Análises

O inaceitável varejo portuário praticado no PAC

O Programa de Aceleração do Crescimento prevê 71 empreendimentos em 23 portos brasileiros, que pedem mais preocupação ambiental.

Mario Mantovani · Leandra Gonçalves ·
17 de setembro de 2014 · 10 anos atrás

Não é de hoje a preocupação da sociedade civil, do movimento ambientalista e também do setor privado com o planejamento de novos portos brasileiros e a ampliação dos já existentes. Temos testemunhado graves irregularidades em nossa zona costeira que estão trazendo danos irreparáveis para as comunidades tradicionais e, sem dúvida, irão acarretar problemas futuros para o desenvolvimento do país em termos socioambientais e econômicos, trazendo ineficiência inclusive para o setor portuário.

Para que o Brasil mantenha seu destaque no cenário internacional é fundamental respeitar as aptidões regionais e as vocações locais. Importante também pensar um projeto de Brasil moderno com a construção de marcos regulatórios que conciliem os objetivos de avanço econômico com a preservação ambiental e a equidade social. E é preciso criar mecanismos para conferir maior proteção, autonomia e participação social nos processos de licenciamentos, para que o rigor técnico e princípios de proteção e segurança não sejam reféns do corriqueiro tráfico de influência e interesses eleitoreiros.

Na ausência do uso de uma ferramenta moderna de planejamento estratégico e integrado, os portos estão sendo pensados no varejo, em projetos que não consideram a sustentabilidade como um valor essencial à construção de uma potência.

Falta avaliação ambiental estratégica

“…sem ampliar e fortalecer a estrutura em termos de recursos humanos e financeiros no setor de licenciamento, fica impossível garantir a celeridade sem diminuir a qualidade dos processos”

O site do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) mostra investimentos em 71 empreendimentos de 23 portos brasileiros para ampliar, recuperar e modernizar as estruturas. O objetivo é a redução nos custos logísticos, a melhora da eficiência operacional, aumento da competitividade das exportações e incentivo ao investimento privado. Há obras de dragagem, de aprofundamento, de infraestrutura portuária, de inteligência logística e de terminais de passageiros. Além dos portos previstos no PAC, existem ainda outras iniciativas portuárias já em curso com investimentos públicos e privados.

No entanto, sem ampliar e fortalecer a estrutura em termos de recursos humanos e financeiros no setor de licenciamento, fica impossível garantir a celeridade sem diminuir a qualidade dos processos.

Foi pensando nisso que mais de 40 organizações, lideradas pela Fundação SOS Mata Atlântica, encaminharam uma carta ao Ministério do Meio Ambiente, do Planejamento e à Secretaria de Portos solicitando a adoção da Avaliação Ambiental Estratégica e Integrada para projetos portuários e de demais empreendimentos de relevância e impacto nacional. O documento pede também a promoção de mecanismos mais amplos de participação social – como audiências públicas específicas, informadas e vinculadas para tratar do tema, em nível nacional, bem como no âmbito dos Estados.

É preciso rediscutir o modelo de desenvolvimento, utilizando-se de planos estratégicos que reavaliem as matrizes industriais a partir de um diálogo amplo e aberto com a sociedade. Sem participação social nas decisões estratégicas não avançaremos na consolidação da democracia e na construção de um país soberano e sustentável.

Uma grande potência como o Brasil não pode desperdiçar suas riquezas, sejam elas econômicas, sociais, culturais ou ambientais. É preciso saber aproveitar as oportunidades para se desenvolver, mas não a qualquer custo. Nosso país não pode mais ignorar os limites ecológicos, pois exaurindo os recursos naturais e destruindo ecossistemas importantes, não será possível garantir equidade social, desenvolvimento sustentável e muito menos prosperidade econômica.

Leia também
Porto Sul – Ganhos para quem? Perdas para todos?
Fome de progresso no Porto de Santos
O revide dos tubarões

  • Mario Mantovani

    Geógrafo. Ambientalista, especialista em manejo de recursos hídricos, coordenador do Núcleo União Pró-Tietê (SOS/MA). Fundado...

Leia também

Análises
2 de outubro de 2024

Plot Twist Ecológico: a resiliência de sistemas naturais após a eliminação de goiabeiras

Frutos atraentes de espécies exóticas, como a amoreira e a nêspera, acabam monopolizando a atenção dos frugívoros, que deixam de consumir frutos de plantas nativas

Notícias
2 de outubro de 2024

Adeus ao mestre imortal Milton Thiago de Mello

Médico-veterinário com mais de 80 anos de carreira, referência no ensino e na formação de primatólogos, Milton faleceu nesta terça (1º), aos 108 anos

Reportagens
2 de outubro de 2024

Alvo da crise do clima, turismo quer regenerar ambientes e cortar emissões

O crescente setor já responde por cerca de 8% das emissões mundiais de gases de efeito estufa e por 10% da economia global

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.