Por Nathalia Clark
Brasília – “O grande fracasso do Brasil em termos de conservação da biodiversidade é não possuir uma economia da floresta”, afirmou Alberto Lourenço, secretário da Subsecretaria de Desenvolvimento Sustentável da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE). A economia da floresta em pé, aliada à conservação da biodiversidade e dos remanescentes florestais foram tema do seminário “Assuntos Estratégicos da Amazônia”, realizado pela SAE nos dias 13 e 14 em Brasília, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e com apoio do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O objetivo do seminário, que reuniu especialistas da academia, entidades da sociedade civil e tomadores de decisão, foi debater meios de inserir a Amazônia no contexto do desenvolvimento nacional e re-analisar o Plano Amazônia Sustentável (PAS), para oferecer subsídios para as políticas públicas a serem implementadas até 2020. Foram realizadas seis mesas de debate, que tratavam de temas como: desenvolvimento industrial na Amazônia; cidades, desenvolvimento agropecuário e recuperação de áreas degradadas; conhecimento sobre a Amazônia; e infraestrutura e acessibilidade.
Para o secretário-executivo do MMA, José Machado, já é hora de rever o Plano: “num ciclo de três anos, devemos pensar métodos mais adequados, re-analisar, acrescentar novas perspectivas, identificar lacunas”. A ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira, e o ministro da SAE, Samuel Pinheiro, defenderam a necessidade de dar caráter mais operacional ao Plano, identificando metas para fazer o planejamento fluir.
A intenção de revisar o Plano gerou certo burburinho no segundo dia do seminário, após polêmica causada pela intenção do governo federal em alterar um plano criado em 2008 pela então ministra de Meio Ambiente, Marina Silva.
A questão tecnológica
Alberto Lourenço crê que os principais desafios para a região são: estruturar o acesso à terra; substituir a pecuária extensiva pela economia da floresta em pé; retomar uma infraestrutura sustentável; ordenamento fundiário; regularização de unidades de conservação (UC); e avanço na área madeireira a fim de conter o desmatamento.
Para isso, ele acredita em incentivos à tecnologia de baixa e média complexidade. “Ouvimos uma revolução em ciência e tecnologia, uma retórica grandiosa, mas sem embasamento. Idolatra-se a tecnologia, hoje, como se fosse um Deus-máquina, enquanto que o principal problema de tecnologia na Amazônia é de adaptação e difusão das tecnologias já existentes, não a invenção de novas”, afirmou.
Lourenço confessou deixar o seminário um tanto melancólico: “não há indícios de uma mudança de modelo, o governo continuará investindo nas mesmas commodities. Um extrativismo molecular, a mais moderna ciência de modificação genética, seria a maior esperança no momento”.
Conhecimento científico + tradicional
Outra das questões significativas identificadas como lacuna nas ações para a região é a importância do conhecimento sobre a Amazônia. Nas apresentações, chegou- se à conclusão de que faz-se necessário o investimento no conhecimento da riqueza da floresta e, para isso, fortalecer instituições de ensino acadêmicas, mas também, e principalmente, valorizar os conhecimentos tradicionais dos povos e sociedades da região. “É impossível incluir a Amazônia nos projetos nacionais sem conhecimento a fundo do que se quer preservar”, comentou José Machado, coordenador da mesa.
De acordo com o professor Gilton Mendes dos Santos, da Universidade Federal do Amazonas, “pensar a Amazônia é, principalmente, pensá-la a partir de seus povos, a partir do ponto de vista de quem tradicionalmente vive lá. É preciso levar a sério as diferentes leituras de mundo e suas práticas de pesca, extrativismo, etc. Preocupa uma visão unidimensional da ciência num movimento obstinado de enquadrar a Amazônia a partir de nossos indicadores. Compreender essa diferença radical é um dos primeiros passos. Compreender e dimensionar as práticas tradicionais amazônicas com as práticas da ciência ocidental é fundamental”.
Conhecer para conservar
Rômulo Mello, presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação de Biodiversidade, apoia a ideia de desenvolvimento de uma política consistente de conhecimento da Amazônia. Segundo ele, praticamente todas as incumbências do ICMBio tangenciam a pesquisa, duas principalmente: o monitoramento das UCs, e as atividades diretas, que dizem respeito ao fomento e execução dos programas de pesquisa, proteção e preservação.
Já para o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Peter Mann, é necessária a criação de um sistema de inventários biológicos. De acordo com ele, há uma proposta de um censo de biodiversidade regional, para monitoramento da fauna e flora, entendendo como se dá a dinâmica quanto à modificação do solo. “Obtivemos sucesso na diminuição das áreas totais desmatadas, mas aumentaram os pequenos desmatamentos. E isso tem que ser levado em consideração, se estamos pensando em uma estratégia de planejamento.
Em consonância, Rômulo Mello defende a utilização das unidades de conservação na condição de laboratório. “Para o desenvolvimento de grandes projetos, os estudos são fundamentais, e o censo é uma grande oportunidade de catalogar esse conhecimento”, completou.
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