Reportagens

Documentário conta como é a vida dos seringueiros da Reserva Extrativista Chico Mendes

O filme “Reservas Extrativistas: O Legado de Chico Mendes”, de Roberto Herrera, mostra o dia-a-dia de duas famílias de seringueiros no Acre

Sabrina Rodrigues ·
21 de fevereiro de 2019 · 5 anos atrás
O seringueiro e extrativista, Roberval Fernandes.

No final de 2018, ao ficar sabendo que iria fazer uma reportagem sobre os 30 anos da morte de Chico Mendes, o repórter cinematográfico Roberto Herrera Peres sentia que tinha tudo esquematizado na sua mente. Mas ao entrar em contato com os seringueiros e extrativistas da Resex Chico Mendes, no Acre, Roberto viu que tinha a oportunidade de mostrar em campo, tudo o que ouviu falar sobre essas unidades de conservação. E nessa viagem, Roberto encontrou os personagens principais do documentário Reservas Extrativistas: O Legado de Chico Mendes, que mostra o cotidiano e os desafios de duas famílias pela sobrevivência dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes.

Há um ano trabalhando como produtor de conteúdo audiovisual para o Jornal do Brasil, Roberto Herrera, de 33 anos, tem carreira consolidada em torno do setor audiovisual. Formado em direção de fotografia pelo Centre d’Estudis Cinematogràfics de Catalunya, Herrera começou em 2008 como crítico de cinema em revistas independentes localizadas em Barcelona e Amsterdã, que deram a ele a oportunidade de frequentar os principais festivais de cinema do mundo. Escreveu para as revistas Film Conductor, de Barcelona e Off Beat Cinema, de Amsterdam.

De 2012 a 2016, passou a trabalhar como curador de cinema, prestando serviço para museus e festivais especializados. O cargo mais relevante desta etapa foi ter sido curador chefe de cinema do prestigiado museu carioca, a Casa Daros, instituição criada para exibir o acervo da Coleção Daros Latinamerica, especializado em arte latino-americana, e que encerrou suas atividades há 3 anos. Mas foi a partir de 2016 que a carreira de Roberto deu um novo rumo, totalmente direcionado para a produção de conteúdo audiovisual para internet. Esta guinada surgiu do entendimento de que a demanda por filmes, vídeos e documentários está e continuará cada vez mais forte em plataformas online. E como afirma Roberto “Encontrei o caminho socioambiental”, rumo que não pretende desviar.

As reservas extrativistas vivem o desafio de conter a pressão da pecuária em seu território e de encontrar maneiras mais justas de remuneração aos serviços ambientais prestados pelas famílias que ali vivem. É o que mostra o filme que pode ser assistido pelo Youtube, que conta as histórias das famílias de Roberval Fernandes e de José Ribamar Ferreira, mais conhecido como Zé da Banha. Reservas Extrativistas: O Legado de Chico Mendes” é o tema do nosso segundo “Três dedos de prosa”.  

*

Como você encontrou as pessoas que estão retratadas no seu filme?

Eu as encontrei lá (no Acre). Comentei um pouco do que eu estava fazendo, como documentarista, sobre a reportagem, e eles, o Roberval e o José Ribamar Ferreira (Zé da Banda) se interessaram em participar. Eles foram os dois seringueiros que eu tive mais afinidade. Fui levado para lá pelo presidente da Associação dos Moradores, que é o ex-prefeito de Xapuri, Julio Barbosa. Conheci o Julio durante o evento dos 30 anos de morte de Chico Mendes e ele me convidou para visitar a comunidade da Reserva, numa confraternização que eles fazem no fim do ano. Eu tive a sorte do Julio me chamar e na confraternização conheci todos os seringueiros. É curioso porque eles são vizinhos há dez quilômetros de distância, então, eles não têm muito o hábito de visitar as colocações, como os seringueiros chamam as casas onde moram. Então, eles não têm o costume de se visitarem. Esse tipo de data como fim de ano, dia dos pais, é uma grande celebração onde eles se encontram para jogar futebol, para fazer uma comida, confraternizar mesmo. Uma coisa legal que eu notei foi a organização deles. As distâncias são muito grandes dentro da Reserva.

Roberto Herrera Peres durante as filmagens.

E foi uma grande troca de experiência. Eu tinha muitas perguntas para eles e eles tinham muitas perguntas para mim. Eu queria saber muito como é o dia-a-dia deles. Eu queria entender um pouco de eles estarem na linha de frente da conservação, pois eles são os primeiros que estão interessados nisso, em sobreviver dos produtos florestais. Eu percebi que o interesse está crescendo cada vez mais por agrofloresta, para eles não dependerem da criação de gado, porque na verdade você pode ter em cada colocação um número de cabeça de gado e é uma maneira de eles fazerem uma poupança. Mais de um seringueiro me falou que se os produtos florestais fossem melhores recompensados, eles não teriam que ter gado dentro da Reserva.

Qual foi a sua maior dificuldade em realizar esse filme?

Acho que a maior dificuldade foi a logística. De organizar e aproveitar o tempo que eu tive com eles, porque os extrativistas são pessoas muito ocupadas, são muito preocupados de perder qualquer hora que eles têm na lavoura deles, principalmente nesta época do ano. Quando os extrativistas me receberam, eu percebi a preocupação com as coisas que eles tinham que fazer. Mas por camaradagem, por serem pessoas muito boas, eles aceitaram me receber e dar o pouco do tempo deles para mostrar as suas vidas e se abriram para isso durante um dia. Acho que a maior dificuldade foi essa, aproveitar o maior tempo possível com eles.

 

O seringueiro e exttrativista Roberval Fernandes e o diretor Roberto Herrera Peres.

O que você pretende alcançar com esse filme?

Eu quero mostrar que realmente é possível ocupar uma área de floresta com produção. Com as Reservas Extrativistas, tem-se a possibilidade de garantir o acesso à terra a muitas pessoas que querem trabalhar e querem produzir. Ok. A Reserva Extrativista tem a peculiaridade de viver de produtos florestais. É uma maneira de você ocupar o território e ter um terreno produtivo também. É uma maneira de fazer reforma agrária que o Brasil também precisa. Eu queria mostrar que nós temos que fortalecer esse tipo de população. Eu quis mostrar as dificuldades deles. O caminho está traçado aí, é um legado que nós temos no Brasil, que é esse conceito de ocupação de território. Nós temos que aperfeiçoar esse caminho. Nós temos 500 mil pessoas mais ou menos vivendo em Reservas Extrativistas, existe uma demanda para que esse número ainda aumente. Então, o meu objetivo foi fortalecer esse tipo de estilo de vida, foi tentar mostrar para um público amplo que no Brasil existem pessoas que querem viver de produtos florestais. Esses produtos podem ser mais valorizados também. São produtos que na cidade tem um preço que eu considero alto, e nós temos que debater como remunerar melhor quem está na linha de frente dessa batalha pela conservação e quem está na linha de frente são os seringueiros, as populações tradicionais.

Roberval Fernandes.
Daiane Fernandes, filha de Roberval Fernandes.
Rone Fernandes, filho de Roberval.

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  • Sabrina Rodrigues

    Repórter especializada na cobertura diária de política ambiental. Escreveu para o site ((o)) eco de 2015 a 2020.

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Comentários 1

  1. Michelle diz:

    "A Reserva Extrativista tem a peculiaridade de viver de produtos florestais" = BOI.