Nesta semana, Adriano Gambarini acompanha a expedição à Estação Ecológica de Taiamã, no Mato Grosso. Ele conta aqui o dia-a-dia dos pesquisadores e o monitoramento das onças pintadas.
DIA 02
A madrugada novamente foi nossa companheira de trabalho. Como a Esec Taiamã é uma ilha, logo cedo navegamos pelo Rio Paraguai em busca de lugares para instalar os laços; esta metodologia de captura requer um cuidado extremo, pois os lugares escolhidos devem ter condições específicas. Buscamos os chamados ‘trilheiros’, caminhos no mato onde é possível encontrar vestígios de que as onças caminham com freqüência. Além disso, a área deve ser relativamente limpa de arvores e galhos, porque no momento em que a onça é capturada pelo laço, normalmente ela tenta a todo custo escapar, e qualquer árvore ou galho em que ela possa se apoiar para tracionar, contra a resistência do laço, pode ser um fator contra nossos propósitos. Frederico Gemésio e Rogério Cunha ficaram responsáveis pela instalação dos laços, contando ainda com a ajuda imprescindível de Daniel Kantek e Selma Onuma, analistas ambientais da Esec Taiamã e parceiros do Cenap nesta campanha.
Só um ‘parenteses’ de angústia de campo, e aqueles que realmente se embrenham neste mundão sem fim sabe do que estou falando: nunca entendi para que servem as mutucas…é insano o convívio com estes insetos, que insistem em conhecer nossos braços, pescoços e rostos tão de perto, ‘beijando-os’ compulsivamente! Eta bichinho insaciável!
Em resumo, o trabalho consiste em enfiar 4 longos vergalhões de ferro no solo, que prendem o cabo de aço e o “gatilho” que ativa o laço. A instalação dos aparatos não é de todo complicado, e sim camuflar o ambiente. Convenhamos que as onças são animais ‘velhacos’, do contrario não seriam o maior predador de nossas terras brasilis. Qualquer mínimo cheiro diferente ou mudança no ambiente podem ser suficientes para ela mudar sua rotina e seus caminhos. Os pesquisadores que trabalham com esta técnica de captura contam experiências em que a onça simplesmente pula o laço, deixando rastros antes e depois da armadilha…rastros de frustração, devo acrescentar.
Os laços serão checados a cada seis horas, com a contenção da ansiedade que começa a dominar a equipe. Finalizo este texto à meia noite de quarta-feira, com uma triste notícia: o fogo que fotografei ontem invadiu as terras desta Unidade de Conservação, numa triste realidade brasileira. Me pergunto, pra que botar fogo na própria terra, e pior, compartilhar com vizinhos que não querem aquele fogo? Infelizmente, estas pessoas que usufruem desta infeliz cultura das queimadas, certamente não buscam conhecimento em sites como ((o))eco.
Enquanto isto, num outro ponto e época (fotografei esta onça em novembro de 2010) a onça descansa a nos esperar….
DIA 01
A viagem é longa. Começa na madrugada paulista, seguindo de avião até Cuiabá, onde uma caminhonete da equipe da Estação Ecológica de Taiamã nos espera. Seguimos sudoeste, sentido Cáceres, durante duas horas e meia de viagem no conforto do asfalto para então sermos absorvidos em mais duas horas pela poeira da terra seca do cerrado. Chegamos às margens do Rio Paraguai e daí navegamos rio abaixo numa voadeira de alumínio, onde um motor de popa se esganiça para carregar o pesado equipamento. Chegamos na base da Estação, recebidos sem pudor por uma nuvem de mutucas. Mas dizem por ai que a vida é benevolente para os persistentes (ou seria para os loucos?)
Enfim, estes são os primeiros momentos desta expedição que pretendo compartilhar com vocês ao longo da semana. Estou documentando a primeira campanha de captura de onça-pintada na Estação Ecológica de Taiamã e entorno, no Mato Grosso, organizado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros (CENAP/ICMBio). A intenção primordial desta expedição é a captura de onças-pintadas e colocação de radio-colar com GPS, e desta forma dar início a um estudo mais aprofundado sobre o comportamento e área de vida das espécimes que vivem na região.
Conhecidas pelo massificado turismo de pesca, as redondezas da Esec Taiamã ficaram ‘famosas’ nos últimos anos e passaram a receber grande número de visitantes pela facilidade de se observar onças descansando calmamente nos barrancos às margens do Rio Paraguai. Contudo, nada vem de graça quando a ganância predomina nas intenções humanas, e muitos guias de pesca começaram a perigosa atividade de ceva (alimentação artificial).
Entretanto, onça não é um animal ‘cevável’, e apesar de algumas delas já terem sido observadas pelos analistas ambientais da Esec, com comportamento condicionado à comida fácil, estamos lidando com o maior felino das Américas. Esta perigosa combinação já culminou em tragédias, quando dois acidentes com ataque de onças a humanos ocorreu nos últimos três anos. E é justamente isto que os técnicos do CENAP querem evitar, tentando buscar respostas algumas perguntas. Qual será a tendência comportamental das onças se a ceva e o turismo de observação aumentarem ainda mais? Quais medidas de normatização da atividade turística de observação serão necessárias para um turismo seguro, tanto para a comunidade local como para as onças?
Ao longo da semana compartilharei o maior numero de informações possíveis, alem de uma inevitável adrenalina na atividade que estamos prestes a iniciar. Afinal, capturar onça-pintada envolve riscos e muita, muita concentração nos métodos adotados. E a metodologia usada será da instalação de laços escondidos no foliço das matas. E a montagem destes laços, feitos com cabos de aço, é o que pode ser visto na seqüência de fotos a seguir.
Para finalizar, compartilho a ‘atriz principal’ de todo este aparato de equipamentos e atividades: uma onça fotografada em 2010, em minha primeira viagem à Taiamã. Espero que vocês gostem, divulguem, compartilhem!
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