas riquezas. “Com um sistema de acesso e repartição em vigor, será possível punir laboratórios e empresas que aproveitarem recursos de algum país sem autorização”, comentou o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente).
Mas fazer o tema de casa também é essencial. Por entraves legais, o Brasil firmou até agora apenas um acordo entre uma empresa e comunidade tradicional envolvendo um recurso genético. “Tínhamos um projeto de lei que passou por consulta pública, mas nunca chegou ao Congresso, porque tinha muitos problemas, era muito burocrático. O Brasil nao tem como defender um regime internacional sem ter aperfeiçoado seu marco interno”, disse Minc. Ele assume que o debate está “morno” no país, mas garante que antes da reunião de Nagoya o governo enviará nova proposta legislativa ao Congresso. O texto já foi assinado pelos ministros de Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia e aguarda andamento na Casa Civil. “O ano de aprovar isso é agora”, disse.
* Brasil, Bolívia, China, Colômbia, Costa Rica, República Democrática do Congo, Equador, Índia, Indonésia, Quênia, Malásia, México, Peru, Filipinas, África do Sul, Madagascar e Venezuela
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