A participação social é um direito do cidadão à expressão de sua autonomia. Entretanto, em comunidades ribeirinhas da Amazônia, sobretudo naquelas distantes dos centros urbanos e com difícil acesso, existe um déficit de participação social. Para essas comunidades, promover processos participativos é uma estratégia fundamental para a inclusão política e socioeconômica.
Afinal, quando se fala que a Amazônia precisa ser debatida com seus protagonistas, estamos falando dessas pessoas, que vivem, conhecem e protegem o bioma. E isso acontece a partir da inclusão social, que é um processo. Começa-se enfrentando os desafios logísticos para estabelecer a contínua comunicação com os ribeirinhos, indígenas e extrativistas.
Especificamente em Unidades de Conservação de Uso Sustentável, a participação social é prevista na forma da Lei 9.985/2.000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), e seu decreto regulamentador, o Decreto 4.340/2002. Nesse instrumento, a participação é relacionada às audiências públicas, aos conselhos gestores, à gestão compartilhada com a sociedade civil, entre outros aspectos. A participação da sociedade civil na gestão de unidades de conservação se dá, sobretudo, pelo envolvimento de lideranças das “associações-mãe”, que as representam.
A preparação de líderes impacta positivamente os espaços sociais, seja no campo socioeconômico, político ou ambiental. Por essa razão, deve estar associada à disseminação do conhecimento, à efetiva participação das lideranças em discussões, às capacitações e intercâmbios, entre outras interações que ampliem a compreensão sobre os objetivos de existência da Unidade de Conservação e do papel de seus líderes. A liderança precisa ser preparada para se posicionar frente às questões de sua vida, do seu projeto de pessoa, da comunidade e da sociedade onde vive e atua.
Essa preparação é um dos maiores desafios da participação social, haja vista o investimento necessário em mobilização, articulação, preparação, organização dos conhecimentos, além do próprio reconhecimento de problemas e o mapeamento de soluções. As experiências e cenários desempenham um importante papel no desenvolvimento das habilidades sociais e são influenciadas pelas características sociais, econômicas e culturais no qual são desenvolvidas.
De acordo com Boaventura Santos, quando um conjunto de experiências sociais é percebido e expandido (sociologia das ausências), proporcionalmente expande o campo dos sinais críveis e futuros possíveis (sociologia das emergências), ou seja, quanto mais numerosas forem as experiências atuais, mais numerosas serão as experiências possíveis no futuro. E, nessa lógica, a sociologia das emergências atua tanto sobre as possibilidades como sobre as capacidades.
A aprendizagem, então, deve assumir caráter contínuo para manter os atores socialmente habilidosos, já que as habilidades sociais aprendidas podem perder-se por falta de uso, principalmente quando as pessoas se encontram em longos períodos de isolamento social.
É por meio da aprendizagem social que se estabelece o conceito de inovação social, que repousa no potencial dos indivíduos e consiste em um processo de aprendizagem que inclui aquisição de conhecimento, modificação de representações e aprendizado da cooperação. Por essa visão, a inovação social está mais próxima da ideia de emancipação e só se viabiliza graças ao desenvolvimento de uma rede de parcerias entre atores sociais.
Na perspectiva de alcançar melhores condições sociais, econômicas e ambientais para as comunidades ribeirinhas, é de extrema importância que sejam estabelecidas estratégias e arranjos integradores de financiadores, instituições e pessoas que assegurem o envolvimento e a participação continuada, constante e permanente, visando aperfeiçoar os processos de decisão, planejamento, implementação e acompanhamento dos investimentos no âmbito do programa, tornando-se principal agente de mudanças de sua realidade.
O empoderamento é um termo que foi banalizado pelo uso excessivo e em contextos nem sempre nobres, trazendo o estigma de causas diversas e que perdeu sua força perante movimentos antagônicos, de críticos e novos críticos. As reações à temática são diversas, desde pessoas que declaram que param de ler qualquer coisa ao se deparar com a palavra empoderamento, até a manifestação de ódio sem causa.
Seu Edvar é uma figura que nos encanta. Ele levou quatro dias saindo da sua comunidade, localizada na Vila Cujubim, para o município de Jutaí/AM, e depois levou 33 horas de lancha a jato (embarcação popular na Amazônia) para chegar em Manaus. E por que o seu Edvar nos encanta? Ele é um “senhorzinho” que viveu da extração da borracha até pouco tempo atrás, em um lugar tão distante, como a RDS do Cujubim. De um tempo para cá, se tornou uma forte liderança, representando os seus moradores.
Todo o esforço que ele faz, viajar duas vezes por ano, é no sentido de reivindicar melhores condições para as famílias no qual ele representa. Durante uma semana, o seu Edvar permaneceu em Manaus e participou de várias capacitações e treinamentos e, apesar da sua idade, ele não se intimida diante de novos desafios.
Imaginem vocês, seu Edvar participando do curso de Excel e nos causando tanto encantamento, uma vez que uma pessoa na idade dele talvez não tenha tantas perspectivas, ainda assim ele quer aprender. Seu Edvar é daquelas pessoas que você olha e se apaixona, uma vez que a história de vida dele, ao mesmo tempo que é desafiadora, é tão leve, porque você nunca o verá de mau humor ou triste, ele está sempre sorrindo. Nos eventos em que participa, é o “xodó” de todos.
E pensar que, há oito anos, o seu Edvar era uma pessoa caladinha que ficava no seu cantinho e hoje observamos o quanto que ele está empoderado. Seu Edvar reivindica, questiona, se posiciona. É um ribeirinho exemplo de que o cidadão, não importa onde esteja, se está isolado ou não, tem direito ao resgate da sua cidadania, de reivindicar e de usufruir daquilo que vai melhorar as suas condições.
O que mais é apaixonante em Edvar é que ele não está indo buscar tudo isso somente para ele, está pensando naqueles que o elegeram, uma vez que ele representa a sua associação. O seu Edvar é um exemplo de que para o caboclo, não tem dia difícil.
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