O Brasil é o maior exportador de açúcar, carne bovina, frango, fumo, café, suco de laranja, etanol; o 2º maior exportador em soja e derivados, e 3º em milho e carne suína. A produção agropecuária brasileira é responsável por algo próximo de um terço do PIB brasileiro. Portanto, inegável é a relevância desse setor para o desenvolvimento do país.
O Brasil também é detentor da maior biodiversidade do planeta, possui mais de 20% de toda água doce do mundo, mais de um terço de todas as florestas tropicais com mais de 50% do seu território coberto por vegetação nativa dos biomas originais, embora sob pressão crescente e cotidiana.
Em artigo para a revista Opiniões (dezembro de 2009), afirmei que o produtor rural deve ser reconhecido pela sociedade brasileira (pelo poder público e pela legislação) no contexto da realidade socioambiental brasileira como produtor de serviços ambientais.
Ele é responsável (queira ou não) pela conservação dos solos e da água, de uma parcela necessária dos ecossistemas nativos e o produto de seu trabalho depende dos elementos vitais da natureza (água, minério, recursos genéticos e outros) necessários para manutenção do equilíbrio climático e ecológico.
“Se por um lado o Brasil tem na agropecuária um esteio importante para seu sustento, não é menos verdade que o esteio para o sustento da agropecuária reside no clima, na água, na biodiversidade e nos solos salvaguardados pelas nossas florestas.” |
Em proporções e por natureza constitucional distintas, são tão responsáveis quanto os povos indígenas, as comunidades tradicionais e extrativistas que detêm um percentual significativo de terras bem conservadas no Brasil, mas que diferentemente dos produtores rurais, até hoje contaram com migalhas de apoio público às suas atividades socioeconômicas.
Em parte, o Código Florestal atende à necessidade de estabelecimento de parâmetros gerais de conservação solo, nascentes e biodiversidade necessários para garantir as bases para a produção agropecuária.
Porém, para os produtores rurais que ignoraram a lei ao longo dos últimos anos, as opções hoje previstas na legislação, inseridas mais recentemente por meio da MP 2166/67, não resolvem. Como sair desse impasse?
Se por um lado o Brasil tem na agropecuária um esteio importante para seu sustento, não é menos verdade que o esteio para o sustento da agropecuária reside no clima, na água, na biodiversidade e nos solos salvaguardados pelas nossas florestas e demais ecossistemas nativos. Também encontram esteio nos consumidores finais e na cadeia produtiva, cada vez mais exigentes no que se refere à legalidade e sustentabilidade dos produtos e do processo produtivo como um todo.
Está claro que o discurso político fácil e corporativo, pseudo-nacionalista, não resolverá objetivamente o desafio posto. Vê-se que jogam para a platéia em pleno ano de eleições. Tampouco resolve a supressão de responsabilidades dos governos federal e estaduais no que compete à fiscalização e ao licenciamento ambiental, o enfraquecimento de instrumentos como o Zoneamento Ecológico-econômico, ou o passar de borracha nas ocupações ilegais, principalmente posteriores à vigência da lei atual, como defendem algumas lideranças do agronegócio no Congresso Nacional.
Nessa queda de braços, a derrota de um dos lados será a derrota de todos. Aqui, não vale a máxima de que o bom acordo é aquele que não é bom para nenhuma das partes.
O absurdo da atual situação é que, passados quase 14 anos da edição da polêmica Medida Provisória 1511 de junho de 1996, em pleno Século XXI, não conseguimos somar forças em torno do desenvolvimento de incentivos econômicos e mecanismos de mercado (regulado) para estimular ações de conservação e recuperação ambiental com mais produtividade agropecuária.
“Como vamos cumprir nossa meta de redução de emissões de gases de efeito estufa oriundas de desmatamento na Amazônia e no Cerrado se ignoramos um dos principais instrumentos para seu alcance, que é a lei florestal?” |
Não acordamos para a necessidade de tratar diferentemente cada bioma (em leis específicas), com remédios e doses diferenciadas para a situação dos passivos ambientais segundo a natureza e intensidade dos impactos e a antiguidade na ocupação. Não acordamos para o fato de que há consensos possíveis, se disposição real houver, por aqueles que em lugar de “se resolver no problema” querem “resolver o problema”.
Por fim, mas não menos importante, embora possa haver um número considerável de produtores rurais que descumpriu a lei por diferentes “razões”, há um número expressivo daqueles que cumpriram a lei, arcando com os custos decorrentes dessa prudente atitude e que agora está colocada em cheque com a iniciativa dos seus pares.
Perguntamos: O que as lideranças ruralistas que defendem a anistia geral aos que descumpriram a lei até ontem e a desestruturação do sistema de gestão ambiental vão dizer aos seus pares que vêm cumprindo seus deveres? Pergunta 2: Como vamos cumprir nossa meta de redução de emissões de gases de efeito estufa oriundas de desmatamento na Amazônia e no Cerrado se ignoramos um dos principais instrumentos para seu alcance, que é a lei florestal?
Se for para levarmos a sério os objetivos mensuráveis da Política Nacional de Mudanças Climáticas aprovada pela Lei Federal nº 12.187/2009, o tema do Código florestal tem que ser enfrentado pelos candidatos à presidência da República. Qualquer definição antes das eleições será de alto risco para o agronegócio brasileiro e para o futuro legitimamente soberano do País.
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