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Mandato para os parques

Além de recursos, Parques Nacionais precisam de gerentes com horizonte de trabalho e metas definidas. O troca-troca nos cargos é sinônimo de politicagem.

3 de junho de 2005 · 19 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Além da falta de dinheiro, um dos maiores problemas na administração de parques nacionais é a sua instabilidade administrativa. A rotatividade irregular e politizada dos chefes de parques é um dos maiores obstáculos a sua boa gerência.

Dois exemplos: recentemente, os chefes do Parque Nacional da Bocaina e do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, ambos no estado do Rio de Janeiro, foram substituídos. O primeiro saiu após um ano e meio no cargo. O seu antecessor ficou dois largos períodos de mais de dez anos, somando ao todo 27 anos no cargo. No Parque da Serra dos Órgãos, o último gerente durou menos de um ano, contra 10 anos do anterior. A regra que impera é a da instabilidade. Em parques mais complicados, como os amazônicos, onde falta estrutura e as pressões locais são pesadas, a duração nesse cargo tem sido em torno de 2 anos.

Os chefes de parque são indicados pelo presidente do IBAMA, outro cargo federal de alta rotatividade. O atual presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Marcus Barros, se gaba de ser um recordista, antes mesmo de completar três anos na posição. Quando o presidente do IBAMA cai, a maioria dos gerentes regionais do órgão e chefes de parque são trocados.

Não há nenhum pré-requisito para ser chefe de parque nacional no Brasil. A presidência do IBAMA pode indicar quem quiser para essa posição. Não é necessário ter formação ou ter percorrido carreira na área. Dessa forma, a indicação e o tempo de sobrevivência no cargo parecem estar associados a algumas habilidades básicas. A primeira é se dar bem com as instâncias mais altas do IBAMA. A outra, é ser capaz de, no dia-a-dia da administração, evitar choques com os poderosos locais, como prefeitos dos municípios ao redor, vereadores e ONGs influentes, os quais podem pressionar pela retirada.
Os chefes de parque podem até ser sérios e abnegados, mas, para isso, têm que lutar contra fortes incentivos para andarem na direção oposta, se tornando acomodados e complacentes na administração, porém ágeis politicamente. Do jeito que está, vale a pena gastar mais tempo garantindo bons relacionamentos com quem manda do que administrando.

É impossível fazer um bom trabalho num período curto. Um cargo como esse consome os primeiros meses num período de aclimatação, que envolve conhecer funcionários, atividades da administração anterior, diagnosticar problemas e planejar soluções. Um ano não dá para nada, dois serve para começar.

Para quem quiser estudar o assunto e descobrir quais são as melhores práticas de administração de parque, está sendo lançado o livro “Parques Nacionais da América Latina”, de Luciana Napchan e Walter Behr. Através dele, descobri que, no extremo oposto da falta de estrutura brasileira, estão nossos vizinhos argentinos.

Lá, a administração de parques é uma carreira. Ela começa, em geral, participando de um programa de trabalho voluntário nos parques. Em seguida, os candidatos passam por duros testes de seleção para um curso de três anos que forma guarda-parques, envolvendo formação teórica e de campo. Ela é feita em convênio com a Universidade de Tucuman, que, desde 1994, já treinou mais de 600 guarda-parques. Na Argentina, são essas pessoas que, no topo da carreira, depois de muitos anos de profissão, chegam a chefes de parque, chamados de intendientes.

Não precisamos copiar receitas, mas deveríamos olhar com cuidado as experiências bem sucedidas ao nosso redor e tentar criar regras de administração de parques que gerem bons resultados. Com 20 anos de democracia, o Brasil está começando a perceber que votar não é tudo. Uma democracia sem boas instituições é como um aquário com peixes, mas sem água. Sem regras claras, a administração pública jamais será eficaz.

No caso do IBAMA e dos gerentes de parques nacionais, por que não tratá-los como as agências reguladoras? A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e similares têm diretores com período de mandato definido. Eis uma sugestão simples que avançaria essa agenda: tanto o presidente do IBAMA, como os chefes de parques, poderiam ser indicados para um termo de quatro anos, com uma renovação, no meio do mandato do presidente da República. Isso daria a essas pessoas um horizonte de trabalho definido, tornando inclusive mais fácil cobrá-las por performance. Também as isolaria do empurra-empurra político corriqueiro.

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