Muito se fala sobre os instrumentos econômicos como ferramentas essenciais para a proteção do meio ambiente. No Brasil, infelizmente, os instrumentos legislativos e regulamentares são muito escassos e, com a notável exceção do ICMS ecológico, que já foi abordado em coluna anterior, os governos pouco fazem para viabilizar uma abordagem mais efetiva para a solução dos diversos problemas ambientais. Ao contrário, a tendência governamental é ampliar o número de taxas, emolumentos e cobranças diversas, em um processo de transferência de renda do setor privado para a administração que, em poucas oportunidades, corresponde à uma melhoria efetiva do meio ambiente, de sua qualidade ou mesmo de sua gestão.
No âmbito privado, no entanto, as coisas ocorrem com um ritmo e uma motivação bastante diferente daquela que ocorre no mundo oficial e que, não raras vezes, apresenta resultados surpreendentes. Gostaria de chamar a atenção do leitor para uma experiência muito interessante – da qual tenho participado intensamente, pois é uma empresa cliente de nosso escritório. Refiro-me à empresa GETEC. Ela foi fundada em 1964 por cinco sócios brasileiros. Três anos depois ela começou a produzir Sorbitol a partir de Dextrose Monohidratada importada, com tecnologia adquirida no exterior. Em 1968, desenvolveu tecnologia inédita para produção de Sorbitol a partir de açúcar. Com a mudança, um novo produto passou a ser gerado, o Manitol. Na década de 70, a Getec vivenciou sucessivas expansões de capacidade. Em 1978, desenvolveu tecnologia para a produção de Dextrose Anidra Injetável, a partir de fécula de mandioca. Na década de 80, a Getec priorizou o abastecimento do mercado doméstico, além da comercialização do Manitol para todos os continentes globais, situando-se entre os três maiores produtores e exportadores mundiais de Manitol.
Pelo produto, se percebe que a indústria tem muita necessidade de controle da qualidade de seus produtos, pois os mesmos são utilizados para o tratamento de doenças, inclusive sendo injetados. Há uma outra característica curiosa no processo da empresa, pois a sobra de seu processo é a própria matéria prima. Como diminuir perdas, ampliar a produtividade e implementar constantemente a melhoria das condições ambientais? A solução encontrada foi uma parceria ativa com os trabalhadores da própria empresa., de forma que eles passassem a atuar ativamente na defesa do meio ambiente, na redução de custos e na melhoria de suas próprias condições materiais. Em negociação com os trabalhadores, por ocasião do dissídio coletivo, a empresa sugeriu a inclusão de uma cláusula mediante a qual a companhia se comprometia a capacitar os trabalhadores, de forma que operassem os equipamentos industrias de forma mais eficiente, com a diminuição de perdas e maior economia. Por outro lado, foi estabelecido um prêmio a ser pago aos trabalhadores sempre que se verificar a redução das perdas e a melhoria das condições ambientais das instalações. É importante ressaltar que, na hipótese, não estamos falando da participação nos lucros que normalmente ocorre.
O pulo do gato foi garantir um benefício econômico palpável para os trabalhadores sempre que eles estivessem agindo de forma a melhorar as condições ambientais da empresa, com a conseqüente redução de descarga de efluentes, aumento no asseio, etc. O ganho ambiental se tornou perceptível. Desde que houve a implantação da cláusula ambiental no Dissídio Coletivo, a melhoria do desempenho ambiental da empresa vem sendo constante e os trabalhadores vêm tendo aumento em seus vencimentos. Foi estabelecido um jogo ganha-ganha.
Como venho sustentando, desde há muito, a proteção do meio ambiente deve ser feita dentro de um contexto que permita uma identificação entre a melhoria ambiental e a melhoria concreta da vida dos indivíduos. Enquanto não tivermos muito claro que não há oposição entre proteção ambiental e desenvolvimento econômico, dificilmente conseguiremos avançar na proteção do meio ambiente. No caso acima narrado, esta vinculação ficou muito clara. Certamente, em diversas outras hipóteses, o mesmo ocorre. Cabe-nos identificar os momentos para, aproveitando as janelas de oportunidade, avançar em direção às constantes melhorias ambientais e materiais.
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