Em entrevista exclusiva ao ((o))eco, Eduardo Cavaliere explica as suas motivações para candidatar-se ao legislativo estadual do Rio de Janeiro pelo PSD (Partido Social Democrático). O candidato reitera a relação entre políticas ambientais e segurança pública e revela as conexões entre crimes ambientais do Rio de Janeiro e da Amazônia. Cavaliere explica, ainda, seus planos para a mitigação das mudanças climáticas no estado.
Eduardo Cavaliere tinha apenas 26 anos de idade quando assumiu a Secretaria do Meio Ambiente da Cidade do Rio de Janeiro, no início de 2021. Antes, havia estudado Direito e Matemática Aplicada na Fundação Getúlio Vargas (FGV) e complementando seus estudos na área de desenvolvimento, na China. Parte do secretariado jovem promovido pelo prefeito Eduardo Paes, Cavaliere enfrentou a complexidade das políticas ambientais em um contexto urbano singular, onde a exuberância da natureza se choca com o caos social e o avanço do crime organizado.
Em junho de 2022, já afastado para disputar o cargo de deputado estadual pelo PSD, foi convidado pelo governo da Suécia para participar da Estocolmo+50. O evento celebrou os 50 anos da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano que em 1972, pela primeira vez, tornou a natureza uma preocupação global. No ano de abertura da mesa “Gerações Futuras”, o ex-secretário falou sobre sua experiência de defesa do meio ambiente conjugada com o enfrentamento de milícias e narcotraficantes.
Confira a entrevista na íntegra e saiba mais das propostas de Cavaliere para a gestão ambiental no Rio de Janeiro.
((o))eco – Você foi secretário do meio ambiente da cidade do Rio de Janeiro entre janeiro de 2021 e abril de 2022, durante a gestão do prefeito Eduardo Paes. Como foi assumir essa posição?
Eduardo Cavaliere – Existe aí um aspecto geracional, eu tenho 27 anos, sou filho da Eco 92 [Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento realizada na cidade do Rio de Janeiro em 1992]. Mas acredito que o principal desafio para mim foi atuar depois de 30 anos de abandono da secretaria do meio ambiente na cidade. Houve uma relevância política adicional porque foi um governo que além de suceder uma experiência muito ruim a nível local, precisou conviver, no governo federal, com a gestão do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Era um momento em que eu precisava retomar a autoridade ambiental, disputar a narrativa e trazer essa pauta como protagonista das políticas públicas no Rio, entendendo a influência que o município tem para o Brasil. Eu acredito que meu papel foi técnico, de organizar a gestão, apresentar resultado para a população e mostrar o protagonismo ambiental no aspecto político.
Como essa experiência motivou você a se candidatar agora, em 2022, ao cargo de deputado estadual?
Com três meses de gestão, concorri para ser Coordenador Nacional do Fórum de Secretários de Meio Ambiente. Além de eu compreender a importância da cidade do Rio de Janeiro dentro desse debate, eu discordava da abordagem do outro candidato que também tinha chances de vencer. Tive o apoio de secretários de estados de várias regiões do Brasil e venci, apresentando uma agenda que eu considero mais alinhada com a ideia de um meio ambiente popular, porque é a população mais pobre que irá sofrer as principais consequências das mudanças climáticas, por exemplo.Também é essa população a que mais convive com os conflitos e com a violência promovidos pelo crime organizado nos territórios – e isso é algo que acontece não só no Rio mas também em outras regiões, como a Amazônia. Falar sobre meio ambiente tem a ver com oferecer melhor qualidade de vida para as pessoas. Eu sei o quanto isso interessa para a população e a minha candidatura agora em 2022 vem disso.
[…] é a população mais pobre que irá sofrer as principais consequências das mudanças climáticas Eduardo Cavaliere
Você falou sobre a relação entre entre as políticas ambientais e o crime organizado. Como essa relação se estabelece no Rio de Janeiro?
No Estado do Rio de Janeiro essa relação é total. Um grande legado da minha gestão, principalmente do ponto de vista institucional, foi contar com a colaboração de diferentes órgãos para deixar claro que a agenda de meio ambiente também é uma agenda de segurança pública. Quando eu fui representar o Brasil na Estocolmo + 50 , a razão pela qual me convidaram foi exatamente porque o Rio não é a única grande cidade que precisa lidar com uma agenda climática em um ambiente de violência urbana. Mas a cidade é provavelmente a maior referência no mundo desse contexto. Literalmente espremida entre o mar e a montanha, tem um terço de seu território demarcado por Unidades de Conservação. Essas áreas são disputadas por grupos criminosos armados que fazem parte de organizações ilegais, como as que exploram Santa Cruz, Areal ou Seropédica. Existem ainda os loteamentos clandestinos em áreas protegidas. Nós fizemos uma operação e descobrimos 360 lotes dentro do Parque Estadual da Pedra Branca, onde seriam construídas 30 casas de altíssimo padrão. Isso não é normal. Esse trabalho de desbaratamento só foi possível com a integração da Secretaria do Meio Ambiente com o Ministério Público, a Polícia Civil e a Polícia Militar.
Você citou a violência na Amazônia e nós sabemos que existem grupos criminosos do Rio de Janeiro, como o Comando Vermelho, que hoje contribuem para o aprofundamento da violência nessa região. O contrário também acontece? Grupos criminosos da Amazônia também financiam, de algum modo, a violência e a destruição do meio ambiente no Rio de Janeiro?
Sim, com certeza. O crime organizado conecta o Rio de janeiro e a Amazônia Um dos desdobramentos da ação de investigação sobre ocupação de lotes para construções ilegais em áreas protegidas no Rio foi a descoberta de uma rede de financiamento de compra de maquinário pesado para construção civil através da lavagem de dinheiro de garimpos ilegais na Amazônia. Isso mostra como o combate ao crime ambiental não é algo para amadores e nem pode se tratar de um evento episódico. Os principais avanços sobre áreas protegidas não são feitos pela população pobre, embora seja necessário admitir que existe, sim, uma questão relacionada à moradia popular que também precisa ser sanada. Essas áreas são capitaneadas por organizações criminosas muito poderosas, com muito recurso financeiro e uma ideia de que crime o ambiental compensa. Por isso, foi tão importante expor o máximo possível essas operações na imprensa, para ficar claro que aqui o crime ambiental não compensa mais.
Você teme sofrer represálias por essa exposição? Já foi ameaçado?
Eu busco lidar de forma impessoal. Por mais que eu tenha aparecido dezenas de vezes na televisão, sempre foi de forma muito institucional, até para dar segurança ao fiscal que está na ponta. Mas é claro que sofri ameaça. Aconteceu na mesma semana de um líder de uma casa de axé e um pastor evangélico virem me dizer que tinham ouvido coisas sobre mim em suas comunidades em tom de ameaça. Mas mesmo assim a gente não arredou pé, tudo de forma muito íntegra e institucional, para que não fizesse do enfrentamento uma questão pessoal minha. Eu enfrento com tranquilidade. A decisão de me candidatar passa também por continuar tendo autonomia com a legitimidade do voto, para mostrar que a agenda ambiental é a que a população acredita, que o povo percebe como prioritária.
A cidade do Rio de Janeiro tem destaque no que se refere à conjunção de uma agenda climática e o combate à violência urbana. Mas a cidade está se preparando para mitigar os efeitos das mudanças climáticas? Como você espera utilizar o conhecimento adquirido nesta área se eleito como deputado estadual?
Esse talvez seja um dos grandes temas do estado e da cidade, pois esta virou protagonista na questão da resiliência para os extremos climáticos. Um dos equipamentos públicos ligados à mitigação já operantes na cidade do Rio é o Centro de Operações da prefeitura do Rio (Cor). A cidade já vivencia os seus extremos, principalmente o excesso de chuva, e a realidade é que quem sofre mais é quem precisa mais – o que nos leva à necessidade de pensar na justiça climática. No estado, temos perdido muitas vidas , como na tragédia em Petrópolis. Eu tenho certeza de que o estado poderia ter um Centro de Operações assim como a capital tem, para minimizar os impactos desses eventos, garantindo alertas, sirenes, aprimorando a capacidade de prever as grandes tempestades com as ferramentas meteorológicas, com toda a capacidade de mobilização a nível estadual. Meu objetivo é aprovar um Projeto de Lei impondo ao governo estadual que use recurso do executivo do estado ou do fundo soberano para a criação de um Centro de Operações estadual. A gente não pode achar que o que aconteceu em Petrópolis é normal.
Você tem planos específicos para o combate a crimes ambientais na região da Costa Verde do estado?
Eu acredito que um Centro de Operações estadual teria um papel importante também no contexto da Costa Verde, porque integraria os órgãos que já exercem suas tarefas operacionais e de mobilização na região. Quando você tem uma chefia centralizada das operações, as decisões são tomadas em conjunto de forma mais integrada e eficiente. Esse é um formato que tanto facilita o trabalho de agentes de proteção e monitoramento das áreas quanto permite evitar tragédias e salvar vidas diante de eventos extremos.
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