
Funciona um ferro-velho dentro do Parque Nacional do Iguaçu. Feio como todo ferro-velho. É um terreno baldio onde relíquias da civilização industrial apodrecem ao relento. Fica num pequeno desvio da estrada que leva os turistas às cataratas. Mas, escondido pudicamente atrás das árvores, não passa nem perto do roteiro da visitação.
O que é lastimável. Seria uma parada indispensável à educação ambiental do público. Porque aqueles carros enferrujados, de modelos que saíram de linha faz muito tempo, com o mato subindo pelas latarias, foram todos apreendidos pelos fiscais nas mãos de caçadores clandestinos, palmiteiros e outros agentes da pilhagem constante que os moradores da vizinhança praticam, em nome de costumes locais irreprimíveis, contra o patrimônio do país, guardado no Iguaçu.
Antes, aquelas sucatas eram entregues às delegacias locais. Mas voltavam rapidamente às mãos dos proprietários, devolvidas por uma polícia simpática ou cúmplice, sob as ordens de políticos e prefeitos que tratam essas coisas como manifestações culturais.

Presos no parque até o fim de processos que não acabam nunca, os carros, pelo menos, não reincidem no furto, como seus donos. São Wons, Stumpf, Bergen ou Simermann, formando verdadeiras dinastias de infratores. Repetem-se na papelada, também, suas histórias – quase sempre de “agricultores”, “pedreiros”, “marceneiros”, trabalhadores humildes, que estavam “sem emprego” e por isso foram contratados para ganhar no meio da noite um dinheirinho fácil e pingado. Ou seja, obra grande de povo miúdo.
Seus depoimentos perpetuam a lenda de que roubar o parque é atividade de subsistência. Mas elas têm por trás autênticas indústrias. Pelo menos um mandado levou à casa de um pastor protestante, que abriu a porta aos fiscais com a afabilidade de quem não tinha nada a esconder. Tomou mesmo a iniciativa de ir à frente com a mulher, guiando a busca, cômodo por cômodo, como se tivesse orgulho de exibir a ordem doméstica simples e decorosa.
Até que um fiscal se ajoelhou diante de uma cama, coberta até o chão por colcha imaculada. E descobriu que todos os móveis estocavam maços de palmito entre as pernas. Tratava-se, nas horas vagas do culto, de um empresário do ramo de conservas caseiras.
Outros nomes recorrentes são os das cidades nas placas dos automóveis. De Capanema, Medianeira, Serranópolis vem a maior parte da frota encalhada no ferro-velho. Não só por serem cidades próximas. Mas sobretudo por nunca levantarem um dedo para coibir a pirataria, mesmo se muitas delas embolsam como ICMS ecológico as indenizações pela presença de uma unidade de conservação federal em território municipal.

São essas as cidades que o projeto 7.123, do deputado paranaense Assis do Couto, quer agora premiar com a reabertura da Estrada do Colono, cortando o parque de um lado a outro. Ela deixou de ser aquele atalho rodoviário de anos atrás, defendido por invasões violentas como indispensável ao escoamento da produção agrícola. Virou “ecológica”. Promete fazer “educação ambiental” e promover o “desenvolvimento rural sustentável”.
Só se a engenharia genética tantas fez que agora a soja transgênica quer porque quer passear na floresta. Porque difícil mesmo de acreditar é na nova política de boa vizinhança. Os municípios envolvidos com a Estrada do Colono já provaram até cansar que têm prefeituras inidôneas para lidar com o parque.
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