Análises
Conama e os fora-da-lei VI
De Ricardo Camargo A mensagem anterior, de Guilherme Fiqueiredo, coloca a discussão no ponto que, efetivamente, merece aprofundamento: o dos limites e possibilidades do uso das leis-quadro na matéria ambiental. É de ser recordado que a atribuição de poderes normativos a órgãos não legislativos não constituiu privilégio ou inovação da Lei 6.938, de 1981: pode-se referir a atuação da antiga Superintendência Nacional da Moeda e do Crédito (SUMOC), que foi substituída pelo Banco Central (que continua a exercer num caráter obsessivo a capacidade normativa), os atos normativos que a Secretaria da Receita Federal, desde que me conheço por gente, vem editando, as Resoluções de Diretoria do extinto Banco Nacional da Habitação, entre outros tantos. Em suma, não se trata, puramente, de dizer que as Resoluções do CONAMA são, em si e por si, boas ou ruins, se há ou não demagogia no fato de elas emanarem de um órgão não legislativo, mas sim de se saber quais as matérias que, efetivamente, devem ser reservadas à lei. Para não se dizer que estou sendo heterodoxo - palavra maldita no meio bacharelesco -, invoco a autoridade sagrada de Carlos Maximiliano quando recorda as regras acerca da interpretação de normas atributivas de competência: esta não se presume, mas, uma vez atribuída, há de ser compreendida como dotando o agente que nela é investido com toda a amplitude necessária para o seu eficiente desempenho. Agora, a própria elaboração da lei-quadro apresenta os seus problemas, justamente porque se há uma certa liberdade de conformação do legislador, não se pode esquecer que não há a possibilidade de se transferir o que constitucionalmente compete ao legislador a órgão diverso. É que quando a competência trem sede constitucional, não cabe ao legislador infraconstitucional transferi-la ou delegá-la sem autorização constitucional expressa, como aprendi com autores de insuspeita ortodoxia como Manoel de Oliveira Franco Sobrinho e Rui Cirne Lima. Tal o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.544/RS, relatada pelo Min. Sepúlveda Pertence. Quanto ao Código Florestal em si mesmo, penso que o legislador de 1965 atirou no que viu e acertou no que não viu. É que a visão de proteção ao meio ambiente, naquela época, era considerada até suspeita, como tentativa de sabotar o desenvolvimento nacional. Tal, aliás, foi o pronunciamento em Estocolmo (1972) da representação do Brasil, consoante tive a oportunidade de documentar em texto acessível na internet. Somente quando autores insuspeitos, como o ex-Procurador-Geral do Estado da Guanabara de 1971-1973 Diogo de Figueiredo Moreira Neto, vêm a tratar do tema ambiental que ele passa a se tornar palatável para a inteligência jurídica brasileira daquele período.Nada melhor para uma lista desta natureza que manter o debate no nível conceitual.Resposta do autor:Agradeço pelo comentario ao artigo. As delegações de fato existem. E é importante que existam. O problema do CONAMA é outro. Não raras vezes ele ultrapassa qualquer delegação. Vide resolução 237, por exemplo. Quanto ao Código Florestal é importante que ele não seja utilizado fora de sua real destinação. Paulo Bessa