Os ataques de tubarões na costa pernambucana se tornaram conhecidos e temidos por banhistas que, muitas vezes, não se arriscam a entrar no mar com medo de se deparar com estes animais. A fama dos tubarões como os grandes vilões foi bastante difundida pelo cinema americano. Desde 1992, foram 59 os casos de ataques a surfistas e banhistas em Pernambuco, destes 24 das vítimas morreram.
O caso mais recente foi da jovem paulista Bruna Gobbi, de 18 anos, que foi atacada por um tubarão na praia da Boa Viagem, na zona sul do Recife. A turista que passava férias na capital pernambucana morreu na última segunda-feira, dia 22 de julho, após ter sido surpreendida por um ataque a uma distância de apenas 20 metros da faixa de areia. Ela teve parte da perna esquerda amputada e não resistiu aos ferimentos.
No mundo, existem mais de 400 espécies de tubarão e o Brasil abriga cerca de 80. Em Pernambuco, as espécies mais frequentes são o tubarão-lixa que é inofensivo, o galha-preta, o tubarão cabeça-chata e o tigre.
Em entrevista a ((o))eco, o presidente do Instituto Oceanário, com sede na Ilha de Itamaracá, falou da importância de se preservar os tubarões para a manutenção do ecossistema marítimo e defendeu as ações de prevenção para evitar fatalidades.
O Instituto Oceanário integra o Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (Cemit), que reúne entidades como a Secretaria de Defesa Social (SDS), a empresa estadual de meio ambiente de Pernambuco, pesquisadores da Universidade Federal Rural (UFRPE) e o Corpo de Bombeiros.
Desde a criação do grupo de trabalho, em 2004, e a implementação de medidas preventivas e educação ambiental, a média de ataques que era de três por ano caiu para 1,5.
Cerca de 80% das vítimas de tubarões são jovens entre 14 e 25 anos. “O grupo de adolescentes foi mais de uma vez abordado, eles estavam numa área de absoluto risco. A menina descumpriu tudo o que foi orientado”, afirmou.
De todas as espécies de tubarão, apenas 12 podem ter algum incidente com o ser humano, afirmou Carvalho. Neste ano, antes da adolescente paulista, um homem havia sido vítima no dia 25 de maio.
Surto de casos
Os ataques de tubarão são históricos no litoral de Pernambuco. Desde o início do século 20 já havia registro de ataques, assim como na década de 50. Mas foi a partir de 1992, quando passaram a ser monitorados os casos, que as autoridades consideram ter havido um “surto” com uma incidência muito maior de ocorrências. Naquele ano ocorreram três ataques, o mesmo em 1993 e, em 1994, foram 10.
Apesar de Pernambuco ter ficado conhecido pelos casos envolvendo tubarão, eles não são exclusividade do estado, ponderou o presidente do Instituto Oceanário. Dos 17 estados brasileiros litorâneos, apenas seis não têm registro de ataques e, três deles, estão no Nordeste – Sergipe, Alagoas e Piauí. “Não é só em Pernambuco que existem ataques de tubarão”, afirmou.
Com uma extensão de 187 km de litoral pernambucano, mais de 90% dos ataques de tubarão ficam concentrados em um trecho de apenas 20 km – da Praia do Pina, em Boa Viagem, até a Praia do Paiva, no sul de Recife.
Devastação ambiental é agravante
Os fatores que podem influenciar os ataques neste trecho de costa correspondem ao impacto ambiental, despejo de esgoto sem tratamento e também a grande circulação de embarcações e navios no Porto de Suape, entre os municípios de Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho. “A região metropolitana da cidade tem um grande impacto antrópico. Jaboatão dos Guararapes tem um aporte de esgoto in natura, poluição, um fator que agrava o risco de ataques”, disse Carvalho.
A área litorânea de estuário ocupada pelo porto de Suape era uma zona de procriação da espécie de tubarão cabeça-chata. “Com o porto, os tubarões não puderam entrar na região estuarina e acredita-se que se deslocaram para a foz do rio Jaboatão (que desemboca nas praias de Recife). Já o tubarão-tigre acompanha as embarcações, eles vêm até o porto de Suape e seguem as correntes marinhas do sul para o norte”, explicou.
Existe ainda um fator de ordem natural, um canal de areia se estende no mar de Suape até a praia do Pina, uma depressão no assoalho oceânico com profundidade de 5 a 7 metros. “É um facilitador de circulação de animais de grande porte e o canal chega bem perto da praia”, comentou Carvalho.
Não é à toa que as ocorrências de ataques envolvem especialmente essas duas espécies. Enquanto o cabeça-chata se adapta à baixa salinidade e se aproxima da região estuarina para procriação, o tubarão-tigre é mais migratório, também se aproxima da costa para procriar e se adapta mais facilmente na água turva em razão da poluição.
Carvalho admite, contudo, não ser fácil identificar qual espécie responsável por cada caso. Dos até hoje 59 registrados em vinte anos, foi possível descobrir a espécie em apenas oito – sete se referiam ao tubarão cabeça-chata e um caso do tubarão-tigre. “É difícil identificar a espécie de tubarão, só quando ele é visualizado ou quando se consegue resgatar um dente. O tubarão ataca em função de uma confusão, ele confunde o ser humano com uma presa de seu habitat. As vezes ele faz uma mordida exploratória e percebe que o ser humano não faz parte da sua dieta alimentar”, afirmou Carvalho.
O presidente do Oceanário disse ainda que as águas turvas são um grande agravante, pois o tubarão não consegue identificar a presa.
Equilíbrio marinho
Apesar do temor que afronta o imaginário de banhistas e surfistas, Carvalho destaca a importância da defesa e conservação dos tubarões para a manutenção e equilíbrio do ecossistema marinho.
“Eles são chamados de lixeira do mar, fazem o papel dos urubus, comem objetos em decomposição, tem um papel fundamental. O cabeça-chata se alimenta de peixes, crustáceos, moluscos do mar e aves marinhas. O tubarão-tigre também se alimenta das mesmas presas, mas ainda de tartarugas marinhas, pois são capazes de quebrar o casco”, argumentou.
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