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Carta – Social ou ambiental?

De Daniel Di Giorgi ToffoliGeógrafo e Analista Ambiental do IBAMACom relação à matéria entitulada “Itatiaia, entre o tudo e o nada” Lamento a...

Redação ((o))eco ·
31 de março de 2006 · 18 anos atrás

De Daniel Di Giorgi Toffoli
Geógrafo e Analista Ambiental do IBAMA

Com relação à matéria entitulada “Itatiaia, entre o tudo e o nada

Lamento a posição do autor quando insiste no “desejo” opcional do IBAMA em seguir princípios básicos da lei que rege as unidades de conservação no Brasil. Então esta posição não é só de um colunista deste site, mas de dois.

Felizmente – ou infelizmente para o autor, pois sua tese não foi comprovada – o autor não “descobriu” um parque nacional americano que convive com terras privadas no seu interior, pois o Cape Code não integra a categoria “parque nacional”, mas sim a categoria “national seashore”. A IUCN (The World Conservation Union) e a WCPA (World Commission on Protected Areas) dividiram as unidades de conservacao em 7 categorias (Ia, Ib, II, III, IV, V e VI), em ordem decrescente de restrição. A categoria “Parque Nacional” é a II e a categoria “Protected Seascape”, no qual o Cape Code se enquadra, é a V. O IBAMA e mais 15 ONGs brasileiras de grande relevância são membros da IUCN, portanto devem seguir as 7 categorias de unidades de conservação e suas restrições. E mesmo que houvesse um precedente em algum outro parque nacional no mundo (como há em alguns países europeus onde quase já não há natureza a ser conservada), este parque se enquadaria em outra categoria da IUCN, portanto fora dos padrões internacionais de conservação. As únicas exceções aceitas no Brasil e em vários paises que adotam a categorização são para a permanência de populações ditas “tradicionais” , que, creio eu, não seja o caso.

Pergunto, é de desejo de um site entitulado O Eco que aconteça isto? Será que o autor, procurando um precedente para confirmar sua teoria, não busca intrinsicamente a realização de um precedente no primeiro parque nacional brasileiro? Sera que não é contraditório os colunistas do O Eco em duas materias (Reforma pelo Social de 28.03 e Sarna para se coçar de 25.03) demonstrarem preocupação pela falta de uma corrente conservacionista e, conseqüentemente, criticarem uma corrente onde a prioridade é o social, ao mesmo tempo enfatizarem o social, a propriedade privada, defenderem regulação de uso (não de moradores na sua grande maioria, mas de proprietários de segunda residência) em detrimento do ambiental, do legal, do internacionalmente aceito?

A base conceitual de parque nacional vem do YellowStone Act, quando foi criado em 1872 o primeiro parque nacional do mundo. Diz o Act que o parque era “designado como um parque público (…) ou área para recreação e benefício de todo o povo” e “para a preservação de toda madeira, depósitos minerais, curiosidades ambientais e sua retenção em suas condições naturais”. Sendo assim, incompatível com propriedades particulares.

Penso que o autor não pesquisou nos lugares certos. A IUCN refinou as categorias em 1994 e o SNUC (Lei Fed. 9985/00, amplamente debatido durante mais de 10 anos no Congresso) se baseou nesta categorização. Quase 100% dos países que possuem áreas protegidas seguem as categorias da IUCN e apenas Equador, Guine Bissau, Índia, Rússia, Santa Lucia e Ucrânia não a incorporaram em sua legislação, apesar de se basearem nesta categorização.

A 7a Conferência das Partes para a Convenção da Diversidade Biológica (ocorrida em Kuala Lumpur, Malásia, em 2004) adotou o Programa de Trabalho em Áreas Protegidas em sua decisão VII/28, endossando um sistema único de categorias de unidades de conservação e, principalmente, os objetivos de cada. Para melhor entendimento reproduzo um parágrafo da decisão, literalmente.

The Programme of Work on Protected Areas states that the CoP: Recognises the value of a single international classification system for protected areas and the benefit of providing information that is comparable across countries and regions and therefore welcomes the on-going efforts of the IUCN WCPA to refine the IUCN system of categories and encourages Parties, other Governments and relevant organisations to assign protected area management categories to their protected areas, providing information consistent with the refined IUCN categories for reporting purposes.”

Alem da decisão da COP 7, há a decisao do 5o Congresso Mundial de Parques. Ainda mencionam e usam as categorias da IUCN o The Conservation of Arctic Flora and Fauna (CAFF), o Circumpolar Protected Areas Network (CPAN) Strategy and Action Plan 1996 e o Revised African Convention on the Conservation of Nature and Natural Resources 2003.

Se 1% de um parque nacional não fosse importante, tambem não seria importante diminuir pela metade a área de todos parques nacionais do mundo, já que eles ocupam 2% da superfície terrestre.

Atenciosamente,


Resposta do editor:

Os colunistas têm total liberdade para expressar suas opiniões. Os textos levantam a controvérsia jurídica a respeito do dever (ou opção) do Ibama em desapropriar, propõem soluções de preservação que passam pelo interesse privado e benefícios econômicos e criticam a histórica ineficácia do Estado em resolver problemas fundiários. E como meio ambiente é assunto polêmico por definição, discordâncias são muito bem-vindas. Assim é que se aprimora o debate.

Não há contradição editorial. Em suas reportagens, O Eco defende a preservação ambiental. Mas o faz seguindo o princípio de apuração jornalística isenta. Por isso não ignora conflitos nem tapa os ouvidos para outras opiniões.

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