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Se eu fosse candidata

O Brasil precisa de medidas consistentes e políticos com pulso para mudar o rumo suicida em que caminha o meio ambiente. Saneamento e redução das queimadas são ações urgentes.

18 de agosto de 2006 · 18 anos atrás
  • Maria Tereza Jorge Pádua

    Engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Nat...

Pensei muitas vezes na vida se gostaria de ser candidata a alguma coisa. Isso porque infelizmente quase não temos deputados ou senadores que se dedicam à causa ambiental. Tivemos alguns, ou ainda temos, mas tão poucos que nós estamos sempre sendo ameaçados por projetos de leis ou normas que favorecem o desenvolvimento a qualquer custo, em detrimento de se garantir uma boa qualidade de vida. Mesmo tendo boas leis ambientais e outras nem tanto, não existem os instrumentos adequados para implantá-las. Bem, mas com os parcos recursos que possuo, evidentemente não poderia me candidatar nem para vereadora no pequeno município onde vivo. Além do mais, é preciso vocação e estômago para este trabalho, o que definitivamente não tenho. Assim, já que estamos em época eleitoral, vou continuando a usar este nosso veículo de comunicação para propor ações que poderiam ser aproveitadas por algum candidato a alguma coisa.

No último artigo que escrevi, me atrevi a dar sugestões sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Hoje estou bem mais atrevida e como o atrevimento vence a ignorância, vou dar sugestões sobre a minha plataforma política para a Amazônia. As medidas que eu tomaria, se fosse política eleita, para a proteção e conservação daquele enorme território, seriam:

· Regularização da ocupação e destinação definitiva das terras públicas federais existentes na região, principalmente aquelas que foram arrecadadas na faixa de 100 quilômetros de cada lado das rodovias federais, implantadas ou planejadas na região. Poucos se lembram do magnífico feito de Raul Jugmann, quando ministro de estado, arrecadando as terras públicas e as oferecendo ao Ibama para a criação de unidades de conservação.

· Diminuir expressivamente os desmatamentos e as queimadas na região, com políticas de incentivos às atividades desenvolvimentistas compatíveis com as realidades regionais, como, por exemplo, agrosilvicultura, piscicultura, ecoturismo, artesanato.

· A maioria dos municípios na região não tem ainda seus Planos Diretores, embora grande percentagem da população da região já viva em cidades, ou em favelas de grandes cidades. Outro problema é que os mesmos são mudados para beneficiarem a vários interesses e muitos deles ilegítimos. Promover a execução de bons planos é medida que pode trazer frutos visíveis para a área ambiental e qualidade de vida das populações urbanas.

· Os municípios que possuem áreas de unidades de conservação são em geral beneficiados pelo ICMS Ecológico, em muitos estados do país, mas poucos na Amazônia. Em contrapartida, não ajudam na proteção de recursos naturais, nem tampouco no desenvolvimento de infra-estrutura turística, para atender os visitantes.

· A arborização urbana, bem como o estabelecimento de Parques Naturais Municipais, em especial para a preservação das fontes de água para a cidade, é fundamental para a qualidade de vida dos citadinos. Curitiba, entre outras capitais, é um bom exemplo de como se deve proceder.

· Mais de 39 milhões de brasileiros, em maior proporção na Amazônia, não são assistidos por esgoto sanitário e 15 milhões não têm acesso à rede de água. Assim, a saúde e a qualidade de vida desses brasileiros ficam prejudicadas. Buscar formas de mudar rapidamente esta situação, com os governos locais, é prioritário e ambientalmente desejável.

· Fazer cumprir a legislação vigente, principalmente no que diz respeito à reserva legal de cada propriedade e às Áreas de Preservação Permanente (APPs) pelo só efeito da Lei, e delimitar claramente as áreas passíveis de ocupação agrícola ou pecuária, favorecendo o uso mais intensivo de áreas já desmatadas atualmente improdutivas ou subutilizadas, que somam a bagatela de 60 milhões de hectares. Concentrar, nessas áreas as infra-estruturas de transporte e sua manutenção.

· Evitar abertura de novas fronteiras agrícolas que demandem desmatamentos onde a qualidade dos solos não é compatível com a agricultura e a pecuária. Já existe muita área aberta que pode ser utilizada, em grande parte, para estas atividades.

· Garantir que determinados afluentes da bacia amazônica e não menos de 50% dos mesmos não tenham nenhum tipo de barramento ou hidroelétricas para facultar a vida aquática e a reprodução de peixes e outros animais.

· Incentivar a atividade turística, principalmente utilizando os atrativos naturais dos Parques Nacionais, como uma alternativa de desenvolvimento. Para tanto, os Parques Nacionais precisam ser implantados e bem manejados. Necessitam ter facilidades de acesso e pessoal treinado.

· Promover o manejo da fauna silvestre de forma auto-sustentável e a caça cinegética, bem como a pesca esportiva.

· Pesquisar, pesquisar e pesquisar. Nós estamos destruindo aquele enorme patrimônio, sem sequer conhecê-lo. Facilitar e incentivar pesquisas, ao invés de dificultá-las, favorecerá no futuro o entendimento das relações no bioma e seu melhor aproveitamento científico e tecnológico.

Concentrei-me só em aspectos de conservação da natureza, não me esquecendo que em todas as atividades desenvolvimentistas o aspecto ambiental deve ser considerado, não tão somente em Estudos de Impacto Ambiental caros e mirabolantes, em geral somente feitos para se conseguir os licenciamentos ambientais. Além do mais, nada mencionei das atividades desenvolvimentistas tradicionais no Brasil, que já foram de há muito importadas para a região e que são as grandes vilãs do desmatamento e das queimadas, os maiores do mundo.

Bem, mas como não sou candidata, não preciso fingir que sei de tudo e que tenho respostas prontas para tudo. O que realmente eu almejo, como a grande maioria dos brasileiros, é ver diminuírem rapidamente as taxas de desmatamento e queimadas na Amazônia. O que realmente eu sonho é que não seja destruída celeremente como foram a Mata Atlântica, o Cerrado, a Caatinga, onde até para se ver um animal silvestre de maior porte ficou quase impossível, tem-se de andar muito, em zonas bem afastadas da dita cuja civilização. Encontrar rios limpos e peixes, só procurando com lupas. Uma paisagem natural bonita apenas se encontra em Parques Nacionais ou outras áreas protegidas. Lixo, sujeira e poluição por toda parte são o mais comum, menos em bairros de ricos. Ainda somos privilegiados possuindo uma enorme mancha de mata tropical na Amazônia. É tempo de se fazer algo sério. Por favor, senhores políticos, sejam estadistas, mudem o rumo suicida em que caminha a Amazônia.

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