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Brasil atrasa entrega de relatório sobre conservação da biodiversidade às Nações Unidas

O país deixou de entregar o relatório quadrienal contendo informações acerca da implementação da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) às Nações Unidas. O prazo era até o fim de 2018

Carolina Lisboa ·
21 de março de 2019 · 6 anos atrás
Sexto Relatório Nacional para a CDB está atrasado. Acima, sede do Ministério do Meio Ambiente. Foto: OC.

A cada quatro anos, o Brasil deve entregar um relatório com os avanços nacionais quanto à implementação da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB/Nações Unidas). Este é um compromisso assumido pelo país enquanto membro da Convenção, previsto no artigo 26 da CDB (ratificada e promulgada pelo Decreto Federal nº 2.519/1998). No relatório deve constar, por exemplo, ações brasileiras quanto ao atendimento das 20 Metas de Aichi até 2020. O sexto relatório nacional para a CDB, elaborado sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, deveria ter sido entregue até 31 de dezembro de 2018.

De acordo com José Pedro de Oliveira Costa, ex-secretário de Biodiversidade do MMA, a Convenção é de extrema importância, sendo o elemento basilar da questão ecológica mundial. “Foi acordada durante a Rio 92 e o Brasil foi o primeiro país a assiná-la. É um dos elementos de orgulho nacional, nós que somos o país mais biodiverso do mundo e temos grande responsabilidade para com o cumprimento de seus desígnios. É o que vimos fazendo até agora, tendo com isso granjeado significativo respeito no rol das nações”, esclarece.

Quem está à frente da elaboração do Sexto Relatório Nacional para a CDB é a equipe do departamento de Conservação de Ecossistemas da Secretaria de Biodiversidade (SBio) do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Enquanto diretora, Ana Paula Leite Prates coordenou a elaboração do relatório desde o início de 2018. No atual governo, quem assumiu a responsabilidade foi Regis Pinto de Lima, que, em função da SBio estar sem secretário, permaneceu por apenas dois meses e se transferiu para o ICMBio. Na página da Secretaria figura Rodrigo Martins Vieira como diretor substituto do Departamento. Aparentemente, a equipe de elaboração está “acéfala”.

Contudo, há expectativa de entrega do relatório até junho deste ano. Segundo Bráulio Ferreira de Souza Dias, ex-secretário executivo da Convenção sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas (CDB) e atual professor do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília (UnB), a maioria dos países costuma atrasar e muitos prometem remeter seus documentos até outubro, com aval da Convenção. “Se o governo concluir e mandar o relatório ainda este ano, estará tudo bem. Se não, os dados do Brasil não serão incluído no 5° Global Biodiversity Outlook (GBO) e nos documentos que o Secretariado tem que concluir até março de 2020 para que seja considerado pelas reuniões preparatórias da Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade  (COP), que ocorrerão em junho de 2020, quando será feito um balanço da implementação das Metas de Aichi em todo o mundo nesta década. Esta avaliação será a base para negociar e aprovar o Plano Estratégico Global de Biodiversidade para a próxima década, com as novas metas globais de biodiversidade”, esclarece o professor.

Segundo o Comissão Nacional de Biodiversidade  (Conabio), o sexto relatório nacional consiste em sete seções: 1) Informações sobre as metas estabelecidas em nível nacional; 2) Medidas de implementação adotadas, avaliação da sua eficácia, obstáculos relacionados e necessidades científicas e técnicas para atingir as metas nacionais; 3) Avaliação dos progressos realizados para atingir cada uma das metas nacionais; 4) Descrição da contribuição nacional para o atingimento de cada uma das Metas de Aichi; 5) Descrição da contribuição nacional para o atingimento das metas da Estratégia Global para a Conservação de Espécies Vegetais; 6) Informações adicionais sobre a contribuição dos povos indígenas e comunidades locais para o atingimento das Metas de Aichi, se não tiver sido registrado nas seções anteriores; 7) Perfis de biodiversidade dos países atualizados.

De acordo com Bráulio Dias, “falta terminar de coletar os dados, consultar outros setores do governo e da sociedade para receber mais dados, consolidar e formatar o relatório e só então será traduzido para o inglês – portanto, há muito trabalho pela frente”. O governo costuma buscar financiamento e contratar consultoria para elaborar os relatórios. No caso do documento em aberto, seria através do projeto “Technical Support to Eligible Parties to Produce the Sixth National Report to the CBD (6NR – LAC II)”, implementado e executado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no valor de US$ 100.000,00.

O rito normal de tramitação dos relatórios nacionais para a CDB seria a partir da SBio para a Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio), em seguida voltaria para o MMA e seguiria dali para o Ministério das Relações Exteriores (MRE) até chegar à CDB. A Conabio é interministerial e intersetorial e sua reunião de 07.12.2018 – última do ano e que daria aval ao relatório da CDB – foi cancelada por ação da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Essas entidades alegaram que o prazo regimental de 15 dias para envio dos materiais ao encontro não foi respeitado. O então coordenador dos trabalhos da Conabio no MMA, Ugo Eichler Vercillo, havia antecipado a reunião em alguns dias.

Todavia, ((o))eco apurou que não foi apenas a data que motivou o cancelamento da reunião, mas sim o impasse em torno do novo mapa das Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade, instrumento de política pública do MMA. As entidades alegaram que a adoção do novo mapa traz entraves ao avanço de atividades produtivas. Mesmo com a reclamação, o Ministério do Meio Ambiente publicou o novo mapa de Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade através da Portaria nº 463, de 18 de dezembro de 2018. Da diretoria do órgão, se ouve que uma revisão geral do mapa deve sair até junho, para resolver “sobreposições”.

A situação tende a se agravar por algumas questões, como o fato de a Conabio não estar na nova estrutura do MMA; o próximo secretário de Biodiversidade, que deverá ser o Brigadeiro Médico Eduardo Serra Negra Camerini da Aeronáutica, não ter experiência na área ambiental – Camerini era até então diretor do Departamento de Saúde e Assistência Social do Ministério da Defesa –; e que a nova diretora do Departamento de Gestão Ambiental Territorial do MMA, Elisa Romano Dezolt, é ex-lobista da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e trabalhou para alterar o chamado marco legal da biodiversidade (Lei 13.123/2015) em favor do setor privado. Com isso, percebe-se que a qualidade ambiental, tanto do mapa de Áreas Prioritárias quanto do próximo relatório da CDB, pode estar comprometida pela influência ainda maior dessas entidades no processo, se realmente forem publicados este ano.

Para Bráulio Dias, o assunto é urgente. “Seria impensável fazer um balanço da implementação das Metas de Aichi em 2020 e publicar o GBO5 sem os dados do Brasil. E seria um grave erro deste governo se não der a atenção devida à biodiversidade, tanto no plano nacional quanto internacional”, alertou.

 

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  • Carolina Lisboa

    Jornalista, bióloga e doutora em Ecologia pela UFRN. Repórter com interesse na cobertura e divulgação científica sobre meio ambiente.

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Comentários 2

  1. José Truda diz:

    Que cara de pau dos dirigentes do MMA no governo anterior, que deveriam ter concluído esse Relatório ATÉ 31 DE DEZEMBRO DE 2018, fazendo mimimi nessa matéria… realmente…


    1. Michelle diz:

      Pois é. Uma esquizofrenia…