Reportagens

Clima ganha destaque em planos de candidatos de Porto Alegre após enchentes

Apesar da atenção dada ao tema, candidatos falham em indicar as formas como, de fato, pretendem tirar propostas do papel

Cristiane Prizibisczki ·
4 de outubro de 2024

A capital gaúcha reviveu na última semana o drama dos alagamentos, com chuvas torrenciais que cobriram parte de bairros da Zona Norte e da Zona Sul da cidade. Com a frequência cada vez maior de eventos extremos, as questões climáticas passaram não só a fazer parte das preocupações da população de Porto Alegre, mas também a pautar a corrida eleitoral.

((o))eco analisou os planos de governo dos quatro candidatos com melhor colocação nas pesquisas para prefeito da capital gaúcha e identificou que o assunto ganhou importância inédita nas propostas eleitorais, com destaque para reconstrução e modernização dos sistemas de contenção de enchentes. 

Confira abaixo as principais propostas para a área ambiental de cada um dos quatro candidatos analisados. Eles aparecem no texto por ordem alfabética.

Felipe Camozzato, atual deputado estadual no Rio Grande do Sul e candidato pelo Novo, tem como uma de suas principais bandeiras a privatização do Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae). 

Em comparação com os outros três candidatos melhor colocados na corrida eleitoral, o plano de governo de Camozzato é o que tem propostas mais genéricas, sem aprofundamento sobre a forma como pretende executá-las. O documento, de 37 páginas, é dividido em quatro eixos: “Reconstruir, Fortalecer, Inovar e Libertar”.

O programa do candidato reconhece a responsabilidade antrópica das mudanças climáticas, mas não propõe ações de redução das emissões do município. Segundo ele, a Defesa Civil deve ser fortalecida, para “ser capaz de construir e executar planos de contingência com base em diferentes tipos de cenários de risco, como deslizamentos, enchentes, enxurradas, vendavais e tempestades”.

Ele também propõe investimentos em bacias de amortecimentos de cheias, redução de impostos e realocação de famílias que estão em zonas de risco. Além disso Camozzato também defende a implantação de um sistema de monitoramento com alertas em tempo real.

Seu plano de governo cita a palavra “enchente” 16 vezes e a palavra “clima” e derivados, como “climático”, 4 vezes. As palavras “meio ambiente” ou “sustentabilidade” não aparecem nem uma vez. Camazzoto está na 4ª posição da corrida eleitoral, com 7,8%, segundo pesquisa divulgada no último dia 30 pelo instituto AtlasItel.

Terceira colocada nas pesquisas, com 22,7% das intenções de voto, Juliana Brizola dedicou um capítulo inteiro de seu plano de governo ao tema das “Mudanças Climáticas e Infraestrutura”.

No documento, ela propõe recuperar e modernizar o sistema de proteção contra enchentes e criar um sistema de monitoramento de alerta integrado. Além disso, ela defende a atualização do plano diretor de drenagem urbana e a formulação de uma estratégia metropolitana de resiliência e adaptação às mudanças climáticas. 

Também constam em seu plano de governo a implantação de projetos de infraestrutura verde para redução de ilhas de calor, a eletrificação da frota de ônibus e a criação de um departamento de resiliência e proteção contra as cheias. 

O socorro a micro e pequenos empresários afetados pelas enchentes e redução de impostos para moradores de bairros afetados pelos eventos climáticos extremos também aparecem em suas propostas.

Em seu plano de governo, que tem 65 páginas, a palavra “enchente” aparece 16 vezes, a palavra “Ambiente” e derivações aparecem 7 vezes. A palavra “clima” e derivações aparecem 15 vezes e a palavra “sustentabilidade”, 10 vezes.

Fumaça proveniente das queimadas voltou a circular no Rio Grande do Sul na segunda-feira (30), elevando a concentração de partículas poluentes na atmosfera. Foto: Rafael Rosa/Agencia Enquadrar/Folhapress

Maria do Rosário, deputada petista, dedicou grande parte de seu Plano de Governo à questão climática. Dentre os candidatos que estão melhor colocados nas pesquisas, ela é a que mais claramente reconhece as mudanças climáticas como uma realidade. 

Segundo o Plano de Governo de Rosário, “a crise que vivemos não é um acaso, não é uma fatalidade. De um lado ela foi construída pelo negacionismo e imobilismo diante das mudanças climáticas, de outro pelo desmonte da gestão pública, desvalorização de seus peritos, técnicos e engenheiros. As lições deste momento nos exigem uma virada política, administrativa e cultural”.

Ela propõe a implementação de uma série de iniciativas para tornar Porto Alegre uma “cidade esponja”, de forma a melhorar o ciclo da água no planejamento urbano. Dentre as iniciativas, estão a recuperação de áreas verdes degradadas, ampliação da arborização urbana, reconfiguração da política municipal de coleta seletiva e de resíduos, ações para transição energética e investimentos em educação ambiental.

Rosário também propõe a formulação de um plano de contingência para enfrentamento de eventos extremos, criação de uma estrutura pública dedicada à drenagem e proteção, remoção de famílias que habitam áreas de risco, de forma consensual e reestruturação do Dmae.

Em seu Plano de Governo, que possui 55 páginas, a palavra “enchente” aparece 27 vezes, a palavra “clima” e variações, 17 vezes, a palavra “ambiente” e variações, 8 vezes, e a palavra “sustentabilidade”, 3 vezes. Maria do Rosário está em segundo lugar na corrida eleitoral, com 28,9% das intenções de voto, segundo pesquisa do AtlasIntel.

Sebastião Melo, atual prefeito de Porto Alegre e candidato à reeleição pelo MDB, dedica 16 das 27 páginas de seu Plano de Governo para enaltecer os feitos de sua gestão – que foi duramente criticada pelas falhas em conter as enchentes e pela forma como a prefeitura lidou com a tragédia. 

Melo dedicou três páginas para falar em “Reconstrução e Adaptação Climática”, ressaltou o investimento de R$ 510 milhões em obras de reconstrução de drenagem e segurança hídrica e citou o plano de ação climática que seu governo começou a desenvolver em resposta às enchentes. 

Ele promete medidas como a criação de um sistema de medição e alerta de riscos, a atualização do plano de contingência e a implementação de um centro de monitoramento e previsão do tempo. Também estão entre as propostas medidas tributárias de alívio aos afetados pelas enchentes, com descontos e isenções de tributos.

Em seu plano de governo, a palavra “enchente” aparece 15 vezes, a palavra “clima” e variações, também 15 vezes, a palavra “ambiente” e variações, 7 vezes, e a palavra “sustentabilidade”, 4 vezes. Melo lidera as pesquisas, com 32,4% das intenções de voto, segundo o AtlasIntel.

Segundo especialistas ouvidos pela Agência Pública, as propostas apresentadas pelos candidatos apresentam limitações, gerando dúvidas se as medidas serão efetivamente implementadas. Dentre as críticas feitas, estão a ausência de medidas de redução de emissões de gases de efeito estufa, falta de clareza sobre evolução das medidas com cenários de agravamento climático e ausência de detalhes sobre como medidas propostas serão financiadas e de fato implementadas.

  • Cristiane Prizibisczki

    Cristiane Prizibisczki é Alumni do Wolfson College – Universidade de Cambridge (Reino Unido), onde participou do Press Fellow...

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